quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Kino no Tabi – Episódio 01: O Essencial é Invisível aos Ouvidos

[Land of Visible Pain]

Data de Estreia: 08 de abril de 2003  
Episódio: 1
Sinopse: Kino e sua companheira motorrad viajam juntas de país para país. Têm a regra de não ficarem mais que três dias, a fim de experimentar o que cada país tem a oferecer e para não forjar qualquer vínculo. O país que ela visita neste episódio é povoado quase que completamente por máquinas, não se fazendo notar nenhuma pessoa nas ruas ou estabelecimentos comerciais. Mais tarde Kino descobre que as pessoas vivem afastadas umas das outras, encarceradas em suas próprias casas, porque desenvolveram uma droga cientifica que lhes permite ler mentes quando estão por perto uma das outras.
Storyboard: Ryutaro Nakamura
Diretor: Ryutaro Nakamura
Roteiro: Sadayuki Murai

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Em um mundo onde as pessoas vivem solitárias não por terem dificuldade de comunicar seus sentimentos aos outros, mas o inverso, esse episódio de Kino no Tabi reverbera uma melancolia reconfortante em tom agridoce ao final, depois de conhecermos um país vazio, com as ruas e estabelecimentos desertos, com as pessoas presas em suas casas, solitárias e tristes por esta solidão, pois são incapazes de estabelecerem uma conexão sem que isto se transforme num desgastante pesadelo, pelo fato de os nativos ali poderem ler os pensamentos um dos outros. 
Há uma ironia sutil em relação ao nosso mundo, em que todos em algum momento gostariam de poder não ter que lidar com a dificuldade da comunicação, porém a individualidade é essencial ao ser humano como a água é para o peixe. E se não podemos viver completamente isolados sem enlouquecermos, também é imprescindível que estejamos completamente a sós com nós mesmos em alguns momentos, pois há coisas que não queremos e nem devemos comunicar ao outro, dado a própria complexidade do ser. 

O episódio termina com uma nota magnifica, onde Kino acredita ter lido uma emoção no rosto enrugado do homem solitário, e em resposta, lhe transmite um sentimento exposto no seu rosto, através de um sorriso, comunicando-lhe que não deveria se preocupar. Então, sua companheira de viagem, uma moto, lhe pergunta (!) se ela tem certeza se o homem conseguiu compreender o que ela queria dizer. Kino responde que não sabe. Lhe era impossível ter certeza.  O episódio termina com um encerramento agridoce, deixando-nos a reflexão.

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Inefável

Apesar do fim do episódio ser todo embrulhado para presente, o momento mais sublime aos meus olhos é a sutil recompensa que se percebe nestes dois frames abaixo. 
Na despedida, o curioso objeto (que se subtende ser um a buginga eletrônica para aguar plantas) tecnológico que o homem lutava pra fazer funcionar quando Kino o viu pela primeira vez, parece chamar-lhe a atenção, e ao fundo, observamos um jardim de flores vermelhas. No trajeto de partida da cidade-estado ela passa por uma casa, onde se pode ouvir uma delicada canção instrumental, com a silhueta na janela de uma senhora a bordar, e logo abaixo um lindo jardim de flores vermelhas. As mesmas da casa do homem de meia-idade que oferecera guarida a Kino. Se você assistiu ao episódio, não é preciso de muito para entender o que está se passando. O jardim que o homem cultiva é uma lembrança que remete à sua ex-esposa; seu hobbie preferido, enquanto a música que a senhora ouve a faz lembrar-se do antigo marido; que tanto adorava aquela melodia, que marcou a união entre eles. Portanto, a dúvida levantada por ele, sobre ela se dizer apaixonada aquela melodia, justamente a preferida dele (por remeter a um momento entre os dois) ser verdade ou não por fazer parte de um período anterior á invenção da medicina de telepatia, e assim, ter apenas que confiar na palavra dela, traz uma inquietação, sentimento poético, revolta e resignação. 

Pode se dizer que o episódio alude a uma ideia que é um senso comum, e, portanto, obvio. Superficialmente, cheguei a sentir, e consequentemente pensar, por alguns segundos que era um episódio filosoficamente vulgar – e clichê – que não levava a lugar algum se não a uma mesma questão que a própria série respondia ao final. Clichê talvez, mas há invulgar raciocínio narrativo que expõe o paradoxo de uma natureza humana complexa e ao mesmo tempo tão simples de entendimento. Do ponto de vista cultural, provavelmente é um episódio que bata mais forte na psique japonesa, pela notável dificuldade que possuem em expressar por palavras o que sentem de mais profundo. Mas, ainda é uma distensão universal completamente natural, que se torna evidente agora pela maior exposição da tecnologia de mídia, e por isso, é um episódio de temática que fala muito sobre o que as pessoas, principalmente os mais “jovens”, sentem no mundo atualmente. Muitas vezes pensamos ou sonhamos que a tecnologia pode(rá) resolver todos os nossos problemas, no entanto, a máquina é fria de emoção, despida do que nos torna humanos, incapazes de fornecer o calor que instintivamente necessitamos. 

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Eu amei este episódio, planejava apenas escrever um tl;dr de esboços do que senti com o primeiro contado com um anime tão bem criticado, mas me deixei ir mais além. Não precisamente pelo que ele tem a dizer, mas pela forma como diz. Sempre quis pegar um anime antigo pra ir comentando algumas notas a respeito, e talvez acabe começando por este. 

No fim, com este pequeno conto, Kino absorve duas coisas fundamentais na existência humana e que lhe será de constante contraste enquanto viajante: a solidão necessária e as relações inevitáveis com o próximo. 


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