Acho que toda criança passa por aquele momento de não querer e ter medo de virar adulto, mas e quando este momento alcança a vida adulta?
Leia Também as impressões de outra obra do autor aqui no ELBR: Tropical Citron ― Psychedelic Witch Story (2001): Estonteante Contracultura Psicodelica
Isso é um sonho? Delírios? Uma sequencia onde pesadelos se
misturam à realidade e se tornam indistinguíveis. Wendy é a primeira série
publicada oficialmente de Jiro Matsumoto, com 1 volume, serializada em 1996 – Uma história caótica sobre coming of age, a difícil transição da adolescência à vida
adulta. E o começo surge com momento determinante na vida de muitos jovens,
especialmente mulheres; a perda da virgindade.
A primeira vez de Ishigami Manami foi um tanto brusca e a
experiência não foi satisfatória – e Matsumoto utiliza um recurso visual bem
inventivo que demonstra visualmente as emoções conflitantes de Manami, com ela
se sentido incomodada com o odor do sangue virginal em sua mão, que parece ter
penetrado em sua pele quando ao tocar suas partes intimas, notou o sangue que
escorria dali. Na ficção, a perda de virgindade [ou da primeira menstruação] ainda
representa um marco; um rito de passagem importante que simboliza o
amadurecimento. Manami passa então a ter que conviver com estes sentimentos de
inquietação e estranheza instigados pelo seu próprio odor. É a partir de então,
depois de um incidente, que ela passa a ter pesadelos com um estranho homem pitoresco
que se autoproclama Peter Pan e que começa a chamá-la de Wendy. São pesadelos
caóticos em um colagem de recordações da sua primeira transa em que ela não se
divertida nem se sentira nem um pouco à vontade e diversas fragmentações.
Sequência incrível e altamente cinematográfica, é por sequências assim que tenho a narrativa visual do Matsumoto em alta conta (tradução por mim mesma):
Wendy é um conto adolescente sob uma releitura de Peter Pan
e a Terra do Nunca (vocês sabem, ou
deveriam saber, Peter Pan é a fabula do garoto da Terra do Nunca que nunca cresce
nunca se torna adulto e permanece criança para sempre), mas na visão do
Matsumoto os personagens clássicos desta fábula ganham uma releitura grotesca e
inconvencional, como também, de certa forma, ocorre em Tropical Citron.
A Sininho não é um doce [na verdade a sua participação é
minúscula], Gancho é um homossexual sadomasoquista apaixonado pelo Peter Pan,
que por sua vez é alucinado e um tanto psicótico – além de outros personagens
curiosos. Manami, que é vista por todos como Wendy, é a personagem de fora que
é levada a este mundo. Está tudo lá, o relacionamento conflituoso de Wendy com
Sininho como um arquétipo das mulheres que se rivalizam em torno de um homem, a
relação maternal e sexual entre Wendy e Peter Pan; uma relação conflituosa
entre tensão sexual e infantilidade, que simboliza o conflito vivido em relação
ao desejo por permanecer criança e a proteção materna, com o despertar sexual.
A Terra do Nunca do Jiro Matsumoto é niilista e fica no
limiar entre o metafórico e o real. É o refugio daqueles que querem fechar os
olhos para os problemas e a dura realidade à sua volta, buscando escapismo em
um mundo fantástico onde eles podem ser o que quiserem ser sem precisarem
crescer e encararem a responsabilidade do mundo adulto – é o que se convencionou
chamar de A Síndrome de Peter Pan, termo psiquiátrico usado para descrever um
adulto que se recusa a agir conforme as responsabilidades que a idade traz
pedem.
Wendy, apesar da camada metafisica e do modo excêntrico de
narrativa do Matsumoto [de personagens alucinados, quebrados, violados,
drogados e miseráveis] onde tudo é contado por uma perspectiva que alude ao
desconexo e caótico em uma confusão entre sonhos e realidade, é uma historia
muito simples e fácil de seguir e de ser absorvida. Manami vive todos os
conflitos típicos da adolescência; a relação conflituosa com os pais [a mãe], o
lar muitas vezes desestruturado, a dificuldade de se encontrar alguém em que se
possa confiar, a estranheza gerada por não ser adulto nem criança, a vontade de
desaparecer para um mundo além, a paixão ardente e espontânea que surge em meio
aos conflitos – hostilizando a mãe, ela é incapaz de entendê-la, para
compreender sua mãe, ela antes precisa se encontrar. A diferença é que a forma
de Matsumoto contar isso é realmente desconcertante.
Não é pertencente à galeria de melhores histórias do
Matsumoto, mas se nota aqui o inicio de uma gradativa maturação do estilo de um
autor; a arte estilizada já se mostra marcante e o traçado elástico nos
personagens também desponta como um recurso a ser amplamente utilizado, porém
aqui se mostra mais inconsistente em alguns momentos, falta o adorno capaz de trazer
à vida a beleza primitiva das personagens femininas que infestam suas obras. De
modo geral, a narrativa visual às vezes se torna um tanto confusa, mas também
tem vários momentos de enquadramentos incrivelmente cinéticos – característica
que também marca presença em outras histórias do autor. Enfim, é uma boa
história, “agridoce” é um termo que cai bem para defini-la. É uma obra difícil
de julgar, pois os diálogos muitas vezes soam nonsense e abstratos, dizer que
são ruins não seria honesto, pois compõe o universo alucinógeno da Terra do
Nunca, mas certamente em alguns momentos são difíceis de envolver plenamente.
Ao fim, vemos que várias pessoas começam a desaparecer, será um final de que a sociedade está colapsando?
Nota: 07/10
Autor: Jiro Matsumoto
Ano: 1996
Volumes: 1 (finalizado)
Demográfico: Seinen
Revista: Morning (Kodansha)
Página: MU
Temas Relacionados:
-[+18] Tropical Citron ― Psychedelic Witch Story: Estonteante Contracultura Psicodelica
Nota: 07/10
Autor: Jiro Matsumoto
Ano: 1996
Volumes: 1 (finalizado)
Demográfico: Seinen
Revista: Morning (Kodansha)
Página: MU
Temas Relacionados:
-[+18] Tropical Citron ― Psychedelic Witch Story: Estonteante Contracultura Psicodelica
Curta o Elfen Lied Brasil no Facebook
e nos Siga no Twitter