Saudações
do Crítico Nippon!
De
Ryogo Narita, autor do aclamado Baccano!, este Durarara!! é um dos melhores
animes de sua geração. Com uma galeria de personagens absurdamente vasta, todos
complexos, o anime conta com uma linha temporal que deposita confiança total no
espectador. Durarara é um exemplo raro de série disciplinada, com inúmeras
características ambiciosas que se misturam harmoniosamente. É um verdadeiro
presente.
(spoilers...
embora não importe muito)
O anime
inicia com o pacato Mikado, que se muda para o distrito Ikebukuro e reencontra
o velho amigo Kida. E basicamente não há como descrever muito mais que isso,
pois a trama é o de menos. O que importa mesmo são as relações entre os
personagens e como cada um deles irá interagir com os outros. E quando e por
que isso irá ocorrer.
Deste
modo, Durarara apresenta com calma inúmeras figuras com características
marcantes, jamais ofuscando uns aos outros. Pelo contrário, um complementa o
outro (como falarei mais adiante). Há, por exemplo, o russo Simon que trabalha
divulgando os serviços de seu estabelecimento de sushi. Constantemente ouvimos
sua voz de fundo oferecendo seus produtos, mesmo que o foco seja em outros
personagens. Há também a lendária Motoqueira Negra Sem Cabeça, “aterrorizando”
a cidade. Embora ela viva em um apartamento com o namorado Shinra e tenha uma
voz doce como sua personalidade. Ela trabalha de entregadora para o misterioso
Izaiya, que parece sentir um prazer descomunal ao manipular todos ao seu redor.
Este, aliás, possui um arqui inimigo chamado Shizuo. Jovem, loiro, vestido como
garçom, ele é literalmente o homem mais forte do mundo, podendo arremessar
qualquer objeto, de qualquer tamanho. O que ocorre praticamente sempre que ele
surge. Em suma, é uma rede de conexões entre todos, um levando ao outro de
forma natural, que é uma delícia acompanhar quem iremos conhecer a seguir.
Assim,
quando um personagem esbarra em outro na rua, podemos ter certeza que dentro de
dois ou três episódios, iremos retornar e saber melhor sobre este desconhecido.
E essa confiança no espectador de que iremos lembrar de todas as peças é
realmente admirável. Aliás, o design do anime é impecável por proporcionar
visuais marcantes para absolutamente todos. Seja pela cor do cabelo, da pele,
acessórios como óculos, chapéus, uniformes de profissões específicas (jalecos,
coletes, capacetes), até mesmo máscaras. O protagonista chega a ser o mais
aborrecido com o enfadonho visual do cabelo preto em zigue-zague.
E
por confiar na agilidade mental de seu público, a série utiliza recursos
narrativos diversos. Como narração em off com vozes dos próprios personagens.
Bem como o chat virtual que todos os personagens parecem participar, com apelidos
que impossibilitam saber quem é quem entre os usuários. Embora o espectador
saiba, pois é narrado com as vozes de cada um. Assim, constantemente comentam
entre si os acontecimentos de Ikebukuro, guiando o espectador no que o autor
quer que nos foquemos. Especialmente em relação às inúmeras gangues mencionadas
pela história ocasionalmente, ficando mais frequente com o tempo, e que parecem
tomar conta de toda cidade. Aliás, a sequência em que descobrimos a quantidade de Dólares através dos celulares é sensacional.
Ikebukuro,
aliás, é uma presença à parte. Povoada pelas mais diversas “criaturas”, o
distrito é repleto de figuras surpreendentes. E todos agem com razoável
naturalidade em relação ao que os cerca. Desde motoqueiras sem cabeça; objetos
gigantes atirados de um lado para outro; hordas de uma espécie de “zumbis”
possuídos por uma lâmina amaldiçoada; em suma, é uma fauna que não possui
limites. Inteligente também ao fazer os figurantes sempre cinzas e somente os
‘personagens da vez’ em cores vivas. Além disso, a produção consegue criar
becos escuros e místicos, com luzes espectrais à noite e sombras realmente
ameaçadoras em diversas ocasiões.
Beneficiado
por uma trama exponencialmente mais sombria, a produção torna os dias mais
chuvosos com o passar do anime. Bem como seus personagens mais amargurados.
Colocando pequenas pistas desde o início, Kida com seu cabelo loiro, detalhes
na bolsa e celular amarelos. É tão sutil os sinais dele como líder dos Lenços
Amarelos que não incomoda. Bem como Sonohara, a garota que se junta aos amigos
formando o trio principal. Sua gravata borboleta vermelha é um reflexo de seus
olhos escarlates quando possuída pela Saika. E Mikado, líder dos Dólares,
fazendo jus a todo seu personagem opaco, possui a gravata mais discreta,
afinal, sua gangue não possui cor.
A
maneira com que a história revela gradualmente que os líderes dos três
principais “movimentos” de Ikebukuro são amigos, e não sabem nada uns sobre os
outros, é brilhante. Especialmente no desenvolvimento de Kida, que fica claro
em diversos episódios o quanto receia voltar a agir como líder dos Lenços
Amarelos. Ele não sente qualquer prazer nisso e até procura usar sua influência
passada para pedir menos violência aos membros da gangue. Vendo sucessivamente
tudo desmoronar ao seu redor, ele consegue expressar que voltou ao posto de
líder com apenas um olhar. Literalmente, pois Kadota afirma que ele voltou à
liderança só de encará-lo.
Destaco
também a força do relacionamento de Celty (a motoqueira negra) com o doutor do
submundo, Shinra. É realmente bonito e visível como sentem afeto um pelo outro,
mesmo em pequenos gestos ou até quando brigam. O que, consequentemente, nos
leva a enxergar com olhos mais abertos o vilãozinho Izaiya, afinal Celty
continua trabalhando para ele. E Shinra costumava ser seu amigo no colégio. São
várias informações soltas no decorrer da série que complementam a todos.
Descobrimos também que o super homem Shizuo odeia violência. E que Simon possui
uma força equiparável, embora evite usá-la.
Falando
em Izaiya, é um dos personagens mais fascinantes. Seus objetivos nunca ficam realmente
claros, pois ele só parece divertir-se imensamente jogando com todos. Ele é
como um pequeno diabo sussurrando no ouvido de todos e assistindo sua
influência florescer de algum modo. Há um momento em que ele relaciona cartas
de baralho com os personagens, e ao se perguntar quem seria o Coringa, ele fica
em silêncio. Oras, é ele mesmo, pois sua influencia transita entre todos. E seu
tabuleiro com peças de xadrez, damas e shogi, é um reflexo não somente dos
Dólares-Lenços Amarelos-exército da Saika, mas do caos que enxerga o mundo e
que ele contribui para isso.
Com
uma trilha sonora constante que evoca ritmo à narrativa, é um trabalho sonoro
belíssimo. Lembra muito o estilo daquelas de Darker Than Black, especialmente
aquelas somente com piano. Assim, Durarara!! torna-se exponencialmente mais
claro em sua trama e complexo nas ações de seus personagens, pois nenhum se
encontra com decisões fáceis. Deixando inúmeras portas abertas para continuação
(e as temporadas seguintes merecem, sim, uma conferida), é um anime completo em
todos os sentidos possíveis. Deixa saudades até hoje.
(para mais dos meus textos, é só ir no menu 'Crítico Nippon' lá em cima)
Twitter: @PedroSEkman
Nenhum comentário :
Postar um comentário
Os comentários deste blog são moderados, então pode demorar alguns minutos até serem aprovados. Deixe seu comentário, ele é um importante feedback.