terça-feira, 3 de março de 2015

Outro Animador da Indústria de Animes se queixando das condições de trabalho


Nos últimos anos, muitas das pessoas que trabalham na indústria de animes vêm botando a boca no trombone e criticando a politica de salario vigente, principalmente em relação aos animadores – maior foco das criticas. Causas para ter chegado a este momento crítico e hipotéticas soluções são apontadas por muitos nomes conhecidos, mas uma solução palpável parece estar longe de ser alcançada. Dias atrás foi a vez de uma animadora veterana da indústria fazer barulho. Sachiko Kamimura (que trabalhou em animações como City Hunter  e diversos filmes de Doraemon) denuncia em seu blog pessoal as condições deploráveis que vivem muitos animadores recém iniciados: “há muitos animadores jovens que acabaram de sair do instituto e se encontram com um trabalho que não lhe dá nem condições para comer”. Uma situação complicada que segue inalterada desde a década de 1990, quando o quadro da indústria mudou com o advento de novas tecnologias e consequentemente novas demandas salariais para quem estava envolvido neste meio. Segundo Kamimura, muitos animadores cobram apenas 120 ienes por hora (em torno de R$ 2,87)
No post, Kamimura explica que os animadores recebem por quadros concluídos, ao invés de um salário fixo ou por horas, fazendo com que sua remuneração dependa do quanto de trabalho eles conseguem pegar e fazer num curto tempo (entendem o porquê de muitos dos seus desenhos chineses saírem tortos e mal desenhados na versão TV? Um animador, normalmente, tem muito trampo e se o cronograma do anime está em cima da hora, qualquer erro se torna impossível de corrigir a tempo). Ela diz, e isto está de acordo com os comentários de vários outros animadores e diretores velhos de guerra, que há 20 anos isto era até razoável, mas hoje a animação mudou e exige mais precisão e pericia aos detalhes, algo que, para Kamimura, é muito difícil de se exigir e atingir com um animador novato que não pode fazer tais desenhos em um ritmo rápido de modo que possam viver decentemente, como animadores mais tarimbados. 

Isso me lembra de uma entrevista antiga com o consagrado diretor cult Mamouru Oishii, em que ele dizia que para o seu filme Sky Crawlers ele foi obrigado a fazer todas as cenas aéreas em 3DCG (em um trabalho que traz um resulto final esplendoroso, diga-se de passagem), pois ele não conseguiu nenhum bom animador com a coragem suficiente e talento para dar vida à todas aquelas sequências de voo. 
Voltando aos relatos da Kamimura, ela diz que se acostumou com o ritmo intenso através dos anos de experiência que adquiriu, mas que isto é impensável para um novato. Em suas contas, ela estima que mesmo sacrificando horas de sono e renunciando às férias, o máximo que se pode fazer é 500 quadros por mês (Tezuka está rindo no além *manjadores manjarão*), e que um mês com uma média de 250 horas trabalhadas retorna 30.000 ienes (em dilmas, dá R$ 721,48), uma miséria se comparado com os 888 ienes (R$ 21,35) à hora do salário mínimo nacional [japonês]. 

Porém, aparentemente há outros membros da indústria de animação que não concordam com Kamimura – o já estabelecido animador Noriyuki Fukuda (D.Gray-man, Lupin III vs. Detective Conan The Movie) postou em seu twitter uma resposta ao post de Kamimura, dizendo “é melhor não tomar como referência as afirmações de algumas pessoas que dizem que os animadores só ganham 120 ienes por hora”. Na verdade isso está mais para caminhão da indireta do que uma resposta. Ele diz que a quantidade que um animador produz não influencia o seu salário, pois isto é apenas uma adição ao pagamento fixo que recebem de antemão, que fica entre 50 mil (cerca de R$ 1.202,45) e 80.000 (cerca de R$ 1.923,93) ienes. Ele acrescenta que esta animação tão complexa que Kamimura se refere não é o tipo de trabalho que se oferece a um novato, e que o mais normal para estes casos é dar eles trabalhos mais simples como quadros em que as bocas dos personagens se movem e sincronização labial. Fukuda estima que para quadros como estes, podem se realizar facilmente 4 quadros por hora, e que nenhuma empresa contraria alguém que não pudesse produzir ao menos dois por hora. 

Outro animador com a conta @SAKUOLI diz que ao que Kamimura se refere não se aplica ao seu grupo, quando ele começou, mas que não acredita que ela esteja equivocada, já que ouve coisas piores a respeito das péssimas condições em que vivem os animadores. Segundo ele, há muitas empresas que agem desta maneira, como uma forma de triagem para encontrar novos talentos. Ao fim de tudo, Kamimura termina dizendo que muitos novos animadores desistem da profissão e abandonam a indústria devido a esta remuneração desproporcional. Ela defende que para garantir a qualidade dos animes e manter que novos animadores surjam constantemente, um salário base de 100.000 ienes se faz necessário (R$ 2.404, 9)

Eeenfim, essa é apenas uma das muitas queixas que surgem sempre em relação ao tratamento desfavorável aos animadores iniciantes e também em um quadro geral, já que apenas os realmente top de linha e muito talentosos conseguem fazer um excelente pé de meia nesta profissão e ainda fazer seu nome, sempre disputados a tapas. A principal queixa desde sempre no que diz respeitos aos criadores e diretores, é que com um salário tão miserável, cada vez mais se torna raro e difícil encontrar animadores realmente talentosos capazes de dar vida a animações difíceis. Virou tendência entre os estúdios de anime a partir dos anos 2000 contratar mais mão de obra terceirizada e hiper barata, e consequentemente despencando a qualidade da animação, criando um patamar que, fora o circuito fechado com animadores já estabelecidos e com nomes, todos os demais vivam num estado de semi-escravidão. 

Achei que seria interessante trazer essa reportagem para cá, afinal, sem bem que a maioria não costuma acompanhar de perto a cena real por traz da produção do seu desenho chinês preferido. 
Aliás, vocês assistem Shirobako (imagem que abre o post e este acima)? Deveriam. Porque é bom, porque é divertido, porque é realmente bom, porque vale a pena, porque te faz refletir e te faz bem, porque é de interesse público e porque, além disso tudo, tem como foco a indústria de animação. (sim, primeira e talvez última vez que me verão indicando e super recomendando abertamente qualquer coisa por aqui!)

Fonte: ANN 

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