Eu já falei de Junji Ito algumas vezes aqui no blog, sendo
ele um prolífico mangaka que ficou conhecido principalmente na década de 90 e
que atualmente, é uma leitura essencial para amantes de terror e não apenas
isso, para quem realmente gosta de boas histórias. Eu sempre digo que os
quadrinhos de Ito, não são um terror
pra assustar, mas divertir, te envolver. É normal que durante a leitura de
algumas de suas obras, você se pegue sorrindo, seja pelos motivos mais errados
que exista. Suas histórias te provocam uma mistura de sentimentos, um mixed feeling que vai da inquietude, a
um humor sagaz onde a proposta não é te fazer gargalhar, mas achar graça
naquela ironia presente ali. Suas histórias definitivamente não são
assustadoras, não se utiliza de várias ferramentas comuns no meio, como
explorar gratuitamente o gore, a misoginia ou a violência. Suas histórias são
tranquilas e na maioria das vezes, “limpas”, que podem ou não te fazer
embrulhar o estômago, dependendo de sua sensibilidade.
Junji Ito, HP
Lovecraft, Divindades, Tomie, Uzumaki e Gyo!
Ao contrário de muitos autores e histórias de terror
asiáticas de um modo geral, os quadrinhos de Junji Ito acabam diferindo
bastante das demais, e isso se deve ao fato de suas várias influências
ocidentais – Que tornam seu trabalho muito arraigado nos cânones da literatura
de horror. E claro, não dá pra falar muito a fundo de Junji Ito, sem mencionar HP
Lovecraft, escritor norte-americano e importante nome da literatura fantástica
e horror.
"O mundo é deveras cômico, mas a piada está na raça humana".
Ou
Live After Death - Iron Maiden |
"Não está morto o que eternamente jaz inanimado, e em estranhas
realidades até a morte pode morrer."
Citação de H. P. Lovecraft contido no disco da banda Iron
Maiden, escrita na lápide da sepultura de Eddie.
E Junji Ito entende bem tudo que está sublinhado no trabalho
de Lovecraft e se utiliza dessa influência em diversas histórias, pra não dizer
todas, uma vez que a ideia básica de suas histórias em quadrinhos está contida
nessas duas citações ali em cima. O resultado disso tudo, é incrivelmente
sensacional, com arcos, argumentos e desfechos surreais. A importância de
Lovecraft, entre outras coisas, está em sua contribuição para as histórias de
“Ficção Fantástica”, uma vez que muito do gênero de horror como conhecemos
hoje, vem do fascínio dele por literatura sobrenatural e do “movimento” gótico-romântico,
contido no trabalho de autores anteriores a ele. Azathoth e Cthulhu são
divindades explicadas como seres alienígenas que muitas vezes são falsamente
interpretadas como demoníacas ou de forma não corpórea. Exemplo disso pode ser
encontrado no artigo Envolvimento de bandas com ocultismo esatanismo, onde se encontra a referência da banda Iron Maiden e
Lovercraft.
Tomie |
Se entende que Lovecraft cai muito mais para o lado do
horror do que da ficção cientifica, ainda que muito do que está ali presente
pode ser interpretado como pseudocientífico. E Junji Ito consegue aplicar isso
em suas obras de uma forma às vezes, muito melhor que grande parte dos
discípulos americanos de Lovecraft. Ficando somente no exemplo de suas três
principais séries: Tomie, Uzumaki e Gyo.
Vemos aqui o boom de Ito, não apenas como mangaká, mas com relação às
influências de Lovecraft. Tomie é sobre uma garota que provoca um extremo
fascínio em todos os homens à sua volta, que quando veem que não podem tê-la
somente para eles, matam-na. Só que Tomie não fica morta e sempre volta. Apesar
da variedade de formas violentas que ela é morta, normalmente isso se dá por
esquartejamento. Dai as partes de seu corpo vão se juntando novamente, até
formarem uma “nova” Tomie, linda e exuberante, arrancando suspiro dos homens e
inveja das mulheres. Dessas três séries,
é a mais violenta e explicita e que apresenta um teor irônico de misoginia, que
não cabe nesse artigo (fica para quando
eu comentar Tomie).
“Mutilados, comprimidos, torcidos, a maioria deles decapitados. A
maneira como a cabeça em forma de estrela do mar era arrancada de seus corpos
evidenciava um prazer mórbido, animalesco, cruel… o sangue escuro da raça
ancestral corria pelas ruas das cidades abandonadas“.
