segunda-feira, 13 de março de 2017

Ghost in the Shell (1995)

Saudações do Crítico Nippon!

Adaptado do icônico mangá de Shirow Masamune, Ghost in the Shell ganhou vida em 1995 pelo consagrado Mamoru Oshii, quando a internet ainda engatinhava. Assim, seus méritos “proféticos” em termos de ciberespaço e questionamentos de Homem x Máquina se tornam ainda mais impressionantes. Era uma época em que o mundo estava mergulhado no medo dos avanços tecnológicos, representado no Ocidente, por exemplo, com Exterminador do Futuro (84) e Blade Runner (82) (e Ghost in the Shell lembra imensamente a obra máxima de Ridley Scott). E, no Oriente, um dos representantes máximos certamente é a trajetória da Major Motoko Kusanagi.



A trama do filme se passa em uma cidade obviamente inspirada em Hong Kong, no ano de 2029. Pessoas e ciborgues convivem e trabalham juntas, e possuem cérebros cibernéticos chamados de ghosts. Neste universo, Major Motoko Kusanagi, Batou e Togusa trabalham para a Sessão 9, responsáveis por cuidar de crimes cibernéticos. É quando pessoas com implantes neurais começam a ser hackeadas, tendo seus pensamentos e memórias alteradas por um poderoso ser conhecido como Mestre das Marionetes.

Adotando um ar extremamente contemplativo, as ações do vilão e a busca dos heróis por ele, são apenas uma desculpa para os questionamentos filosóficos que a obra propõe. O próprio nome que suas mentes ganham, “ghosts”, já diz muito como aquelas mentes (ou “almas”) são encaradas. Algo que não existe realmente, mas que para aqueles que vivem como tal, qual a diferença? Como eles distinguiriam entre memórias originais ou hackeadas? Em última análise, não foram todas plantadas? Como julgar se uma mente humana tem mais valor que uma artificial, se a ciborgue aparenta ter consciência de si mesma, além de refletir suas ações e consequências? O que mais é necessário para sua mente ser considerada, bem, mente?




Aliás, na maior parte do filme acompanhamos justamente os questionamentos existenciais da Major. Claramente auto consciente, Motoko possui o inusitado passatempo de mergulhar no mar, buscando justamente evocar sentimentos como medo, solidão, esperança (segundo ela mesma). Assim, mesmo arriscando a própria vida (ou “vida”?), ela se submete a esse hobby justamente buscando se sentir... viva. Sua ânsia em “sentir” (e essa é a palavra chave) qualquer coisa nos leva naturalmente a questionar quão artificiais são aqueles ghosts. A própria trilha sonora neste momento chave ganha toques mais leves e alegres, contribuindo para entendermos o que a personagem está sentindo. Desta forma, o nascimento de um “vilão” que se rebela por ter a sua alma constantemente violada pelos humanos (e futuramente descartada) não é algo extremamente natural? Não só natural, como praticamente inevitável.



Mamoru Oshii evoca sensações de sua atmosfera opressiva, auxiliado por uma fotografia noir hipnotizante. Percebam, por exemplo, como Major é emoldurada com os cantos negros em uma cena emblemática, reduzida em quadro de forma sombria e fria. Um reflexo de sua mente? Da maneira que ela se sente (de novo essa palavra)? Aproveitando o clima tempestuoso, o filme cria simbolismos com a água em inúmeros momentos. Já no inicio da obra vemos Major sendo criada a partir de uma substância aquosa. E é justamente nesse estado líquido (no mar) que ela busca “sentir” algo. É praticamente um resgate ao seu útero cibernético, às suas origens, à sua essência. Aliás, Oshii aproveita até mesmo o reflexo de Major na água, formando um espelho, um dos símbolos mais utilizados para evocar questões de dualidade. Neste caso, sobre a Humanidade e/ou Artificialidade da protagonista.

Algumas analogias mais suteis, inclusive, como o Mestre das Marionetes definindo a si mesmo como “um mar de informações”. O oceano pode representar até mesmo isto, a vastidão infinita que os ghosts permitem que suas almas absorvam do ciberespaço. Embora sempre reprimidos pelos humanos por considerá-los artificiais. Desta forma, a própria nudez constante das personagens pode ser encarada como uma reflexão a parte. Seus corpos podem ser perfeitos e impecáveis, porém artificiais e frios. Isto é, são melhores que os nossos? São desejáveis? 


Trazendo à tona o cyberpunk que daria origem a obras igualmente fabulosas como Éden (e, claro, Matrix), Ghost in the Shell tem uma animação de tirar o fôlego até hoje, beneficiado por cores deslumbrantes que ajudam a contar sua história. É uma obra densa que se mostra cada vez mais atual e relevante. E do jeito que a tecnologia anda, os dilemas da Major só tem a se fortalecer ainda mais.  


(Para mais dos meus textos, é só ir no menu 'Crítico Nippon')
Twitter: @PedroSEkman

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