sábado, 17 de maio de 2014

Kuro no Sumika: Chronus – Anime Mirai 2014

Misteriosas pessoas de preto à espreita. 
O Studio 4°C, apesar de produzir de tudo (como a grande maioria dos estúdios de animações), é mais conhecido por suas produções menos comerciais convencionais, tal qual Eternal Family ou Tekkonkinkreet, geralmente são animações menores e de curta duração. Mas eles também fizeram Berserk: The Golden Age, utilizando uma técnica nova em termos de anime e não se saíram muito bem. No entanto, eu tenho a mania de associar o 4ºC a ideias criativas que fogem da curva, embora não necessariamente bem conduzidas. Talvez seja grande parte da minha surpresa ao vê-los como o estúdio de um projeto como Chronus, patrocinado pelo Anime Mirai; projeto que dá possibilidade para um diretor novo mostrar seu talento, tenha ficado muito aquém do se poderia esperar desse âmbito.

Ele não traz nada de invencionismo ou ousadia em termos de animação ou conceito argumentativo, é uma produção bem padrão para um projeto desse tipo, mas é bem conduzido. O verdadeiro mote do enredo só se revela verdadeiramente ao final e subverte as expectativas no que diz respeito a determinado conceito - ainda que o título evidencie a virada ao final. A moral da história é bem legal, nos conta sobre um garoto chamado Makoto Nakazono (Natsuki Hanae), um jovem do ensino médio que consegue ver shinigamis – espíritos da morte. Ele se frustra por não conseguir fazer nada a respeito para evitar que as almas das pessoas sejam levadas por estes seres, ainda que possa ver quando os shinigamis estão por perto, já que sempre que tenta fazer algo as pessoas pensam que está louco. Com o tempo, ele passa a aceitar essas ocorrências com certa naturalidade, afinal, não há nada que se possa fazer contra o destino. No entanto, as coisas tendem a tomar rumo inesperado quando a sombra da morte começa a rondar sua amiga de infância Hazuki Horiuchi (You Taichi).
A mensagem é obvia, mas permitam-me comentá-la (possíveis spoilers). Na mitologia grega Cronos é o deus do tempo e das estações. Vivemos uma vida sob a égide desse deus chamado Cronos, onde seguimos uma ordem natural pré-definida do que deve ser; como e onde. É curioso pensarmos que mesmo que saiamos dessa interpretação grega, o tempo de Chronos ainda é o que melhor se adequa ao pensamento comum, principalmente nos tempos atuais onde vivemos sobre uma ótica cada vez mais racional, onde o planejamento [de metas e etc.], autocontrole e a melhor administração do tempo são tidos como ferramentas essenciais para o sucesso em qualquer esfera da vida. Mas além de Chronos, os gregos também tinham outra referência para classificar o tempo, que é Kairos. Seu nome significa “o tempo certo” ou “oportuno” e ele se opõe ao tempo cronológico de Chronos, formando então uma espécie de dualidade. Kairos é contra esse agendamento da vida onde tudo é calculado e enumerado, Kairos é uma entidade correspondendo ao tempo existencial e, portanto, ele alude ao indeterminado, natureza adaptativa, melhor usufruto da vida e às inconstâncias e emocional.

Tanto a filosofia de Chronos quanto a de Kairos são fundamentais para a existência humana. Se por um lado, é importante saber antecipar eventos, programar e planejar o tempo/futuro, por outro qualquer realização depende de um conjunto de ações encadeadas imprevisíveis, é importante saber lidar com o que foge do controle. Deste modo, o equilíbrio de um ying e yang é o ideal. Se deixar escravizar pelo tempo é uma forma de viver engessado.  Ao priorizar Chronos, sufoca-se Kairos e o potencial inconsciente do espaço na mente em lidar com o que não é planejado. É então que Chronos surge como um ceifador monstruoso. A adversidade é o que nos prepara física e emocionalmente para lidarmos com várias questões no ciclo da vida. É o que ocorre com Makoto, que tal qual a sociedade moderna, vive atormentado pelo fantasma temoroso do destino. Chronos não apenas ceifou sua autoconfiança na capacidade de lutar contra, como sua capacidade de agarrar o destino com as próprias mãos e se ver como um ser individual alheio a previsibilidade de um destino pré-concebido por qualquer deus. Tempo e destino são duas forças simbolicamente ajustadas ao modelo de mundo que é guiado pela racionalidade.
Makoto incapaz de lidar com o destino, passa a aceitar todas as mortes como fruto de sua impotência cósmica, desviando de si mesmo ao ponto de não conseguir aproveitar melhor a vida ao lado de quem lhe interessa (Hazuki). Na ótica junguiana, quanto mais nos afastamos de nós mesmos e nos submetemos a tudo que visam controlar nossas experiências e existência, menos nos sentimos indivíduos. Extrair o melhor de dois mundos é o que o livre arbítrio proporciona, e Makoto ao final entende que não existe um deus estabelecendo um destino imutável, mas que muitas coisas para se tornarem realidade apenas dependem de uma enorme força de vontade e esforço para se concretizarem. Somente ao se encontrar, ele perceberá a infinidade de coisas maravilhosas que existe diante de seus olhos, para o qual ele estava incapacitado de ver devido as suas frustrações anteriores e gradativo abandono do controle de suas ações. Tudo isso, para dizer, basicamente através de uma alegoria conceitual da morte, que os rumos de sua vida dependem mais de suas ações do que da vontade de qualquer deus.

Embora não tenha tido uma condução forte o suficiente para marcar, é um desfecho bonito e doce, principalmente numa cultura onde o budismo é uma religião imperante. 

Nota: 07/10
Direção: Naoyuki Onda
Estúdio: Studio 4ºC
Tipo: Curta-Metragem/TV
Duração: 25 min.
Perfis: ANN, MAL, Anilist

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