quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Have a Nice Day (2017)


Saudações do Crítico Nippon!

Primo de alma da fabulosa animação The King of Pigs, que pintava uma Coréia do Sul completamente podre em seus indivíduos, este Have a Nice Day faz exatamente o mesmo com a China contemporânea. Segundo filme do talentoso Liu Jian, é uma obra forte, que traz em suas cores diversos significados que ajudam a contar a história. Claramente inspirado na filmografia dos irmãos Coen, e obras como Pulp Fiction, e tantas outras do gênero, certamente deixaria estes primos distantes orgulhosos.




A trama é simples, iniciando com Xio Zhang roubando uma mala de dinheiro que pertence ao chefe mafioso Tio Liu. Por estar ocupado demais torturando um amigo de infância, Tio Liu envia o capanga Skinny para reaver o que lhe pertence. E no decorrer da narrativa, Xio Zhang encontrará diversos personagens/obstáculos para manter o dinheiro.


Utilizando de um artefato eternizado por Hitchcock, o dinheiro nada mais é que o MacGuffin da trama. Um objeto que não importa realmente, praticamente não é usado, é apenas um instrumento que move a história e é perseguido por todos. O que importa são as ações dos personagens uns com os outros em reaver este objeto tão desejado.

Com uma animação recheada de detalhes, pinta uma China decadente e quase em ruínas, com os letreiros em neon não funcionando direito, e até mesmo com suas árvores sem folhas. Percebam a riqueza dos detalhes de um mural pendurado na rua, por exemplo. Em cada plano daquele universo degradante, os figurantes parecem estar de cabeça baixa, deprimidos, e podemos ver até bebês em ambientes sujos, quase como detalhes em cena. E essa riqueza toda contribui para nossa imersão total naquele clima arisco. 



Utilizando o verde e o vermelho como alegorias óbvias ao tema em questão, os personagens interessados na mala constantemente estão vestindo verde (a cor universal do dinheiro, mesmo que a cédula chinesa seja vermelha). Assim, Xio Zhang está com um casaco esverdeado por boa parte do filme (até o momento em que perde a mala e, vejam só, retira o casaco pra sempre). O capanga Skinny, responsável por recuperar o dinheiro, aparece pela primeira vez de avental verde. A mesma cor é a cueca do amigo da infância de Tio Liu, que descobrimos que suas pinturas foram sustentadas pelo mafioso. O quarto do hotel de Xio Zhang também é totalmente esverdeado.


E, claro, o vermelho, representando o perigo daqueles indivíduos que o perseguem. Skinny, ao chegar no hotel base de Xio Zhang, carrega consigo um copo vermelho, representando quase que uma sirene de alerta. E o sujeito com óculos de raio-X e sua namorada são uma combinação do verde com o vermelho, desejando o dinheiro e representando um imenso obstáculo ao protagonista. Algo que também é representado na van vermelha deles, o principal veículo visto no filme. Mais tarde, quando outro casal entra em cena, o rapaz de cabelos cumpridos, que foi o primeiro a se interessar pelo paradeiro do dinheiro, está vestindo justamente a cor verde. Os tênis do Skinny são vermelhos, pois o seu golpe principal são os chutes. Outro capanga surge com uma pulseira vermelha justamente quando se prepara para dar um soco. Em suma, é um cuidado admirável em trazer essas cores sempre ajudando a contar a história.


Com elementos contemporâneos quase que jogados ao acaso, podemos ouvir o discurso da vitória de Trump no rádio, e foguetes subindo aos céus, enviados pela China na mesma época. São pequenos choques de realidade que buscam tornar aquele universo mais plausível. E mesmo que não haja maiores explosões de sangue e tiroteios desenfreados, é um filme violento e nocivo, em que todo personagem parece prestes a usar a força a qualquer momento.


Assim, quando um homem está explicando para outro as diversas maneiras de ser “livre” nos dias de hoje, todas envolvem maneiras variadas de consumo (comprar no mercado ou online). Ou seja, é um discurso que ecoa no tema do filme, mas que produz o efeito contrário: seus personagens ficam presos àquele dinheiro sempre que cruzam por ele. E inevitavelmente acabam sendo destruídos por ele, permanecendo o status quo daquele universo decadente em que não há como triunfar. 


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