A citação acima, de “The Call of Cthulhu”, define bem Tomie,
que me lembra do Nyarlathotep, um dos deuses do “Deuses Exteriores”, um dos vários livros “Cthulhu Mythos”.
Inteligente e de humor mórbido, consegue adotar várias formas, sendo o único a
manter contato com os homens. Já em Uzumaki – A Espiral do Horror, essa
influência é bastante diluída, ainda que presente. O último capítulo de Uzumaki
é simplesmente GENIAL e tem os Mitos de Cthulhu em sua mais pura essência. Já
Gyo, tem bastante influência, a começar pelo argumento da história, até o seu
desenvolvimento.
Uzumaki |
Dessa vez, a divindade é Azathoth, o “juiz” dos Deuses
Exteriores. Fisicamente, ele é uma massa gigantesca e amorfa de caos nuclear,
com enorme força bruta e desprovida de inteligência. Um deus cego da loucura,
um monstruoso caos nuclear, onde na maior parte de suas aparições estão
relacionadas com catástrofes gigantescas. Um exemplo disto é o fato dele ter
destruído o quinto planeta do Sistema Solar, que atualmente é tido como a
cintura de asteroides. Claro, dentro da mitologia proposta.
Os Peixes Andantes de
Gyo!
Gyo é um conto apocalíptico onde todos os peixes do mar, do
nada, começam a “desenvolver” pernas e andar sob a superfície da terra,
causando o caos total. O conceito é cientifico, onde uma arma biológica
desenvolvida pelo governo japonês se desenvolve de forma consciente e acaba se
fundindo com outra arma militar, que depois de décadas no fundo do mar, acaba
oferecendo mobilidade aos peixes. Eventualmente, com o desenrolar da história,
vemos a conversão dessa arma à raça humana. É similar aos filmes de zumbie de
George Romero, que também tem sua influência na Literatura Lovecraftiana. O
vírus se espalha pela população, trazida do fundo do mar pelos diversos peixes,
deixando os infectados em uma forma horrível e semiconsciente. O ápice dessa
trama absurda, é quando esses seres humanos começam a se fundir com a arma
militar. Ainda que seja uma pseudociência, ao contrário dos filmes de zumbie,
Junji Ito nos trás explicações pseudocientíficas realmente muito criativas.
Obviamente, tendo uma forte influencia Lovecraftiana, Gyo
tem aspectos muito sobrenaturais que não podem ser simplesmente explicadas pela
ótica humana. Novamente citando Lovecraft, que era um ateu convicto e crítico
com relação ao comportamento humano. Segundo ele, o ser humano é despreparado
para lidar com a realidade cruel, fria, desprovida de qualquer piedade e
sentimentos. Sendo que a realidade do universo é, segundo ele, o caos, de uma
forma inifinita, aonde o único sentido é tentar sobreviver o máximo possível.
Suas ideias de que a humanidade não passa de uma concha de sanidade mental imersa
num universo completamente alienado e povoado por estranhas criaturas
poderosas, pode ser sentido em Gyo em todos os aspectos. Diante uma catástrofe
apocalíptica como que aconteceu na história, às leis criadas pelos homens divergem
da lei natural, que é predatória e se tornam nulas. Qualquer ser humano exposto
a essa realidade, terá uma tendência de enlouquecer pouco a pouco e é isso que
vemos principalmente na personagem Kaori. Ela é chata, começa a desenvolver uma
síndrome com relação ao olfato e se torna bem insuportável. Mas apesar da
personagem ser a típica garota mimada, ela é interessante e tem a personalidade
bem construída. Não é uma personagem agradável, assim como a Haruhi (de Suzumiya Haruhi no Yuuutsu), mas
são personas importantes para o desenvolver da história que fazem parte e
muitas pessoas tendem a confundir bons personagens com personagens maleáveis.
Nem sempre o bom personagem, será agradável.
