Depois que eu li o primeiro capitulo de Honey & Clover, de Chika Umino, eu não consegui mais parar de
ler, em menos de dois meses eu já havia devorado 7 volumes e desde então, estava faltando apenas 3 para que o mangá
chegasse ao fim aqui no Brasil, pela editora Panini. Aquela história do grupo
de cinco amigos que estavam na complicada ponte que separa a adolescência da
vida adulta, onde cada um teria que fazer uma decisão que iria decidir seus
futuros. Em meio a tantas dúvidas, dissabores e lágrimas, eles ainda tinham
aquela amizade entre ambos que era uma fonte perfeita de escapismo. Eu me senti
completamente envolvida e apaixonada por aquele universo tão crível e poeticamente
melancólico. Desde então, já li alguns mangás que realmente conseguiram mexer
comigo, mas nada tão apaixonante e que me fizesse identificar com cada
situação, cada quadro, cada pensamento e atitude de um personagem. Isso até eu
encontrar Solanin.
Na história criada pelo talentoso Inio Asano, de Oyasumi Punpun (que também estou adorando ler), nos vemos as voltas com a história
de um jovem casal e sua vida cotidiana; estes são Inoue Meiko e Taneda Shigeo. Ao
contrário do tom agridoce de Honey & Clover, onde parte do elenco ainda
está estudando e tendo que encarar a difícil decisão do que serão no futuro,
aqui nos é mostrado à fase além. Ao menos no que diz respeito ao casal
principal. Ambos saíram de suas cidades do interior, para tentar a vida em
Tóquio. Conheceram-se, namoraram e resolveram morar juntos. Um ponto
interessante é que por ser uma história sobre o cotidiano, acaba sendo uma
releitura de uma situação da vida real que é muito comum e inio Asano não perde
tempo em introdução. A história já começa de forma abrupta, de um ponto da vida
daquele jovem casal, insatisfeitos com a forma estagnada que suas vidas se
encontram. Só que eles não são mais crianças e estão longe das asas dos pais. É
então que a indecisão bate à porta; ir de encontro aos seus sonhos, apostando
em algo incerto ou continuar fazendo parte do sistema que transforma a todos da
sociedade em peças de uma enorme engrenagem?
“Mas ter uma vida
comum empurrada com a barriga, é muito mais complicado do que parece. Mas
talvez, o que mais estivesse me incomodando, fosse ver o Taneda tentando virar
adulto a todo custo.”
A estrutura de Solanin é bem intimista, sobre dois jovens
que buscaram uma razão de ser. E Asano nos permite ver o interior de seus
personagens, o que trás uma identificação quase que instantânea. Começando com
a Meiko, que trabalha em um escritório e tem certo problema em aceitar a forma
como a sociedade e os adultos agem, tão robotizados. Ela é aquele tipo de
pessoa que ainda não conseguiu se enquadrar na sociedade e nem encontrar algo
que gostaria de realmente fazer. Gostei da forma como o autor retrata esse “vazio” na personagem, essa procura
desesperada que nada lembra o seu semblante, sempre calma e passiva. Lindo
também é a química entre ela e seu namorado, o Taneda. Eles estão naquele
estagio onde não precisam dizer nada, que um já sabe o que o outro está
pensando. Ele trabalha como designer, mas seu grande sonho é ser musico. Aliás,
mudar o mundo com a música, mas encontrou na vida prática um empecilho para
levar o seu sonho adiante, afinal, ele já não é tão jovem e precisa se
sustentar. Além disso, o Taneda é bem inseguro, tem medo de falhar ao sair de
sua zona de conforto e aparenta não estar pronto para as críticas que possivelmente
iria receber.
