sábado, 17 de dezembro de 2011

Barbara: O Lado Perverso e Doentio da Mente Humana


Falar sobre Tezuka (1928-1989) é sempre uma tarefa complicada. Sua extensa biografia soma mais de 700 mangás produzidos e é um importante indicador da grande produtividade daquele que é carinhosamente chamado de “O deus do mangá”, que modificou a estética do mesmo e a tornou o que vemos hoje em diversas publicações. Para falar com toda a propriedade sobre Tezuka e explorar as diversas nuances do seu legado, seria necessário um longo estudo. Mas isso não se torna empecilho para que possamos propor uma discussão sobre determinado elemento ou obra que figura em seu grande acervo. É com esse intuito, além de apresentar diversos títulos de sua biografia para um público que talvez ainda não tenha tido a chance de conhecer as diversas facetas do “papa do mangá”, que vários blogs se reuniram para prestar essa singela homenagem, que leva o nome de Tezuka Day.

O texto abaixo contém pequenas revelações do enredo do mangá abordado, que são spoilers, mas que particularmente, não considero prejudicial para quem porventura, se interesse em lê-lo, uma vez que procurei omitir os pontos cruciais.

A obra escolhida por mim, como já se faz notar, é Barbara (Publicado na revista Big Comic da editora Shogakukan entre 1973 e 1974, totalizando 2 volumes), que tanto é uma de suas obras mais desconhecidas, como também figura como uma de suas várias obras com temática adulta. É comum ver Barbara sendo comparo com Ayako, devido ao seu tom mais obscuro. Mas Barbara tem uma proposta mais surreal em seu contexto, trabalhando em seu universo, a realidade e a mitologia. Um dos talentos de Tezuka era sua sensibilidade de retratar o universo contemporâneo em suas histórias, o que faz com que, por mais volumoso que seja o seu legado, há uma acentuada diversidade. Além de histórias fantasiosas, como Jungle Taitei (Kimba, o Leão Branco, 1950—1954), que certamente serviu de inspiração para o Rei Leão da Walt Disney, Ribbon no Kishi (A Princesa e o Cavaleiro, 1953—1956), que sofreu inspiração nos temas e estilos dos musicais do teatro de Takarazuka, a ficção cientifica com Tetsuwan Atom (Astro Boy, 1952—1968), até Black Jack (1973—1983), história quase que autobiográfica, sobre um mundo que Tezuka conhecia intimamente, que é o da medicina. 

Ayako, que curiosamente era a minha aposta original para ser analisado nesse #TezukaDay, também tem essa linguagem mais adulta e a pretensão de ser mais profundo, e importante frisar que realmente consegue. Em Ayako temos a saga da problemática família Tenge após o Japão ter sido derrotado na Segunda Guerra Mundial. O patriarca utiliza a herança da família como material de chantagem para manter o filho mais velho sob sua autoridade e conseguir favores sexuais de sua nora. O filho do meio é um soldado que voltou da guerra e agora trabalha como espião para os americanos. Ayako, a filha caçula, começa a se envolver com o movimento trabalhista japonês e, para complicar ainda mais a situação descobre a relação de seu pai com sua cunhada. Como consequência é trancada pelo pai e pelo irmão mais velho por doze anos no porão da casa.

A arte de Tezuka aqui está muito acentuada e suave, distante do estilo cartunesco que acabou se tornando uma de suas características, e mais próxima do que entendemos como mangá moderno. Artisticamente, considero um dos melhores momentos do Tezuka, em que ele consegue equilibrar momentos de realismo com numerosas cenas de influência barroca. Bom, terei outra oportunidade pra comentar melhor sobre Ayako, que tem uma abordagem insinuante, que é o incesto. Juntamente com Barbara, são os três mangás que fazem parte da leva de últimos trabalhos de Tezuka e que compartilham o mesmo tom rude. Adolf ni Tsugu é um olhar atento sobre o preconceito, sobre três homens que dividem o mesmo nome, Ayako é uma ficção política e drama com as mudanças e a tensão da sociedade japonesa após a guerra. E Barbara