E com o desenrolar do primeiro volume, o que vemos é o
estado do progressivo enlouquecimento de Kaori diante a todo aquele horror. E
não apenas dela, ao fundo, podemos ver a humanidade reagindo das mais diversas
maneiras àquele horror biológico. A sanidade mental pode ser vista como uma
cortina que nos protege da realidade e permitindo que a sociedade humana
subsista da forma com conhecemos, completamente alheias à estranheza do
universo que as rodeia. No segundo volume de Gyo, quando os eventos começam a
ficar mais aleatórios e perde um pouco do teor dramático do primeiro volume,
vemos o circo dos horrores, simplesmente um dos melhores momentos de Gyo, onde
as pessoas começam a usar os humanos infeccionados, em um espetáculo bizarro tenso
e paranoico. Destaque para as criaturas que se formam no ar através da fumaça,
como se fossem as almas dos infeccionados, em continuo desespero. Em uma visão
mais subjetiva, você vê ali, os Mythos Lovecrafianos. Outro momento similar, é
quando o protagonista Tadashi, cai num oceano de peixes e logo acima, estranhas
formas se distinguem daquele céu poluído e enfumaçado. Entre os rostos de almas
em profunda agonia que se formou, se encontra o de Kaori, sua namorada que
havia sido infeccionada e não aguentando o tamanho desespero, acabara por
cometer suicídio. Ito deixa vago, se aquilo foi uma visão real ou era Tadashi
delirando. Afinal, aqui não precisamos de exatidão.
Clique para ampliar:
A infecção pelo germe produzido trazia um grande mau cheiro
de gás a partir do tecido do corpo. E uma vez que a infecção matou todos os
animais que serviam de cobaias, teve-se a ideia de construir as máquinas, para
que mesmo com o corpo atrofiado, a carcaça dos animais pudesse ir mais além e
alcançar as tropas inimigas, adoecendo-os. Mas os caças aéreos afundaram navio
que transportava os protótipos para as máquinas. Até aqui, completamente plausível. O
inexplicável vem a partir do ponto onde essas máquinas praticamente ganham
consciência e se conectam aos peixes e por seguinte, aos seres humanos – Além
de que, elas praticamente se multiplicam. Junji Ito inclusive brinca com isso [acho
que] no segundo volume, com um dos personagens dizendo que é como se elas se
multiplicassem mutualmente. Da pequena ilha de Okinawa, os nefastos seres
rastejantes chegam à Tokyo, e em pouco tempo, já dominam todo o planeta.
Uma das caraterísticas de Lovecraft, é que nem ele mesmo
buscava responder todas as perguntas. Assim como seus personagens, envolvidos
com acontecimentos inacreditáveis, o próprio autor não ousava oferecer uma
explicação racional ou coerente. No volume final, o que vemos é exatamente
isso; Um Tadashi completamente absorto, contemplando ao lado do esqueleto de
Kaori, o mundo devastado. E como não poderia deixar de ser em uma obra que
segue o estilo da “Literatura Lovecraftiana”, os desfechos das histórias de
Ito, de um modo geral, são bem assim; pessimistas e com um olhar bem cínico
sobre a humanidade.
Clique pra ampliar: Ilustração de Lovecraft, feita por Junji Ito
Olhando para as imagens estáticas, até me soa engraçadamente bizarro (no sentido pejorativo), mas a execução acaba sendo mais séria do que deveria. Em particular, a cena do avião se chocando contra os peixes é muito bem feita. Com as screens abaixo, dá pra se ter uma ideia da adaptação. Clique nas imagens pra ampliar:
"Kazuo Umezu tem sido o meu artista de quadrinhos favorito, há bastante
tempo. O seu trabalho é muito inspirador. Quando eu estou desenhando, eu sou influenciado
por seu trabalho mesmo sem perceber e acredito que isso acontece com muitos
outros artistas. Seus quadrinhos deixaram uma impressão duradoura devido à alta
qualidade de sua arte de contar histórias convincentes. Eu não acho que
qualquer outro mangaká de horror possa ultrapassa-lo no Japão. Meus quadrinhos
favoritos de Umezu são Drifting Classroom, Fear, e The Grave of Butterfly.”
– Junji Ito.
Clique pra ampliar: Ilustração de Lovecraft, feita por Junji Ito
Um Pouco Mais Sobre
Gyo
“Gyo” (do katakana ギョ, que significa “peixe” em japonês), em uma banda
desenhada, onde o visual é o maior recurso narrativo dessa mídia, mesmo isento
de recursos sonoros e olfativos, consegue impressionar qualquer leitor com o odor
putrefato daquelas criaturas. Esse cheiro – nefasto e pestilento – é ao mesmo
tempo a grande premissa e também o grande desafio desse mangá. E Junji Ito
consegue transpor tudo isso com sua técnica apurada, que também o difere da
grande maioria de seus colegas. Seu traço é bonito e ele consegue desenhar uma
infinidade de efeitos que dão um tom sensacional às suas histórias e não é
diferente com Gyo. Apelando para recursos de sinestesia, focando nas motivações
e conflitos dos personagens, como a obsessão de Kaori com o odor e inserindo
alguns elementos de humor não convencional, ele te dá um entretenimento de
primeira, mesmo se utilizando de diversos elementos trash.