Meu coração quase saiu pela boca quando Meiko lhe diz que
estava pensando em sair do emprego por não estar satisfeita e ele lhe dá um
apoio irrestrito. Mas não entendam
errado, meu coração quase pulou pra fora, mas foi porque achei aquilo tudo
muito romântico, uma cena de cumplicidade mutua em que tudo ao redor parece
parar e os refletores estão todos sobre os dois. Claro, depois ele se dá conta
da situação e leva um susto quando ela lhe diz que realmente saiu do serviço, o
que foi uma situação bem engraçada. Durante esse tempo em que Meiko não sabe o
que fazer da vida e se encontra num estado letárgico e passivo, ela anda por
todo o cenário da história e Asano vai nos apresentado a todos os personagens
de fundo. São igualmente carismáticos, excêntricos e também, estão procurando
sobreviver em meio à selva competitiva de Tóquio.
Gostei em especial, do Jiro Yamada, ou melhor, o Billy (seu apelido) que representa bem o cenário
proposto por Asano em Solanin. Ele já deve estar na faixa dos 23/25 anos e
trabalha na farmácia de seu pai. É solteiro e aparentemente, vive no automático,
ou pelo menos, foi assim que eu senti em toda a subjetividade ao qual ele é
apresentado por Inio Asano. “É sapo, que vida é essa?” – É bem engraçado e gera
um sorriso involuntário a forma como ele é representado na história. Ele,
juntamente com Kato, formam com Taneda uma banda de garagem. É bem bacana a
interação entre aqueles amigos que se conhecem desde os tempos de faculdade.
Tudo isso, acaba ajudando a criar um clima bem familiar para história.
Apesar do primeiro volume ser bem introdutório, eu li
afoitamente cada página, quase que sem respirar. Seguindo uma espinha dorsal
que dialoga sobre as incertezas da vida, nunca vi tanta graça em um cotidiano
tão tedioso, como o de Solanin. Realmente tem um clima de felicidade morna,
passa a sensação de que algo está escorrendo pelos seus dedos e você não faz a
menor ideia de como agir. O clima é o recheio do bolo, onde Meiko enfim resolve
falar o que realmente desejava desde o inicio, encorajando Taneda a seguir com
a banda. O que acaba os colocando em uma situação ainda mais delicada. Como não
se sentir explodindo por dentro com o casal chegando num ponto de ruptura silenciosa,
onde nenhuns dos dois não falam nada, mas sentem que algo importante se perdeu
no meio daquilo tudo? Em meio a tudo isso, toda a angústia de ter que lidar com
aquela situação inesperada, que parece rumar a um fim trágico e dramático.
Sonhos, desilusões, o difícil momento de ter de encarar a
vida real, se misturar em meios a tantas outras pessoas. Parece extremamente
complicado e dá um certo receio de não saber o que virá a seguir. E Inio Asano
executa isso de forma perfeita e realista, principalmente quando mostra uma
Meiko completamente desmotivada com a rotina sem graça do dia-a-dia em seu
serviço. Acha que largando o emprego, se sentiria livre e independente, mas só
encontra mais tédio pela frente e aquele sentimento de que está desperdiçando
sua vida, vegetando e não conseguindo dar um passo adiante. Gostei bastante de
como ela é retratada, passiva e incapaz de fazer qualquer coisa pra mudar a sua
vida, mas sempre observando o Taneda e ainda que silenciosamente, o
pressionando. Parecia não ver que este também estava se afundando
silenciosamente e sentindo o peso daquela relação. Você terá que ter lido pra
entender tudo isso e ter conhecimento da brilhante catarse que Asano reserva
para o jovem casal ao final do primeiro volume.
Enfim, leitura altamente recomendada para todos que querem
se sentir tocados de alguma forma por uma narrativa que lhe seja familiar ou
que buscam meramente um entretenimento solido e bem construindo e
consequentemente, desenvolvido. Para quem já passou por esse complicado momento
ou para os que estão prestes a passar por esse caminho da independência. Afinal,
eu também me sinto muito como as personagens dessa história às vezes, sentindo
que não estou vivendo meu máximo e completamente acorrentada pelo tédio do dia-a-dia.
O traço é lindíssimo e foge do traçado caricato e comum que vemos nas maiorias
das histórias hoje em dia. Nesse aspecto, é bem original. Aliás, Solanin lembra
bastante mangás josei, seja no traço ou na narrativa empregada na história.
Bom, em breve comento o volume 2 aqui e de uma forma mais completa.