Um sorriso forçado enquanto o mundo a sua volta desaba.
Um episódio carregado de melancolia. Muito apropriado ao seu
conteúdo. Único espaço para o humor é o não intencional, como quando o detetive
Hamura é enganado por Shibazaki, que o faz correr pela cidade atrás de uma
marca de cigarro pouco conhecida apenas para não envolvê-lo num caso que
poderia acabar com sua carreira.
(A direção artística acompanha o mesmo timing do texto, com
as cenas aberturas sendo retratadas com um tempo fechado – que começa a ser
sentido na noite do episódio anterior –, mesmos nas cenas internas há uma certa
claustrofobia, já que a luminosidade não é permita entrar completamente. A
paleta de cores para as cenas abertas na cidade estavam explendidas, também
muito carregadas.)
Já Shibazaki sente que não tem nada a perder. Ele já tinha
perdido seu prestigio, jogado para o porão, suspenso e ameaçado de demissão. Buscando
por um objetivo, a relação com sua família também fora prejudicada. A conclusão
desde caso significa o fim de um ciclo para Shibazaki, o qual ele vem
perseguindo há tempos. Dessa forma, podemos observar o tempo que passou nos
arquivos mortos da policia, fora de circulação, como também um período em que
esteve perdido; sem vida – durante sua estadia ali ele era retratado sempre preguiçosamente
estirado no sofá, resolvendo palavras cruzadas no jornal, completamente desinteressado
de tudo, até surgir Sphinx, que novamente deu um sentido à sua vida. É quando
Shibazaki retorna ao seu posto anterior é a viver novamente.
Da mesma forma Twelve se sente desorientado quando trai Nine
e acredita que não tem mais um papel a desempenhar ao seu lado. Twelve e Nine
têm vivido por um único objetivo. Que é revelar a verdade por trás da Rising
Peace Academy e o Projeto Atena, acordando a população para as coisas que têm
acontecido embaixo de seus olhos sem ao menos se darem conta. Novamente a
natureza cíclica da vida vem à tona na narrativa, onde Édipo se volta contra
seu criador. Por isso que é compreensível a apatia de Twelve após salvar Lisa,
bem retratado no modo como se comporta e as tentativas vãs de fugir com ela
para longe de tudo que se relacione a Nine – mas ele não pode fugir de si
mesmo, e embora tente, o sentimento de culpa vai continuar o infligindo. É
excelente como o roteiro leva essa situação, sem cair na armadilha fácil de
fazê-lo acusar de Lisa, para criar uma situação dramática desnecessária. Seria
um crime e contraditório com o que vemos no episódio anterior.
Nisto, cheguei a conclusão definitiva de que Twelve não vê Lisa como um interesse sexual (ufa!), a Lisa simboliza
aos seus olhos as crianças que foram deixadas para trás e como um retrato vivo
dos problemas daquela sociedade, de modo que se ele abrisse mão dela, estaria
igualmente se sentindo devastado. E pela segunda vez, já que eles nunca puderam
esquecer as crianças que ficaram para trás e a culpa que sentiam por estarem vivos
elas não.
Infelizmente, Five é a única personagem que se sente
desorientada e sem um grande papel nesta narrativa. Ela poderia ser apenas um personagem
de apoio, como Hamura, representando o governo americano e sem conexão com
Sphinx, e seria bom – diria que até melhor. Mas ela tem uma trama que se
conecta se entrelaça diretamente com a de Nine e Twelve, que no seu momento
definitivo, não tem nada a dizer. O seus diálogos finais com Nine e seu obvio
objetivo são francamente fracos, e se emparelhado com toda a teia de tramas de
Zankyou no Terror, chegamos a conclusão de que foi um trama ruim. O que Five
tem a dizer? Ela foi apenas uma mulher obcecada por um cara, que fez dele sua
razão para continuar vivendo. Pior: os dilemas de Five são todos mal resolvidos
pelo roteiro. Ela poderia ter escapado com os dois, mas resolveu ficar. Então
passou o resto da vida perseguindo Nine (sim,
Nine. Twelve foi apenas consequência), e quando finalmente o encontra, quer
capturá-lo ela mesma. Ao se postar diante dele, o que ela diz? Que nunca
conseguiu superá-lo, revelando que sua motivação era uma tola rivalidade sem
sentido – no fim das contas, tudo o que ela queria era continuar brincando. Ao
menos é o que se subtende desta caracterização tão medíocre quanto a de Misa
Misa em Death Note; a de Misa Misa ainda tem um sentindo e se pode tirar uma
leitura interessante dali. Já Five foi apenas uma personagem confusa,
contraditória, que embora tenha fisicamente crescido, se manteve na infância.
