Saudações
do Crítico Nippon!
Não
poderia haver série mais saturada. Está muito pior que os remakes de Homem-Aranha
em míseros 10 anos. Após o mangá ter virado anime (e em seguida, versões do
diretor), surgiram duas ótimas adaptações cinematográficas japonesas, que
seguiam fielmente a história com mudanças raras que até exploravam novas
possibilidades interessantes. Em seguida, L Change the World surgiu como um
desastre absoluto, tornando o detetive quase um herói de ação. Em 2015, aparece
uma mini série pavorosa para TV que eu sequer consegui terminar. Em 2016 surge
uma continuação dos longas japoneses, no filme Death Note – Light Up the New
World. E agora temos esta versão da Netflix. Talvez o problema não seja a
quantidade (embora ajude), mas que cada nova versão consiga a proeza de ser
mais ofensiva que a anterior.
Escrito
por três roteiristas que não saberiam sequer escrever uma receita de arroz, o
material original é usado meramente como argumento. Entendo a necessidade de se
modificar a história, caso contrário, teríamos um milhão de adaptações contando
exatamente a mesma trama que já conhecemos (talvez incluam até a morte do tio Ben).
O problema é quando os roteiristas parecem que odeiam a obra com todas as
forças e querem fazer de tudo para destruí-la. É o que acontece nesta que, até
o momento, é a pior adaptação de todas.
É
engraçado analisar as pistas que o filme coloca no início tentando indicar que
Light Turner (Wolff) é inteligente, mostrando que ele resolve os deveres de
casa de vários colegas. Em seguida, ele tem a brilhante ideia de contar para a desconhecida Mia (Qualley) sobre o caderno da morte. A moça, líder de torcida, namorada do
jogador de futebol, e que o deixou ser pego pela direção da escola e colocado em detenção. Quem NÃO contaria sobre o caderno pra essa moça? Qualquer um com
metade de um cérebro.
O
objetivo do roteiro é juntar Kira e Segundo Kira em um único caderno. E toda e
qualquer modificação da mitologia original é um tremendo fiasco. As mortes não
ocorrem por ataque cardíaco, mas sim de forma extravagante como um filme da
série Premonição. Desta forma, L (Stanfield) não tem como deduzir a
coincidência da causa mortis ser sempre a mesma. Então Light, em mais uma
brilhante ideia, resolve fazer os criminosos escreverem nas celas que existe
alguém por trás dos assassinatos (?!?!). E mais. É possível matar Ryuk
escrevendo seu nome no caderno. Bem como anular mortes queimando páginas do
caderno. Ah, e escrever só o primeiro nome de alguém funciona. E
Watari é um nome verdadeiro. É um festival de absurdos além da nossa
compreensão.
Sabotando
absolutamente todos os personagens, Light não é calmo e calculista,
contrastando com seu violento alterego Kira. Não, ele é emburrado e com olhares
de baixo pra cima desde o início. Embora não use seus poderes para matar os
policiais e agentes do FBI que o perseguem. O que já o torna, hum, “menos mal”
que sua versão original e mais fácil para o público dar “carta branca” aos seus
julgamentos. Também o torna menos inteligente (do ponto de vista de
estratégias) e com menos pistas para o L trabalhar. O que culmina no momento
sensacional em que o detetive simplesmente vomita “Light Turner é Kira”, sem
mais nem menos. Ele só acorda um dia e pensa nisso. Isso não é dedução, isso é
varinha mágica com foda-se.
O
diretor Adam Wingard, tão excelente em The Guest (2014) e tão medíocre em Bruxa
de Blair (2016), faz jus ao material abominável que tinha em mãos. Tentando
trazer um ar sobrenatural e suspense artificial ao longa, percebam o amadorismo
de trovões e luzes se apagando quando Ryuk surge. A última vez que tal recurso
se mostrou eficiente foi em Nosferatu em 1922. Sem conseguir sequer criar uma
lógica para banhar os personagens em um eterno azul com leves pitadas de
vermelho. Provavelmente tirado do anime em que Light ficava em tons escarlates
e L em azul, mas que aqui não encontra qualquer significado ou coerência.
O
elenco se mostra determinado a seguir os passos dos roteiristas e diretor, e
destruir qualquer simpatia que algum dia tivemos por Death Note. Nat Wolff
varia entre o covarde e o caricato (notem seus gritinhos com Ryuk); Margaret
Qualley parece determinada a interpretar somente garotas desprezíveis (vide
Dois Caras Legais e a série The Leftovers); Keith Standfield, um ator versátil
que gosto muito, está preso a um L de mil facetas, uma pior que a outra. É
bacana seu olhar levemente triste e modos ríspidos (a cena “Hello. Nice to meet
you. Leave.” só funciona graças a ele). Infelizmente, o detetive enlouquece
completamente, persegue Kira a pé, armado, parece que vai até usar o Death
Note... Céus. Já um ator mais experiente como Shea Whigham sempre proporciona momentos
de respiro e sanidade. E Willem Dafoe ganhou o pagamento mais fácil de toda sua
vida.
Os
Olhos de Shinigami jamais são mencionados, em compensação a história adentra no
dispensável passado de L no orfanato, transformando-os quase em super soldados.
Porém, admito que gostei do caderno vir com anotações de seus donos anteriores,
o que nos faz imaginar o que aconteceram com eles. E a frase “Não confie em
Ryuk” traz um suspense agradável (que jamais se concretiza). Trazendo poderes
infinitos ao caderno, é possível controlar as pessoas como zumbis-servos-pessoais
ao bel prazer do proprietário. Não só isso, como é possível até mesmo escrever
que uma roda gigante vai cair e ela, bem, se despedaça e cai. Ou seja, esta
versão do death note tem o poder de... matar objetos. Assim, quando Ryuk diz
que ele não deveria nem pensar em hipóteses absurdas como “um tubarão atacando
alguém na banheira”, o espectador chega ao final do filme achando que não é uma
possibilidade tão absurda assim.
Ao
lado de Transformers The Last Knight, este Death Note é o pior filme de 2017 e
de toda minha vida. E confesso ter ficado muito mais interessado em acompanhar
a história daqueles outros portadores do caderno que deixaram observações e
dicas nas primeiras páginas. Fiquei pensando neles o filme todo.
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