A personagem título, Barbara, é uma jovem que sintetiza vários traços da contracultura dos anos 60, incluindo ai a invasão hippie naquela época do pós-guerra – A própria Barbara é a pintura perfeita desse quadro, onde a acaba se tornando a visão de Tezuka sobre aquele movimento. Por ter sido produzido nos 70, as referências se multiplicam e torna a leitura bem rica, mas é preciso ter o mínimo de atenção, pois boa parte disso é jogado para o leitor de uma forma bem subjetiva. Talvez o único pesar, seja o fato de Barbara não ser o retrato perfeito da contracultura daquela década, mas apenas um esboço, que serve de pano de fundo para a história. A contracultura foi um movimento que seguiu a linha de mobilização e contestação, tendo seu auge na década de 60, que nasceu de jovens de inflamados pela vontade de revolucionar o mundo, que resultaria no movimento hippie que viraria uma verdadeira revolução social na América do Norte, Europa Ocidental, Japão, Austrália e Nova Zelândia durante os anos 1960 e início de 1970.

Pode se dizer que o cenário ambiente da história, retrata perfeitamente àquela época, assim como a personagem título, seus hábitos e atitudes. Mas afinal quem é Barbara? Tudo que um provável leitor saberá é que se trata da personagem título, e que é uma jovem hippie imersa no alcoolismo. Nas primeiras páginas, parece que Barbara é apenas uma vagabunda qualquer, perdida na grande metrópole cercada por inúmeras indústrias, poluição e uma população revoltosa. Em meio a todo esse caos, se encontra Barbara, que segundo a própria descrição de Tezuka, naquela atual conjuntura, não se diferenciava muito de saco de lixo. Encolhida em meio à multidão na estação de Shinjuku, como se fosse um animal indefeso, Barbara é acolhida por um famoso escritor, Yosuke Mikura, que dá abrigo para a fumante compulsiva e quase sempre alcoolizada, Barbara. Em busca de inspiração, Barbara acaba se tornando a musa do escritor, que sem perceber, acaba se envolvendo mais do que deveria com a jovem hippie. Ela se torna cada vez mais importante na vida do artista, que tem a percepção do mundo completamente alterada, apesar dos avisos dos amigos para que se afastasse da garota. 

Se no primeiro volume, nós vemos a ação que é a presença de Barbara na vida do escritor, no segundo nós apresentado a reação dos personagens envolvidos naquele conflituoso relacionamento, e a consequência. A ascensão de conto de fadas de Yosuke Mikura termina quando Barbara o abandona. Em desespero, Mikura chega aos limites da loucura, forçando para que Barbara volte ao seu lado, o que resulta num violento confronto entre o casal, chegando ao viés do canibalismo, representado pelo último ato de amor. Em um último esforço e já sentindo sua morte, Mikura consegue enfim produzir sua obra prima, ao qual ele intitula de Barbara.


O grande Tezuka nos apresenta aqui um competente e provocativo mosaico, que contém uma boa dose de humor que certamente é capaz de fazer brotar um sorriso no rosto. A Barbara é completamente maluca e apaixonante, repleta de carisma. Ainda assim, Barbara é uma das obras mais intrigantes e estranhas de Tezuka – E falo isso com base nos poucos mangás lançados oficialmente dele que eu tive o prazer de ler. Certamente, há camadas ali que podem perturbar os mais incautos. Aliás, a própria Barbara é uma heroína misteriosa e intrigante. Mas falando do mangá como um todo, ele possui um esquema narrativo bem clássico, bebendo diretamente na literatura fantástica do século XIX. O “Fantástico”, nesse caso específico, não se trata de um adjetivo, mas de uma tendência literária também conhecida como Literatura Gótica, que foi um movimento literário que surgiu no século XIX num contexto inglês conhecido como época Vitoriana. Eu sei que está muito pseudo isso aqui, mas logo chego ao ponto que pretendo alcançar. Os autores da Literatura Fantástica ambientavam suas histórias em lugares que inspiravam uma mente assustada como florestas escuras, cemitérios, castelos, igrejas e ruínas em geral. O segundo volume de Barbara, é o que melhor expõe toda essa influência de Tezuka, e não por acaso, ele é tão surpreendente e ao mesmo tempo, questionável para algumas pessoas, uma vez que o tom é pautado no extremo do surrealismo e no lado mais obscuro da mente humana, onde Tezuka se permite trabalhar o lado do canibalismo humano. Chocante? Não sei, mas eu fiquei surpresa e é por isso que essa é a faceta do Tezuka que eu mais gosto. 

