segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Afro Samurai: O Dono Do Mundo


Combinação frenética do estúdio Gonzo entre blaxploitation, cultura tradicional japonesa, e tecnologia funky em uma animação com ação desenfreada e embalada ao som de hip-hop.

Resumo: 
No sombrio caminho de um espadachim, em um "futurístico", mas ainda Japão Feudal, há comentários boca a boca que aquele que se tornasse o número 1 governaria o mundo. Mas a única regra neste mundo, é que o somente o número 2 tem permissão para desafiar o número 1. O número 2, Afro Samurai, viaja ao redor do mundo em busca de vingança contra o homem que assassinou seu pai, na sua frente quando ele era apenas um garoto, um poderoso espadachim que trilha o caminho do mau e que atualmente é o número 1.

Na verdade, o uso de subgêneros como o chanbara (guerreiro solitário seguidor do código de conduta Samurai que entrava duelos sangrentos de espadas) e o blaxploitation, não passam de um plano de fundo que enriquece a atmosfera cool em torno de um personagem GAR que sai retalhando, literalmente, todos os personagens do enredo. Afro Samurai possui uma história bem curiosa de pré-produção. Tudo começou quando o seu autor, Takashi Okazaki, admirador da cultura hip hop, resolveu externar seu amor fazendo algo similar ao que Black Dynamite também fizera ao escrachar e parodiar os clichês de filmes da época de ouro do blaxploitation. No filme, o personagem homônimo é um excelente lutador de kung fu, anda carregado de armas e é capaz de conquistar as mais belas mulheres, além de ostentar um imponente penteado black power. Em Afro, nós temos um samurai negro numa Era Feudal (século X ao XIX) impregnada pela cultura Hip Hop e o uso de uma tecnologia muito à frente de seu tempo. Olhando para a história japonesa, foi uma época de grande descentralização do poder imperial em que os samurais chegaram a assumir o controle do país. Aqui surge o argumento do autor, que ao invés de seguir á risca a história, centraliza o poder de governar através de uma faixa branca.


Intencional ou não, ele faz uma subversão aí. Afro Samurai nasceu como um doujinshin [não hentai] que estreou na edição zero da revista NouNou Hau (1999 – 2002), se estendendo por seis volumes até ter se fim decretado. A revista indie em questão saia em edições limitadíssimas e era financiada por ele e seus amigos, que também publicavam nela. Obviamente, ele não conseguiu fama/reconhecimento, nem dinheiro. Ao menos, não de imediato. Mas a sorte do cara começa a mudar quando ele ganha um concurso para produzir uma figure do seu personagem título, o Afro. Algumas das poucas cópias então vai parar justamente nas mãos de um produtor do grupo GDH Internacional (detentora do estúdio GONZO), Eric Calderon. Que saído da MTV Animation, fora contratado em 2001 pela GDH justamente pelo interesse de penetrar o seu estúdio no mercado de animações americana, que vinha numa crescente. Antes do questionável projeto Marvel X Madhouse (X-Men, Blade, Wolverine, Iron Man), vários estúdios já faziam coproduções com os americanos, e o GONZO também estava interessado nesta fusão.

A GDH começou a trabalhar no storyboard de Afro Samurai, que rendeu um curta de 3 minutos com os conceitos base dos personagens. Que por sua vez, seria gravado em DVD e distribuído em diversas produtoras. Umas dessas cópias foi parar bem nas mãos de Samuel L. Jackson, que não apenas quis o personagem para ele, como também se tornou um dos produtores.  Era tudo o que a GDH queria para um produto desconhecido e subestimado como Afro: Um nome forte capaz de abrir as portas ($$$) para a produção. Neste meio tempo, o estúdio GONZO estava com animes transmitidos nos canais Adult Swim (Trinity Blood), IFC (Samurai 7) e G4 (Last Exile), e a Spike TV que estava redefinindo sua identidade (que se tornaria mais focada no publico masculino), se interessou pelo projeto.


Embora, geralmente animes entrem em processo de animação poucos dias antes da exibição nas tv’s japonesas, o processo de produção é demorado e não é raro uma série levar anos para sair da pré-produção (há toda uma logística por trás). E assim foi com Afro Samurai, que após o estúdio GONZO receber o projeto da GDH, fora concebido para ser exibido originalmente nos EUA, com as vozes originais sendo americanas. Na versão lançada posteriormente em DVD/BD, há a opção da dublagem japonesa, mas sinceramente o trabalho da dublagem americana está impecável e se alinha muito mais à obra, do que a dublagem japonesa. O que é bem peculiar, levando em conta que geralmente dublagens americanas não caem tão bem em animes. Provavelmente por todo o trabalho já ter sido concebido tendo como base as vozes americanas (em animações, é usual que a produção ocorra em cima das vozes já gravadas). O Samuel pode até falar bem pouco interpretando o Afro, mas está incrível e falante como o afetado Ninja Ninja. Personagem este que tem uma belíssima química com Afro, redendo diversos momentos cômicos. Ninja Ninja se apróxima com a imagem de um rapper de rua com todos os seus maneirismos, o caractéristico negro falante, sem noção, que adora botar banca, mas é um covarde. Você certamente já viu este clichê de personagem em muitos filmes por aí.

