quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

The King of Pigs (2011)

Saudações!

A Coréia do Sul é o lar dos meus filmes favoritos. E basta ver as ambiciosas produções de nomes como Chang-wook Park, Joonho Bong, Kim Jee-Woon, Hong-jin Na, Hong Sang-soo, para se apaixonar completamente. Dito isso, jamais havia visto uma animação desse amado país cinematográfico. E pelo que vi neste The King of Pigs, do estreante Sang ho Yeon, posso esperar trabalhos igualmente espetaculares em 2D. E que imagem devastadora esse longa metragem faz, com denúncias gritantes ao bullying cada vez maior no país, castigos corporais nas escolas, e classes sociais pobres sem perspectivas de ascensão. É difícil ver uma faceta tão podre de um país que produz obras que admiro tanto.

(sem spoilers)



O filme começa com a imagem de uma mulher morta na cozinha, e seu marido, Kyung-min, tomando banho claramente perturbado pelo que fez. Em seguida, ele liga para seu antigo colega de classe, Jong Suk, após 15 anos sem contato e marcam um encontro. A história é feita em flashbacks, conforme o que está sendo dito pela dupla, relembrando os tempos conturbados que passaram sofrendo bullying.

Jong Suk, por sua vez, é um homem de expressão sempre fechada. Sua primeira aparição é levando bronca de seu chefe por não conseguir expressar emoções em seus textos como escritor-fantasma. Em seguida, pouco antes da ligação de seu amigo, ele vai para casa e espanca a esposa aos gritos, exibindo uma instabilidade assustadora. E então percebemos que estas figuras violentas protagonizarão a história, embora não estejam nem perto de ser o ponto mais cruel dela. E no decorrer da trama, iremos entender de onde vem essa falta de afeto físico e psicológico, que os torna tão vazios a ponto de Jong ser absolutamente incapaz de sequer evocar sentimentos em seus escritos.



E o filme é surpreendentemente cruel de forma ininterrupta. A frieza das crianças parece não haver limite, como se todas as idades fossem corrompidas e genuinamente malignas. Os professores são retratados apáticos e alheios à guerra de medo que paira como um veneno entre todos. O único que reage aos ataques de bullying é o garoto Chul, aquele que forma o trio principal junto com Jong Suk e Kyung-min. E mesmo que ele dificilmente seja derrotado ou se renda, constantemente seu psicológico é completamente devastado por outros fatores externos. Ou seja, até os fisicamente fortes são massacrados nesta história.


Em suma, é um filme triste e pesado, que mesmo não tendo sequências fortemente gráficas como alguns animes, é preciso bastante estômago para encará-lo. E é surpreendente constar que não houve um único contato físico de afeto ao longo da trama. Até as garotas parecem inexistentes naquele universo feio, mesmo que colegial. Pra falar a verdade, contei cuidadosamente apenas três vezes em que personagens se encostaram sem que fosse uma agressão. E assim mesmo, apenas em situações de angustia e vazio, sem calor humano nenhum. Não posso revelar muito, mas uma delas foi no necrotério, outra ao relatar uma lembrança ruim, e outra em que o pai está se aproveitando emocionalmente do filho.


Desta forma, as únicas sensações de alívio ao longo do filme, são justamente através da violência, em todos os contra ataques de Chul. Abandonado pelo pai, com uma mãe que faz programas para sobreviver, Chul é claramente problemático. Além de doutrinar os amigos Jong Suk e Kyung-min a serem “mais malignos que os valentões”, esfaqueando um ser mais fraco – um gato - como simbolismo deste ensinamento. E mesmo diante disso, torcemos e respiramos de alívio pela sua reação diante dos algozes, ainda que já estejamos cientes do quão alterado ele é capaz de ser.


E suas qualidades técnicas são igualmente louváveis, com uma animação extremamente expressiva, em cores melancólicas que chegam a lembrar as de Makoto Shinkai. Investindo em uma trilha sonora bela e orgânica à narrativa, sem jamais cair no melodrama. E os dubladores se entregam a todos os personagens, fazendo um trabalho excepcional e evocando a emoção que o traço merece. E, principalmente, vejam só, o cuidado com o figurino dos personagens. O riquinho e indefeso Kyung-min se veste com cores claras e quase femininas, espelhando sua inocência. Já seu amigo, Jong Suk, mais sério e insatisfeito, já passou da fase de pureza. Sua camiseta, apesar de branca, é tomada pelo azul marinho, como se a amargura estivesse quase se fechando sobre ele. Futuramente, em suas fases adultas, Kyung-min transcende para o azul marinho do amigo, esboçado em seu terno fechado, cuja tristeza e revolta tomou conta completamente de sua persona. Enquanto Jong Suk assume roupas idênticas às de Chul, em uma camiseta branca e casaco verde militar, espelhando a que nível chegou sua transformação ao longo dos anos – ainda mais revelador na sequência final do filme.


The King of Pigs nos mostra uma realidade claustrofóbica, em que surpreendentemente nos vemos tensos apenas por dois garotos se esbarrarem no banheiro, mesmo sabendo que ambos são normalmente pacíficos. É uma realidade em que os novos alunos aprendem a fingir sorrisos em uma semana, e que outros são expulsos em apenas 6 meses de escola. Inúmeros personagens comentam e mencionam a vontade de estar morto ou se suicidar, mesmo aqueles que não estão na escola. E é essa instabilidade emocional sempre no limite que corrompe aquelas crianças, e moldam os adultos amargurados e violentos que vimos no início. Jamais poderiam ter crescido de forma diferente, muito menos colocado emoções em textos como escritor-fantasma. Depois desse filme, meu encantamento pelos sul coreanos certamente ficará apenas no quesito filmes.

 (Para mais dos meus textos, é só ir no menu 'Crítico Nippon'.)
@PedroSEkman

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