Dos autores consagrados da literatura fantástica, E. T. A. Hoffmann sem dúvidas foi a grande inspiração de Tezuka ao criar Barbara, ainda que indiretamente. Isso porque Barbara é oficialmente inspirado em Les contes d'Hoffmann (Os Contos de Hoffmann/ The Tales of Hoffmann), uma ópera do francês Jacques Offenbach, que por sua vez é baseada nos contos de Hoffmann. O próprio personagem central da história, Yosuke Mikura, seria o protagonista da peça de Jacqes Offenbach, o poeta Hoffmann que se apaixona por um “Automaton” (Uma máquina, popularizado como robô humanoide), a bela boneca mecânica chamada, Olympia, que entre vários acontecimentos do enredo, usa magia para ganhar a forma humana e assim despertar o interesse dele. Tal qual acontece com Yosuke Mikura, Hofmann é alertado pelos amigos para que tenha cautela, contando-lhe inclusive sobre uma boneca que teria ganhado forma humana, mas ele não lhes dá ouvido. Mais a frente, a verdade vem à tona e Hoffmann descobre que esteve o tempo todo apaixonado por uma boneca mecânica, e acaba sendo ridicularizado por todos. Hoffmann acaba se envolvendo com outras mulheres, mas a que ele precisa mesmo, é Olympia e em um surto de cólera, tenta convence-la a se tornar sua amante, que aceita o capricho do poeta. 

Os Contos de Hoffmann, última ópera de Jacques Offenbach, é uma verdadeira exposição dentro do contexto de Barbara, onde as varias tramas da história se desenvolvem em um ambiente lúgubre, pautado pela dúvida do fantástico e grande enfoque no lado mais obscuro da alma humana. Comparando as duas obras, se vê claramente os pontos comuns de cada uma e que Tezuka desenvolveu sua história em cima daquela linha de pensamento. Desprezando Barbara por esta ser uma alcoólica irrecuperável, ele sempre se apaixona por mulheres quase inatingíveis, mas sempre descobrimos que se tratam de ilusões macabras, situações que quase invocavam um humor negro. Como por exemplo, nas várias situações de equivoco, era comum que sua amada fosse na realidade, um manequim, um animal, ou até mesmo um fantasma. Inclusive, foram uma das coisas que me surpreenderam e me assustaram positivamente em Barbara. Equívocos e mais equívocos, até onde iria isso e por quê? Esse é o grande segredo e trunfo de Tezuka, que mesmo eu comentando abertamente sobre Barbara, prefiro não revelar ou até mesmo opinar, pois não se trata de uma leitura sustentada pelo mistério, mas sim pela indagação e sua narrativa densa, ao mesmo tempo em que involuntariamente bem humorada. 


Só que a maior ilusão e incógnita da história, é a própria Barbara, que vai nutrindo cada vez mais afeição por parte do autor Yosuke Mikura. Tal qual Hoffmann sente pela androide Olympia. Identificar pontos comuns entre Mikura e Hoffman é fácil, mas e entre Barbara e Olympia? Ambas são preteridas pelos amados, que se envergonham delas, mas que também não conseguem tira-las do pensamento, que a tornam suas amantes. Imagino, que a essa altura imaginem que eles são os grandes vilões, mas adivinhe, aqui não temos vilões ou mocinhas. Apenas um retrato da forma mais verossímil possível do comportamento humano. Na verdade, é o Yosuke Mikura que se encontra nas situações de maior fragilidade emocional, frente às ilusões que ele se depara. 