Eu já disse que o traço de Junji Ito é impressionante pra
algo do gênero? E não é apenas isso, os enquadramentos passam o feeling correto
da “ação”, a linha narrativa é apurada. Os contrastes e grandes borrões, closes
nas faces das personagens e até mesmo panoramas impressionantes, ricos em
detalhes e dotados de um fotorrealismo perturbador. Gyo costuma dividir
opiniões, com alguns colocando a série como a obra prima de Junji Ito e outros,
o classificam como o seu mangá mais fraco. A despeito disso, Gyo é o trabalho
mais rico conceitualmente, de Ito. Aqui nós temos um amálgama de elementos do
gênero como os clássicos góticos e o trash americano, mas ainda assim, sem
perder aquele elemento de “estranheza” tão comum no terror japonês. Tem a
característica de Junji Ito.
Gyo em seus dois volumes, conta uma história intrigante e
inquietante, com diversos elementos puramente trashs, como aquelas máquinas
serem movidos a gases humanos, com aqueles peidos assustadores e nojentos. É
muito mais absurdo e hilário, do que assustador (!). Tubarão invadindo casas, as carcaças com cheiro de cadáveres espalhando
o vírus mortal, Kaori naquela forma extremamente bizarra e mesmo depois de,
teoricamente, morta, ainda continuar sofrendo com fortes impulsos de possessividade.
Contudo, Gyo consegue ser, das três principais obras de Junji Ito, a mais leve
se tratando de violência.
Tem o sentimento de putrefação, aquela vibe de “nojo” bem típico
de séries mais trashs e verdade seja dita, Gyo a primeira vista se parece muito
mais uma clássico do cinema B americano, do que uma série asiática. Enquanto
relia rapidamente o primeiro volume, para este artigo, não pude deixar de notar
que mesmo estando lendo pela segunda vez, a sensação de suspense pareciam
saltar das páginas e acertar em cheio o meu subconsciente. Gyo me lembra
bastante “Tubarão”, grande clássico norte-americano de 1975 do velho e competente
Steven Spielberg, mas sem aquela perturbadora trilha sonora icônica composta
por John Williams. Então, mais um ponto para Ito, que conseguiu capturar bem a
essência do suspense, magistralmente capturou a essência do medo na forma de um
tubarão em páginas preto e branco. O primeiro volume é incrível no que diz
respeito à atmosfera, desde a primeira página com Tadashi no fundo do oceano, aonde
Junji Ito vai provocando a curiosidade mórbida do leitor, até a excelente cena
da Kaori no chuveiro, onde ela começa a ter o pressentimento de que algo
estranho está acontecendo. Os quadros dessa página dão sentindo a expressão “linguagem
cinematográfica” que os mangás possuem, mas que nem todos os autores conseguem
aproveitar o máximo. As sequências são excelentes, com o sentimento de
apreensão crescente com Kaori sentindo cada vez mais aquele odor fétido e cada
vez mais peixes aparecendo.
Clique pra ampliar:
Clique pra ampliar:
Assim como Tubarão, Gyo também gira em torno do animal, mas também
tem como foco as personagens. Aliás, assim como os clássicos filmes do Romero,
a história são basicamente sobre os seres humanos, e não sobre a besta. Eu
acredito que certamente, Ito também pegou a ideia básica deste clássico do
cinema: Tudo começa numa ilha movimentada por turistas, há o retardo em mostrar
o tubarão branco e mesmo que saibamos do que se trata, ainda não o vemos de
imediato. Claro que é um recurso dos mais manjados para criar uma forte tensão
e que sempre dá certo, pois o ser humano é muito mais disposto a sentir receio,
do que não pode ver. As sequências da página 64 é praticamente uma homenagem de
Ito. No caso de Gyo, ridículo é um adjetivo que cai como um elogio. Quando um
grande tubarão branco começa a perseguir o Tadashi e a Kaori dentro da casa,
escalando escadas, passando por esguios corredores a procura de sua refeição,
você não consegue achar outro adjetivo que não seja ridicularmente absurdo algo
como aquilo (Ainda que se trate de
terror. Ainda que se trate de ficção). Mas funciona e a concepção disso
tudo é fantástica. Você também pode interpretar toda essa situação do tubarão
branco e sua perseguição ao casal da história como um cinismo de Ito com
relação aos japoneses e sua relação predatória com a vida no oceano.
