Será que foi dessa vez que o P.A. Works acertou a mão equilibrando a excelente fotografia com o roteiro?
Talvez eu esteja cometendo alguma injustiça, mas vejo Tari
Tari como uma produção feita com os “restos” de outra série de grande sucesso
do estúdio P.A. Works; Hanasaku Iroha. A concepção é basicamente a mesma, porém
sem o requinte visual da produção anterior. O character designer segue o mesmo
padrão que já é característica do estúdio, apesar que aqui parece que usaram a mesma forma para todos os personagens, pois são todos muito parecidíssimos – E a Kanami Sekiguchi, os desenhou
de uma forma que esses personagens parecem realmente fazer parte do mesmo universo
de Hanasaku Iroha, embora possa parecer meio óbvio pelo fato ser dela o charar
designer de ambas as séries.
Acompanhei alguns dos comentários de quem estava assistindo a
série em tempo real, na época, e pude perceber o quanto muitos ficaram
decepcionados pela falta de brilho na animação, onde mesmo a fotografia sendo
acima do normal do que se espera ver normalmente em um anime semanal, em muitos
momentos é perceptível como os personagens se movimentam de forma desengonçada,
com cabeças desproporcionais (é, os
personagens são cabeçudos). Talvez a ausência mais sentida, é a do nariz. Realmente,
mesmo no encerramento da série, com todos os personagens sentados no banco,
você consegue perceber isso facilmente. Em vários momentos do anime eu me
peguei rindo disso, pois as vezes tinha a impressão de estar presenciando uma
apresentação de atores com aquelas cabeças enormes de personagens do Mauricio
de Souza ou da Disney.
Paradoxalmente, a forma como os personagens se movimentam é
uma das melhores características da série. Eles se movimentam! Não falo apenas
do simples gesto de andar, mas de correr e correr, de dançar, de dar voltinhas,
fazer malabarismos, pular, e até mesmo os gestos mais minimalistas de um ser
humano real. Isso te dá à impressão de estar assistindo algo verdadeiro, pois
Tari Tari é uma história sobre música e adolescência. É uma história onde os
personagens sofrem com constantes anseios da idade e possuem toda aquela
inquietação característica.
Em meio a isso, o cenário também desempenha um importante
papel nesse contexto. A arquitetura e a estrutura inspirada na província de
Kanagawa foram feitas com extremo primor ao ponto de se tornar algo que chame
ainda mais atenção na série do que as cabeças grandes das personagens. Quem acompanha
animes frequentemente, já deve estar habituado com a fotografia usual da
pequena ilha de Enoshima, mas aqui ela se torna ainda mais atraente, mesmo que
só apareça como a ligação de uma ponte de uma cidade a outra. O uso da iluminação,
o designer caprichado de vários estabelecimentos, o uso de cores, tudo se torna
muito pulsante e vivo com os personagens correndo por aquele cenário – Uma desesperada
corrida com Sawa em cima do seu cavalo disputando em velocidade com um trem, Wakana
fugindo de um perseguidor pedalando intensamente enquanto ele a persegue a pé,
ou todos os personagens fantasiados de Super Sentai percorrendo toda a cidade
atrás de um bandido. São alguns dos momentos onde aquela fotografia também se
transformou em um personagem através dos diversos enquadramentos de câmera, que
o tornaram muito mais atraente.
Tari Tari exala o cheiro da adolescência, tanto nos dramas
vividos por suas personagens, como no choque entre idealizações infanto-juvenis
com o mundo adulto. E é uma história simples, não muito original, sem grandes
reviravoltas e extremamente industrial, ao ponto de ser facilmente esquecível.
Mas é uma série com uma execução equilibrada e um roteiro coeso, com a música
exercendo um papel importante para preencher todo o plano de fundo da história,
contudo quem brilha aqui são suas personagens e seus conflitos internos. Vejo
Tari Tari como um pequeno conto sobre a passagem para a vida adulta, aquele
importante momento de decidir se segue ou não aquele sonho da adolescência. Também sobre a conturbada relação entre pais e filhos tão comum nesse período. Às
vezes estes sonhos se tornam inalcançáveis, e é neste momento onde o roteiro se
mostra mais atraente ao não apelar para alguma saída mirabolante para tornar
aquilo possível. Além, claro, de também não apelar para as lágrimas fáceis.
Ainda assim, alguns momentos como o conflito de Wakana em ter que lidar com o
seu passado amargo, consegue ser genuinamente tocante ao ponto de emocionar.
Sem música melosa ao fundo, muitos vezes se caracterizando
apenas pelo som ambiente ou uma quase imperceptível BGM ao fundo. Aqui, o silêncio
também adiciona certo sabor à cena. O que chamava mesmo a atenção é o silencio
dessas personagens nesses momentos, o que muitas vezes acompanhava um sentimento
de inquietação, que quase sempre seguia de um estouro. Gritos. Raiva. Fuga.