Mas Mikura também faz o modelo de homem cafajeste, já na faixa dos seus 30 anos, é boêmio e conquistador, com uma vida sexual ativa. Algo fácil para aqueles que têm pinta de galã. Retratado como um homem viril, e como era comum à época, Mikura não se faz de rogado na hora de dar uns bons tabefes em Barbara, agindo violentamente sempre que esta lhe tirava do sério. Neste caso em especifico, as questões feministas precisam ser deixadas de lado, em favor da ficção. É magnifico a peça conflituosa ensaiada por Tezuka em cima do casal. Barbara é fugaz, atrevida e fala o que lhe dá na telha, pra completar o quadro, ela ainda rouba seus pertences pessoais para comprar mais bebidas, além de beber todo seu vinho e whisky descaradamente. Barbara não tem pudor algum, não se comporta como uma dama da sociedade, mas tem algo que toda mulher possui indiscutivelmente: Adora provocar, seja sexualmente ou falando mais do que deveria. Mikura, claro, se sente completamente envergonhado pelas atitudes dela, mas é incapaz de manda-la embora. O comportamento de Barbara é de um gato desapegado ao seu dono. Aliás, novamente, quem é Barbara? Ela é múltipla, uma adolescente rebelde, talvez até mesmo o Diabo. A despudorada e o guarda costas, talvez essa seja a melhor descrição para esses dois, quem sabe!? 

O fato é que Mikura está convencido de que nada pode criar sem a presença de Barbara. Ela é quem lhe dá impulso e inspiração. Ao lado dela, ele se sente capaz de dar a luz a sua obra prima, o melhor livro de sua carreira (seria ai o Tezuka se vendo em Mikura, já que este também ansiava com Hi no Tori criar sua obra máxima?). Mas ao mesmo tempo, Barbara que é o antidoto, também é a figura do câncer. Sua sensual musa inspiradora. Barbara é quase uma Lolita (Um dos mais cults romances da literatura inglesa, de autoria de Vladimir Nabokov, lançado inclusive, em 1955, antes de Barbara ser concebido), tão provocativo e doentio, quanto. Mesmo a obsessão, ainda hoje é um dos temas mais complexos e interessantes de se olhar. O próprio Tezuka já trabalhou bastante em cima disso, e como já mencionei, é o seu lado que mais admiro. Tocando e abraçando o lado mais repugnante do ser humano, Tezuka criou obras de qualidades imensuráveis, como a já citada Ayako e Adolf ni Tsugu. Mas não poderia deixar de citar MW (se pronuncia MU), uma história também pautada na obsessão, onde o tema é “A vingança é um prato que se serve frio”, ao qual ele desenvolve um relacionamento complexo e sedutor entre os dois protagonistas da obra, ao mesmo tempo em que faz sua critica social ao atual momento do Japão na época.

 A Literatura Fantástica, sempre foi um recurso muito usado por Tezuka, e não apenas em suas obras com o demográfico seinen (voltao a um publico mais maduro), mas como mencionado em uma entrevista de Kazuo Umezu, ele era fascinante por não se conter nem mesmo para o público infantil, ainda que aqui seja notável o dom dele se mostrar menos obvio. Mas falando de sua leva de séries “Adultas” (tanto por conter temáticas sexuais, como também temas com aspectos fortes demais para um público mais novo), I.L é uma dessas séries e que segue o mesmo feeling de Barbara, mas lançada um pouco antes, em 1972, sobre uma misteriosa mulher que pode se transformar fisicamente, e que se envolve em várias e assustadoras histórias de amores de vários tipos, mesmo perversos. Novamente temos a figura feminina vista como uma deusa, talvez até menos, uma boneca, talvez, é responsável por levar a loucura e insanidade a figura masculina. E por que não citar Chikyu o Nomu (Engolir a terra/ Nomu Swallowing the Earth, 1968-1969)? Mesmo sendo posterior ao surgimento da saga mais longa de Tezuka, Hi no Tori, foi sua primeira tentativa de se investir em temas mais sérios e adultos. Também marcou como sendo a primeira passagem dele pela revista seinen, Big Comic da editora Shogakukan, em que ele teve a oportunidade de explorar toda a sua faceta mais complexa, realista e obscura. Em Chikyu o Nomu, temos novamente a figura de uma mulher misteriosa, Zephyrus, que tem uma beleza escultural, que faz com que todos os homens se apaixonem por ela. Seu objetivo é se vingar do homem, mas não apenas dele, mas de todos e tudo que eles construíram com o dinheiro da corrupção, dinheiro e cobiça, e principalmente por usarem mulheres como objetos. Sempre atual, Tezuka não faz uma crítica apenas a um Japão que ia se desligando de suas tradições e filosofias envolvendo a terra, mas também ao excessos masculinos, sendo principal dele o machismo. Isso fica bem claro ao colocar Zephyrus se apaixonando por alcoólatra tão inveterado como Barbara.

