sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Mayoiga (The Lost Village) - 2016

Saudações do Crítico Nippon!


Em uma noite chuvosa e sombria, somos apresentados a um grupo em um ônibus, em que todos buscam encontrar o Vilarejo Nanaki. Um lugar que supostamente ninguém sabe onde fica (?!?!) e todos buscam uma vida nova lá. Contando com uma montanha de personagens que, a princípio, pode assustar alguns espectadores, o anime abraça seu ar de Expresso do Oriente, Lost e Senhor das Moscas. E alguns pontos dão muito certo. E outros muito errados.


Podendo ser dividido em duas metades, o anime tem a primeira delas feita de forma promissora. É óbvio que não iremos decorar o nome de todos e os motivos que os levaram até ali. O que importa são as relações diversas que eles mantêm ao longo da viagem e dos percalços. Felizmente as “panelinhas” demoram a serem criadas, o que dá oportunidade de todos interagirem entre si.

Inteligente ao criar expectativa e tensão mesmo que não saibamos exatamente o que está nos deixando apreensivos. É um misto de expectativa com o vilarejo e desconfiança daqueles personagens todos. As teorias em torno do local contribuem para isso, alguns dizendo que é uma projeção fantasma, outros que ele vive em constante mudança, etc. Além de descobrirmos regras daquela viagem aos poucos, como a carta de suicídio que tiveram que trazer. O que não impede os personagens de cantarem a alegre canção do hipopótamo, seguros de que estão ali por vontade própria. Mesmo que não saibam exatamente o que esperar. 


Com uma animação e cores que mantém a qualidade do início ao fim, a ambientação e fotografia contribuem para ficarmos incomodados durante toda primeira metade do anime. O ônibus, por exemplo, é focado sempre em planos fechados, sem vermos maiores detalhes da estrada. Seus vidros são escuros e embaçados. E a névoa das noites seguintes contribui para o tom de pesadelo fundamental daquela história (afinal, tudo é possível. Talvez estejam todos mortos no final, não sei). Deste modo, percebam como a fotografia os coloca em quadros apertados, sempre no canto, ou em estradas com as árvores praticamente engolindo-os.

Após chegarem ao Vilarejo Nanaki, a atmosfera vai ficando cada vez mais conspiratória entre todos. O anime é inteligente em não escancarar ameaças na cara do espectador, segurando as rédeas no suspense. Primeiro ouvimos sons estranhos na floresta aos arredores; aí uma personagem diz que viu um gigante em uma caverna (não mostra); aparecem marcas de garras nas árvores; um corpo passa boiando pelo riacho ao longe. E assim por diante.


É então que chegamos na segunda metade e, bem, quanto mais o anime revela, pior fica. Muitas obras acabam caindo nesta armadilha, sobrevivendo melhor quando nossa imaginação completava as lacunas. E The Lost Village é uma dessas obras. Nesse sentido, se parece muito com Ghost Hound, acrescentando seres bobinhos demais, querendo até mesmo que nos simpatizemos por eles.

Ainda que seja uma das forças do anime manter o suspense em andamento com o simples dialogar dos personagens, muitas vezes eles soam irregulares demais. Quando alguém vê uma menina na floresta, por exemplo, temos um “É minha filha... morta há 10 anos!”. Podiam ter colocado trovões e zooms nos rostos dos personagens e abraçar de vez essas babaquices todas. Há também algumas de personalidade incrivelmente destoante dos demais, como a Lovepon gritando “Executar!” o tempo inteiro (deve ser parente do Mikami de Death Note. Só que 80 vezes pior). E um dos flashbacks dos personagens começa com um dramalhão em que (não riam) o pai obrigava o filho de 6 anos a pescar junto com ele. Pois é. Tadinho.

Por outro lado, o anime aproveita a qualidade de sua produção de forma inteligente. Constantemente mostrando na tela o grande grupo inteiro, ou grupinhos de 4, evitando as malditas cabeças flutuantes individualmente. As lanternas frias trazem um ar ainda mais sombrio aos ambientes, tanto internos como externos. Há um único momento em que são usadas tochas, em uma caça às bruxas, trazendo um tom escarlate e perigoso a todos. O que é inteligente, visto que o opaco azul destoaria completamente da situação em questão.


Percebam a comparação entre três outras cenas e a escolha da iluminação. Em uma delas, Mitsumune está conversando com seu interesse romântico. Um dos raros momentos em que o ambiente parece caloroso, aconchegante, quente. Em outra cena, no mesmo ambiente e com a chaleira igualmente acesa, ele está conversando com outra menina. Mais sombria e enigmática, e a luz azulada da lanterna ofusca o calor do fogo, trazendo um ar opressor a cena. Outro raro momento em que um ambiente parece caloroso é na reconciliação entre Valkana e Koharu, acertando suas diferenças. Percebam que propositalmente não utilizaram as lanternas azuis ali (sério, elas são usadas o tempo inteirinho). São decisões inteligentes assim que agregam à história. 


Com reviravoltas pouco imaginativas e personagens forçando a barra em diversas situações, The Lost Village não sabe se quer se concentrar nos jovens ou no sobrenatural. E acaba fazendo as duas coisas de forma falha. O vilarejo em si é pouco imaginativo e não cumpre a imensa expectativa. Entre muitos outros furos e comentarei alguns spoilers insignificantes a seguir, aos mais sensíveis sugiro que pulem pro próximo parágrafo: é absolutamente surpreendente (pra não dizer broxante) que nenhum desses desgraçados morram. Uma história de terror com dezenas de personagem sem coragem de matar um? Chega a ser uma ofensa. E aquelas marcas de garras nas árvores são do quê? Dos Nanakis? A maioria deles eram gigantes. Só a filha criança do motorista não era e acho que não foi ela que fez. E os sons da floresta, eram Nanakis também? Mas todos ouviam ao mesmo tempo, porém não os enxergavam ao mesmo tempo. E por que Masaki diz para eles não irem ao túnel? Nem ela sabe responder.

Em suma, Mayoiga tinha um potencial gigantesco para ser memorável e muito mais assustador do que se tornou. O gosto amargo que deixa ao final é realmente lamentável tamanha qualidade da produção. Já nem lembro mais da trama que vomitam da segunda metade em diante. Embora ainda lembre com carinho do suspense inicial.


(Quer conhecer uma história de jovens que se perdem em uma cidade fantasma que REALMENTE vale a pena? SEUS PROBLEMAS ACABARAM.)

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