Lágrimas. Algo tão adolescente. Sentimentos muitos comuns que te batem quando
você percebe que não pode mais voltar atrás pra corrigir um erro ou
simplesmente continuar voando, pois seus pais teimam em te prender na terra e
apontar um caminho mais seguro a se seguir. Nesse aspecto, talvez alguém se
sinta frustrado pelo roteiro, pois ele não impressiona tanto pelos momentos de
clímax, mas gostei pois me pareceu algo bem verossímil. Aqueles momentos na vida dos personagens antes da formatura é representado de forma quente e até nostálgica O último ano na escola. Aquele sentimento estranho de, mesmo cruzando com seus amigos, não ser a mesma coisa depois. A vida após a formatura. Tudo tão comum, onde você não ficou com a sua paixão, o retorno à cidade natal depois de tanto tempo fora estudante. É um sentimento cálido e quase tangível.
Wakana e Sawa foram sem dúvida às personagens mais interessantes aqui. Os outros; Konatsu, Wien, e Taichi permanecem mais planos, porém ainda conseguem preencher todo o quadro com carisma e com histórias facilmente compráveis pelo público. Como disse Taichi em certo episódio, cada um ali possui o seu motivo para fazer parte daquele clube, mas o dele é apenas o amor à música. É um motivo válido.
Wakana e Sawa foram sem dúvida às personagens mais interessantes aqui. Os outros; Konatsu, Wien, e Taichi permanecem mais planos, porém ainda conseguem preencher todo o quadro com carisma e com histórias facilmente compráveis pelo público. Como disse Taichi em certo episódio, cada um ali possui o seu motivo para fazer parte daquele clube, mas o dele é apenas o amor à música. É um motivo válido.
Você sabe o que significa Tari Tari? Isso e aquilo. Isso
mesmo. Essa é uma expressão comum entre jovens japoneses, que costumam dar
respostas vagas e imprecisas sempre que não querem responder um questionamento.
A velha geração obviamente não gosta desse tipo de resposta, mas o Tari também
pode ser usado juntamente de uma resposta monossilábica, para expressar que
houveram muitas coisas envolvidas no processo, sendo equivalente ao nosso “etc”.
Assim, Tari Tari além da falta de clareza, implica variedade. Trata-se de um
título que dialoga com seu roteiro e suas personagens. A falta de certeza com
relação ao futuro dos mesmos, assim como variedade artística daquele clube, que
além de ser um coral musical, também pratica badminton. São personagens tão
distintos que estão unidos por uma paixão em comum, que no caso é a música, que
vivem com a incerteza do que serão assim que se formarem.
Ou nas palavras da própria equipe de produção do P.A. Works;
“As
meninas ainda não alcançaram nada. O que significa que ainda pode se tornar
tudo o que deseja. A juventude é a época em que você só tem uma vaga imagem de
si mesmo. O tempo para fazer tantas coisas diferentes também torna possível
descobrir quem você é.” – Isso na época da produção de Hanasaku Iroha.
Duas tramas separadas apenas pela música. Talvez um pouco mais, afinal, em Tari
Tari tudo termina quando os personagens se formam.
Durante o texto, eu deixei alguns vídeos, que são parte da
trilha sonora da série que além de possuir músicas agradáveis, ainda são
arranjos orquestrais fantásticos, compostos por Shiroh Hamaguchi, incluindo "Reflectia"
[Abertura de True Tears, outro anime do estúdio] e "Amigo! Amigo!",
cantada por uma banda fictícia dentro da série. Aliás, essa música foi composta
e interpretada por Ricardo Cruz, um brasileiro, que além dele também conta com
mais dois personagens latinos interpretados por Eduardo Costa, da banda
J-Squad, e Rafael Ryuji, da banda Wasabi. Sempre penso que inserções musicais em animes sempre abrilhantam ainda mais a execução, e Tari Tari soube usar bem isso.
Tari Tari sente a falta de uma direção mais autoral, mas é perceptível
que esta nunca foi à intenção. E nos lembra de que também que nem tudo precisa
ser inesquecível, arte e repleto de subcamadas e conflitos existenciais. Pode
ser como Tari Tari; um espetáculo bonito de se ouvir, de se ver, e que te faz
sentir a sua história envolvente dentro daquele limite de tempo, mesmo que
mediana. E também que, o mediano pode chegar a ser mais agradável que qualquer
obra-prima, quando bem executado. Uma curta lembrança, bonita e breve, que logo
desaparece. Bom, é isso aí, valeu o tempo investido, e deixo uma observação final
pela ótima performance das dubladoras, que interpretaram as músicas e atuaram
com competência.
Nota: 06/10
Direção: Masakazu Hashimoto
Estúdio: P.A. Works
Ano: 2012
Episódios: 13
Similar: Angel Beats!, AKB48, K-On, Hanasaku Iroha
Dica de Leitura: Os belíssimos Cenários de Tari Tari na vida real
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