Quem
acompanha meus textos sabe que sou fã de Makoto Shinkai. Não apenas pelas
críticas que escrevi de dois de seus filmes aqui e aqui, mas pelas citações que
fiz nas obras de outros cineastas, como do recente “Ookami Kodomo no Ame toYuki” de Mamoru Hosoda. Após o pavoroso trabalho anterior em Hoshi Wo Ou Kodomo
(e mesmo assim, elogiei fartamente seus trabalhos anteriores no texto), Makoto
volta aos trilhos, deixando para seu colega Miyazaki as terras fantasiosas e
concentrando-se no que sabe fazer melhor: explorar o nosso agridoce mundo de
melancolia e distância.
Takao
é um garoto que mata as aulas em dias chuvosos, ficando no quiosque de um
jardim desenhando sapatos (algo que ele faz artesanalmente, todas as etapas).
Lá, conhece Yukino, uma mulher mais velha que também falta ao trabalho em dias
chuvosos. Aos poucos começam a conversar, e combinam de se encontrar sempre ali
se, e somente se, estiver chovendo. E é com esta simples premissa – claro - que
gira em torno a trama.
Com
uma duração bastante curta, só não atrás de Hoshi no Koe que era inferior a
meia hora, não há espaço para maiores subtramas em Kotonoha no Niwa. Passamos
os pouco mais de 40 minutos com a dupla principal, conhecendo-os devagar como os
próprios. Nesse sentido, a calma com que Makoto inicia sua narrativa é
admirável e contemplativa como ele já está seguro de fazer. Explorando a
maturidade de seus personagens mais velhos, ainda melhor que os de “The Place
Promised in Our Early Days”, a distância aqui é justamente a idade (o garoto
com 15 e a mulher com 27). E mesmo que haja o fator de que eles só irão se ver
em dias de chuva (e sim, conseguimos ficar tão envolvidos e ansiosos quanto
ambos, separados nos dias de Sol) é um empecilho que pode ser facilmente
resolvido.
O
pacote Makoto Shinkai aqui é completo: a riqueza em detalhes é tão exuberante
que por vezes me vi assistindo a cena uma vez para ler a legenda, e então
voltando para admirar os detalhes perdidos com a leitura. A simples imagem da
rua em um dia congestionado de chuva, já contém uma riqueza incrível. E claro,
sem jamais causar sensação de incômodo ou poluição na tela. O material de Takao
para construção dos sapatos é cuidadosamente mostrado em detalhes, com uma
atenção extremamente interessante. Explorando ainda as imagens que a chuva
proporciona, por exemplo, ao focá-la estourando na superfície de um lago e a
diferença na pedra lisa.
A
luz solar continua ausente como de costume (ainda mais com o foco nos dias
chuvosos), geralmente em um borrão branco desfocado nada bonito ou mesmo
alegre. Uma analogia clara à felicidade e bons sentimentos que parecem sempre
fugir de seus melancólicos personagens, ainda mais neste cujo pacto entre o
“casal” depende dos dias escuros e acinzentados. E aqui os protagonistas voltam
à falar com suas vozes quase sussurradas e confidentes para com o espectador,
como já acontecia em 5
Centímetros ... e Hoshi no Koe.
Revelando-se
um estudo de personagem maduro e curioso, é interessante notar, por exemplo, as
diversas pistas que Makoto joga sem escancarar, mas que somadas se complementam
e diz muito sobre Yukino. Começando com seu hábito de tomar cerveja pela manhã
e faltar ao trabalho com freqüência; depois vemos que ela não possui habilidade
alguma na cozinha; e então descobrimos seu apartamento completamente bagunçado
e as mentiras que conta. Assim, claro, lhe chama atenção o
completo oposto que é Takao: um jovem que, mesmo matando as aulas em dias de
chuva, dedica esse tempo não para dormir, mas aprimorando as habilidades de sua
possível futura carreira. Dividindo os estudos com trabalho para comprar
material para fabricar seus sapatos, é um entretenimento à parte a dedicação
toda para com sua arte. Enxergando em Yukino a figura idealizada de uma mulher
feita (“Para mim, ela representa os
próprios segredos do mundo”), o diretor faz questão de salientar na cena em
que o garoto tira as medidas do pé dela, como se estivesse quase que
literalmente a reverenciando.
Encerrando
sua curta história com energia e emoção em seu discurso final, Makoto Shinkai
cria com sucesso mais um doce casal para sua galeria, ao lado de Mikako e
Noburo, e Takaki e Akari. Separados não somente pela idade, mas por outros
fatores que não posso revelar, em momento algum se torna algo repulsivo como a
quase bebê Asuna de seu filme anterior. O amor não consumado de suas obras
talvez seja idealizado justamente por isso: por ser feito de poucas doses,
jamais foi consumido por completo, ficando gravado em nossas mentes e corações
como uma eterna possibilidade.
(Para mais dos meus textos, é só ir no menu 'Crítico Nippon'.)
@PedroSEkman
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