Seria uma coisa realmente boa se o roteiro tivesse explorado este aspecto da
personagem, fazendo com que ao menos pudéssemos acreditar na sua motivação, mas
não acontece, pois não vemos nem nada sobre Five.
No fim, o único momento em que pudemos realmente sentir Five
foi nestes últimos segundos finais ao se encontrar frente-a-frente com Nine.
Seu sorriso é triste e percebemos como a sua existência foi completamente vazia
de um sentido maior até aquele momento. Teria sido excelente se o roteiro da
série tivesse se preocupado mais em dar substância à personagem. Infelizmente,
a trama de Five se sente inútil para o enredo global, tendo um impacto mínimo para
a história – mesmo a tentativa de atrapalhar o percurso de Nine poderia ter
sido desempenhada por qualquer outro personagem.
Lamentável pela história, e lamentável que a única força
feminina de Zankyou no Terror tenha sido reduzida a uma motivação sem qualquer
substância.
***
Por falar no Watanabe, o autor-diretor adora fazer referências
culturais nos títulos dos episódios de seus animes. Em Zankyou no Terror sei de
My Fair Lady do episódio 8, e deste agora. Helter Skelter é uma famosa música
dos Beatles, que Paul McCartney usa como metáfora; “Eu usei o símbolo do brinquedo
helter skelter como uma ida do topo para o fundo – a ascensão e queda do
Império Romano – e esta era a queda, a decadência, a ida para o fundo”.
Helter Skelter é o termo pelo qual eram chamado os tobogãs
na Inglaterra, além disso, o termo pode
significar um sentido de descida desordenada, sem controle (ou confusão e algazarra).
Caiu bem para a temática do episódio.
Mas quem é que estaria descendo desordenadamente, indo para
o fundo – Sphinx? Ou seria a queda dos poderosos? É triste, mas tudo indica que
seja Sphinx e as últimas crianças sobreviventes do projeto Atena. Faz sentindo.
O quartel que existe por trás desta organização é poderosíssimo,
além de Sphinx também atrair o interesse do governo americano. O final não
poderia ser mais melancólico e adequado, com Nine dizendo “Adeus”. Em seu
ultimo gesto, ele leva o protótipo de bomba atômica que o governo vinha
fabricando escondido para o ar, numa cena simbolicamente linda, evitando que o
Japão novamente tenha sua historiada manchada pelo cogumelo da morte – é
sequência, que não sei se é proposital ou não, alude ao desfecho do filme Cowboy
Bebop: Knockin' on Heaven's Door. Quem viu entende.
Finalmente eu entendi o sentido de Sphinx evitar fazer
vitimas fatais em seus atentados. Eles são um experimento, criados como “armas”
no intuito de elevar novamente o orgulho nacional frente a outros países,
manchado pela bomba atômica e subjugação americana. Zankyou no Terror
referencia o contexto politico atual japonês, onde nacionalistas tem defendido veementemente
o restabelecimento de forças e poder militar em solo japonês, o que é proibido
segundo acordo feito durante a Segunda Guerra Mundial entre Japão e EUA, com a
rendição dos japoneses. Isso resultou em um país sem um exercito nacional e diversas
bases americanas em seu solo. Pelo pouco que sei, o que os nacionalistas
defendem é a ruptura desta clausula e sua total “independência”, uma
vez que este vínculo fere o orgulho patriótico de muitos conversadores no
Japão. Zankyou no Terror utiliza o termo “individualidade”, o que é um tanto irônico
para uma cultura coletivista, mas faz sentido no contexto defendido: sua
individualidade significa poder voltar a ganhar um sentido próprio e
independente, segundo a cartilha nacionalista.