Mas bem, voltando a falar de Barbara, Tezuka é influente hoje, mas também foi influenciado e soube utilizar muito bem isso. Em um dos capítulos, ele introduz a mãe de Barbara na história, como uma deliciosa metáfora para a deusa grega Mnemosyne. Inclusive, ela tem a aparência da Venus de Willendorf, também conhecida como a Mulher de Willendorf – Uma figura feminina, que estudiosos afirmam ter sido feita entre 24.000 e 22.000 aC. – e apesar de controverso, recebeu o apelido devido a clássica imagem da deusa da mitologia romana, Vênus. Não sei quanto a vocês que me leem, mas adoro essas referências históricas, seja em qual série for. Apesar do editor chefe, responsável pelo lançamento de Barbara na França, não entender em sua nota ao final do mangá sobre a relação da personagem Barbara com Calíope, a primeira das nove musas da mitologia grega, filhas de Zeus e Mnemosine, a meu ver não é nada mais do que as características apontam, com o fato de Calíope ser a musa da poesia épica, tida como a inspiração do maior poeta grego da história, Homer, autor da Ilíada e de a Odisseia. Tal qual, Barbara é a musa inspiradora do romancista Mikura, que originalmente seria o poeta d’Os Contos de Hoffmann.

Um fato interessante é que Neil Gaiman, autor da aclamada Graphic Novel; Sandman, também se utiliza da figura de Calíope em sua obra (que eu considero) máxima. Também interessante notar que tanto Sandman, quanto Barbara trabalham em cima dessa linha de desejo e os perigos que corremos na euforia de realizar nossos sonhos a qualquer custo, que acabam trazendo consequências nada prazerosas. Outro detalhe no que diz respeito a referências, são a inclusão de poemas do poeta francês, Paul Verlaine e outras referências ocidentais. Citemos ai a aparência ocidental dos personagens, como Mikura e suas sobrancelhas espessas, estrutura fácil padrão do norte americano, com seu nariz torto, óculos e cigarro na boca. Representa a imagem do escritor intelectual e elitista. Já Barbara em seu narizinho arrebitado, é mostrada do alto de suas pernas longas e curvas perfeitas. Assim como suas roupas, se mostra de uma forma sexualmente provocante. 


Bom, pra finalizar, Tezuka diz no posfácio que Barbara é a história de um homem cambaleando entre o esteticismo decadente e a doença mental. Em Barbara, a relação entre a musa e o artista, é desenvolvida por Tezuka de uma forma surreal, grotesca e ambígua. Tezuka acabou se influenciando muito no estilo gekigá, que tem como proposta histórias maduras (inclui se ai sexo e violência) voltadas para o público adulto, que vinha ganhando bastante atenção nessa época. Mas é possível notar o inconfundível humor gráfico, que se tornou uma prática comum nos mangás modernos e que foi fundado por Tezuka, continua presente em Barbara. A arte é ligeiramente diferente do estilo arredondado e infantil, algo mais cartunesco que acabou se tornando sua marca registrada, acredito eu. Os enquadramentos são excelentes, para a época em que a obra foi produzida, apesar de ser bem básico, há todo um aspecto artístico que é impressionante, detalhe para a forma como Tezuka reproduz os personagens na cerimonia do segundo volume, onde ele desenvolveu uma ação gráfica alucinante. 

Barbara possui reviravoltas excepcionais e um desfecho que, certamente é surpreendente. Sexo, loucura alucinante, violência, uma relação tempestuosa assim não poderia acabar de outra maneira. E acredito que não seja estragar o prazer da leitura, revelar que Barbara acaba violentamente morta por ele, mas que de alguma forma acaba voltando. Mas como? Bem, a resposta é de uma melancolia que só. Barbara volta e se torna a mulher elegante que Mikura sempre sonhou e os dois acabam decidindo se casar. Aqui, Tezuka mescla do misticismo e culto à magia negra, com a cerimonia acontecendo em um estranho lugar escondido de todos e organizados por uma seita que mantêm um "culto da deusa-mãe. Em um tom de tragédia grega, o culto é interrompido pela policia e...bem, pra saber como termina essa fantasiosa e doentia história, apenas lendo o mangá, eu não vou contar. Não é tão eficaz quanto Ayako, nem muito menos tão grandioso como Adolf, Buda ou com o background de um Black Jack ou MW, mas tem seu lugar garantido como um dos mais divertidos de ser, de forma despretensiosa. O que acaba, causando uma surpresa positiva, pois a história trás diversos temas interessantes, como a subcultura que invadia o Japão na época e que acaba se tornando um excelente pano de fundo pra fantasiosa história com diversas referências interessantíssimas. Uma última curiosidade, é que Tezuka costumava fazer algumas aparições em várias de suas histórias (quase um Alfred Hitchcock, que tinha o mesmo costume), e não é diferente em Barbara. Espero um dia ver este mangá sendo publicado nos EUA ou até mesmo aqui, a compra será garantida. 