Mas Gyo cai drasticamente de qualidade a partir do segundo
volume, ainda que numa média geral continue bom, você perde o suspense e sente
como se Ito estivesse esticando a história em alguns momentos, para que pudesse
cumprir o planejamento de 2 volumes do mangá, com certas situações claramente
arrastadas. Mas tem o seu valor, principalmente por conta dos desfechos de
alguns conflitos, a excelente sequência de Tadashi e Kaori no circo das
aberrações e o cenário desolador, que se vislumbra na página final.
Gyo, conta ainda com duas histórias extras, completamente
distintas da principal. The Sad Tale of the Principal Post (O triste conto do pilar principal), que é um conto onde um chefe
de família se encontra, de alguma forma inexplicável, embaixo do pilar central
de sua casa. Não faz sentido e nem há explicação, mas este não é um ponto já
que se trata de uma metáfora sobre os sacrifícios que um homem faz pela sua família.
A segunda história, The Enigma of Amigara Fault (O enigma da fenda de amiga) é sensacional e executada de uma forma
até mais competente que Gyo. Trata-se de um estranho fenômeno que vem
acontecendo em certa parte do mundo, onde numa montanha começam a surgir
buracos em forma humana com uma incrível perfeição. Cada buraco representa a
uma pessoa, que se encaixa perfeitamente nele. Esses buracos exercem uma
estranha fixação nas pessoas que vão até lá conferir os seus “buracos” em forma
humana, fazendo os adentrarem ali e nunca mais serem vistos. O ritmo é perfeito
e o suspense cresce a cada quadro e a sensação de claustrofobia que aquelas
fendas causam no leitor, é simplesmente genial. Sem dúvidas, é uma leitura
obrigatória e novamente trás a tona o fascínio humano pelo desconhecido. Assim
como as personagens da história sentem um impulso incontrolável para adentrarem
naquelas fendas, nos leitores nos sentimentos morbidamente atraídos por
histórias assim. Brilhante, Ito.
A Versão Animada
Em 2012, Gyo ganhou uma versão animada, um OVA de pouco mais
de 1 hora. Esta foi a primeira adaptação de uma das obras de Ito, em animação,
mas o resultado acabou não sendo nada mais que um entretenimento medíocre de
média qualidade. Apesar do excessivo uso de CGI, que acaba deixando um tom
superficialidade, a produção é razoavelmente boa, porém com uma direção errante
e escolhas equivocadas. A versão animada de Gyo, nada mais é que um completo
vazio, onde as personagens ali presentes são a metáfora perfeita para a falta
de personalidade, originalidade e sentimento dessa adaptação. Alguns vão dizer
que vale pela diversão descerebral e realmente, uma vez que diversão não é sinônimo
de qualidade. Gyo pode ser visto como apenas mais um filme catástrofe do cinema
B americano, feito para locadoras, mas mesmo como uma obra isolada o
entretenimento é de baixíssima qualidade.
As escolhas tomadas pelo diretor Takayuki Hirao são bastante
questionáveis, ao retirar o que há de melhor no original, traçar uma nova
história a partir da concepção da mesma e fazer um brinde ao vazio, onde a nova
protagonista da história acaba representando o que há de pior na indústria.
Claro que mesmo vazio, poderia ter sido uma produção agradável, o que não é o
caso. O que é uma pena, pois o projeto do estúdio ufotable ao qual este OVA fez
parte, é destinado a produções que não teriam vez em um foco comercial e dar
espaço para seus funcionários “brincar”, as possibilidades de produzir algo
diferente de tudo que atualmente há na indústria e com originalidade, acaba
sendo desperdiçada com apenas mais um do mesmo.
Gyo seja a melhor obra de Ito, ou não, definitivamente vale
a pena à leitura e mostra que suas excelentes críticas, são justificáveis.
Também mostra que material de qualidade pode surgir de qualquer gênero, e que
mesmo uma história tão básica, pode oferecer bem mais do que apenas entretenimento
barato e descartável.
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