Mas, e Afro Samurai, é bom? Vulgarmente falando, é bem meia boca. Destituído de qualquer traço de personalidade, acaba se tornando dispensável até mesmo para quem curte sangue jorrando na tela, apesar de que como entretenimento pipoca com guaraná, funcione, principalmente para aficionados por ação, violência gratuita e mulheres com altas curvas. O roteiro é só um retalho com diversas pontas soltas que serve de desculpa para a vingança do açougueiro Afro que só não matou a própria mãe, porque ele é órfão (!). Com 5 minutos de execução do primeiro episódio, o meu monitor já estava respingando sangue!  Afro é um cara pouco expressivo, frio, seco, monossilábico, silencioso como uma boa Katana afiada, sempre sério e tragando o seu cigarrinho do capeta. É o tipo de personagem GAR (definição para ‘um cara macho’, mais macho que até mesmo Chuk Norris), que causa bastante empatia, principalmente entre o publico masculino. O cara não tem tato algum e é avesso a qualquer tipo de diálogo ou estratégia. O que tem de resolver, ele resolve na força bruta e vai cortando tudo que vê pela frente. É chute na porta, soco na cara! Se logo à frente há uma obvia embosca e ele se encontra em desvantagem; que se foda, ele não quer nem saber, vai pra cima sem pensar duas vezes e sem tirar o cigarro da boca.


Pensando bem, é compreensível que Samuel L. Jackson tenha ficado vidrado no personagem. Anos antes ele interpretaria um personagem com traços similares (embora mais falante) em Pulp Fiction, de Quentin Tarantino.

E Afro Samurai tem bastante características da filmografia de Tarantino, como a forte estilização da violência, a música intrínseca ao visual, quebra de linearidade e etc. Mas sem o mesmo talento na direção, claro. Na primeira sequência, vemos pai e filho diante o rival que quer lhe tomar a faixa. A paisagem é árida em um imenso campo baldio e deserto, os dois duelistas se portam como dois personagens num western spaghetti, só que um, está portando uma espada, e o outro, duas armas de fogo. Tudo isto num cenário pós-apocalíptico de um Japão da era Edo.
Achou absurdo? Essa é a premissa de Afro Samurai, que traz sequências viscerais de embate entre o Afro Samurai e rivais portando armas de fogo da força militar, e até mesmo androides. Numa dessas sequências, ele se engalfinha com um androide em pleno ar. Sim, eles ficam duelando no céu, em queda livre!!!!!!! Há outra em que envenenam o Afro, e mesmo envenenado, ele duela com um cara que começa a disparar diversos mísseis para cima dele. O Afro, claro, corta os mísseis com sua poderosa Katana. São sequências extremamente pirotécnicas e absurdas, que ao som da bela e diversificada trilha sonora composta pelo rapper americano RZA (Kill Bill vol. 1), torna estes momentos mais envolventes e divertidos que as cenas de violência extrema com Afro cortando cabeças aleatoriamente que  bem da verdade, são sequências bem desinteressantes.

Trilha sonora esta que, só há um defeito: O som do funk pesado aparece menos vezes, e com um volume e intensidade menor, do que deveria.

Com o orçamento de 1 milhão de dólares por episódio (É, fazer anime não é barato, por isso há tanta terceirização por parte dos estúdio japas), a animação é fluída, ainda que muito estilizada. Há toda uma sofisticação no storyboard e enquadramentos, no character designer detalhado de Takeshi Koike (Redline), inclusive com ele fazendo todo o desenho e dirigindo o episódio piloto. Provavelmente Afro estive em melhores mãos, se ele fosse o diretor, ao invés de Fuminori Kizaki (Basilisk, X-Men). Isto tendo como base, o primeiro episódio, sem dúvidas o melhor e mais inspirado.

A paleta de cores é monocromática, expressando a atmosfera interna de Afro. Essa é a forma como ele vê o mundo. Ocasionalmente há uns toques diferentes no esquema de cores (como um vidro amarelo pálido de limonada em uma taverna úmida) que sempre se destaca é dá um efeito bem visual belíssima.

Apesar disso tudo, este mundo que mistura espadas (período histórico) e celulares (tecnologia contemporânea), peca pela falta de tensão dramática. É tudo muito superficial, e até mesmo a tentativa de dar substância ao Afro, falha. Tensão dramática que se faz necessária no clímax da série, e que acaba não convencendo pela inexpressividade de Afro, que só é bom mesmo explodindo tudo ao redor. Ainda há uma equivocada tentativa de passar uma mensagem no desfecho, de que violência só gera mais violência, criando um ciclo de sofrimento. O tema “violência não é a resposta” é algo que se sente completamente fora do lugar numa série que tem um personagem como o Afro. E bem, depois da série animada, o autor ganhou reconhecimento e seu doujin mangá foi compilado em 2 volumes, e lançados primeiramente nos EUA.

E se me permitem um grito de guerra...AAAAFFFRRROOOO!!!!"

Nota: 05/10
Episódios: 05
Tipo: TV
Estúdio: GONZO
Direção: Fuminori Kizaki
Roteiro: Tomohiro Yamashita 
Ano: 2007
Duração: 25 min. por episódio

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