E não deixem de conferir a página oficial do #TezukaDay, com link de TODOS os blogs, sites, podcasts e vlogs participantes [http://www.facebook.com/tezukaday]


Acessando o link acima, você tem acesso ao endereço de todos os posts do #TezukaDay, mas deixo aqui a minha dica pessoal de postagens:

ARTIGOS

No blog Otakismo, o Kauê nos guia à história de Tezuka e sua influência, com um foco um tanto maior, americana e também da própria cultura japonesa em suas histórias. No Nahel Argama, você tem acesso ao mesmo tema: influência, mas dessa vez com um enfoque maior no cinema, na tv, ou seja, a herança de Tezuka para o vídeo.  Já a querida Valéria, faz um esboço tão gostoso como pudim, no Shoujo Café, sobre as contribuições do mestre Tezuka para os mangás e trás uma visão peculiar sobre o mito e o shoujo. Leiam.

O Lancaster, em seu blog, Maximum Cosmos, faz uma belíssima introdução, defendendo seu ponto de vista sobre as obras infantis de Tezuka, que são constantemente alvos de críticas. Os meninos do site Troca Equivalente, fazem um esboço interessante sobre influência, estilo e importância de Tezuka para a indústria. 

REVIEWS/ANÁLISES

No Chuva de Nanquim, há uma conversa agradável do Dih, com seus leitores sobre Pluto, a prestigiada obra de Naoki Urasawa, onde seu mundo, se mistura ao de Tezuka e seu Astro Boy. No blog Netoin!, o Carlírio dá jus a sua marca registrada, de comentar histórias sensíveis e simples, sobre o cotidiano. Dessa vez é Fushigi wa Melmo, de Osamu Tezuka. Você também pode ficar sabendo um pouco mais sobre Dororo, lançado aqui no Brasil pela NewPOP e belamente resenhado no blog Radix.

Para quem procura algo mais obscuro, adulto e maduro, no MangasUnderground, temos uma curta e ótima análise sobre Ode to Kirihito. 

Temos o Vídeo Quest, comentando de forma cool, um dos melhores trabalhos de Tezuka, Adolf. E por falar em “melhores trabalhos”, o Graveheart comenta com eficácia sobre Buda no Blog do Graveheart. A pequena e simpática Mei comenta um mangá, que, particularmente considero como um soco no estomago, MW, lá no Virtual Meinsanity.

 Uma surpresa inesperada foi quando li a resenha de Fuusuke lá no VisualNovel Brasil, feito pelo Rúbio. Jamais imaginaria o Tezuka escrevendo algo assim: “A vagina da minha filha pode prever o futuro”. No Mangás Cults, resenha de Tetsu no Senritsu, que parece ser bem bacanudo. O MagaTologia, comenta em seu podcast sobre Tezuka reinterpretado por outros. E por falar em reinterpretação, lembra que lá em cima eu citei Pluto? Então, o tsundere do Panina lá do Subete Animes, comentou a história de Astro Boy, de onde Pluto se baseia. E pra terminar, minhas queridas amigas, Mary com seus excelentes comentários, dessa vez sobre Metrópolis, a versão em mangá no Across The Starlight. A super Rah, comenta empolgadamente sobre Black Jack, o doutor House nipônico, em seu blog, Special Days.

Fechando com chave de ouro, o Denys escreve uma grande análise sobre Apollo’s Song, ao qual recomendo ler com certa calma e tempo, lá no Gyabbo!.

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