Enfim, Zankyou no Terror está sempre fazendo um link com o
passado conturbado do Japão [sendo que a própria história em si pode ser
entendida como uma alegoria sociopolítica]. Sphinx representa as vitimas feitas
pelo ímpeto nacionalista (recomendo o
longa animado O Tumulo dos Vagalumes/Hotaru no Haka. É um filme que expressa
com maestria o ímpeto nacionalista e como ele levou à morte dezenas de vidas
inocentes. É fabuloso, e triste. Experiência devastadora, você sai deste filme
com um vazio no peito), Lisa a realidade de muitos jovens da geração atual,
enquanto Shibazaki é o avatar que reflete todos os fantasmas do passado. Duas
coisas que Shibazi disse em episódios anteriores chamam a atenção; as
frequentes queixas em relação ao verão e sobre Sphinx serem considerados heróis
se estivessem inseridos em outro contexto histórico. Os anos 50-60 e 70 no
Japão foram intensos, em particular os 60 e 70, onde manifestações populares eclodiram
nas ruas concomitantemente com a explosão da contracultura. E o verão é
utilizado como uma sutil referência à Segunda Guerra mundial, a estação que
ficou marcada pelo bombardeio atômico no Japão. É uma metáfora utilizada para
ilustrar as sequelas deixadas em Shibazaki, uma criança nascida naquela
geração.
Por tudo isto é natural que Twelve e Nine que também são
vítimas do nacionalismo, evitem ferir da mesma forma que foram feridos. Suas vidas
foram roubadas por um ideal, e se há algo de marcante nesta horrível despedida
de Five, é o seu sorriso melancólico de alguém que não lhe fora permitido a
vida plena e o fato de ser um experimento descartável com prazo de validade (ver como seu parceiro aponta uma arma para
ela e a diz que seus serviços não se fazem mais necessários). O se pode
tirar de tudo isto talvez esteja no emparelhamento da motivação da Sphinx com o
flashback de Shibazaki num pleno verão solitário e silencioso, onde a verdade
do passado de guerra japonês tem sido evitado pelas pessoas, não sendo algo retransmitido
para a nova geração (achei chocante um
depoimento de uma mulher, dizendo que mesmo quando era garota e vivia numa
cidade não afetada pela guerra, ela passou muito tempo sem saber o que se
passou na outra cidade afligida pela bomba e que mesmo quando descobriu, eram
apenas detalhes superficiais).
Podemos dizer então que o título do episódio se relaciona ao
seu conteúdo, onde o governo tentava novamente produzir escondido uma arma
capaz de elevar o orgulho nacionalista. Era isto que Nine queria denunciar, e o
faz enquanto o protótipo da bomba sob pelos are, sob a visão da população. Sphinx
sendo uma vítima deste ímpeto nacionalista que não se retrai em utilizar vidas
inocentes para alcançar seu objetivo, não faria sentido eles desferindo ataques
fatais à vidas inocentes, a mensagem se perderia.
A decepção pela Five ainda é latente em mim, mas não me
impede de apreciar um desfecho tão incrível para a premissa da história. Ainda
não acabou, o que virá a seguir? Nervosamente ansiosa.
Avaliação: ★ ★ ★ ★ ★
Roteiro: Jun Kumagai
Storyboard: Michio Mihara
Direção auxiliar: Masahiro Mukai
Diretor: Shinichiro Watanabe
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