quinta-feira, 22 de maio de 2014

Entrevista com o Diretor de Aku no Hana e Mushishi: Hiroshi Nagahama

Polêmico diretor compartilha sua visão sobre a indústria.
Essa entrevista com Hiroshi Nagahama é lá de 2012, quando Aku no Hana ainda estava em produção, mas é uma entrevista bem pertinente em alguns pontos, embora eu discorde da visão que ele tem sobre a indústria de animes  (na verdade ele não comentou detalhadamente e isso pode dar uma impressão errada). A indústria de animes televisionados, em seus primórdios, surgiu nos anos 60 para atender a ideologia do Tezuka que acreditava ser possível exibir animações semanais. Começou com adaptações de seus mangás, para só nos anos 70, várias mentes criativas saírem do seu estúdio, o Mushi Production, além da Toei Animation, por ambicionarem empregar seus talentos em obras originais, formando então diversos novos estúdios, entre eles o clássico Sunrise. Desde sua fundação, nunca que a indústria teve mais animes originais que adaptações, embora a quantidade de animações originais tenham diminuído com os anos, principalmente frente a crise econômica dos anos 90, diluindo a quantidade de projetos mais ambiciosos e ousados.

De qualquer forma, é bom salientar que o mercado de tv gira em torno de merchandising. Um exemplo está no recente desprezo da tv aberta brasileira por animações em detrimento de programas de variedades. Spoilers: programas de variedades se mostraram uma melhor fonte de atração para patrocinadores, nos tempos atuais. A saída de animações da tv aberta não apenas evidencia sua baixa audiência, mas também demanda de patrocínio. O meio visual é um excelente recurso comercial, e para ilustrar isto, atualmente temos Shingeki no Kyojin, que devido à sua chamativa adaptação, atraiu muitos olhares para o mangá, fazendo de uma obra que já era sucesso, um absurdo mega hit. Também discordo (ao menos, em parte) que obras originais de sucesso podem acarretar em animes de sucesso. É mais complexo do que isto, ainda que quando se adapte uma mídia original de sucesso, geralmente se espera que seja um enorme comercial para elevá-la ainda mais. Obra original de sucesso = potencial.

Outra coisa, é que achei curioso de como para os japoneses, de um modo geral, a abertura é algo que não se pode fugir em sua exibição original, já que são exibidas na tv. Para nós é um pouco diferente, né? Sei de uma galera ai que sempre pula aberturas e encerramentos, heheh. Enfim, chega. Fiquem com a entrevista.

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Fonte original: Koi-Nya

Pergunta: Além de diretor de animação, você também trabalhou como animador e design, tanto de personagens como mecânico. O que você destacaria de cada uma dessas experiências e em qual se sentiu mais realizado?

Resposta: O design é um dos trabalhos com que me sinto mais confortável. Por exemplo, em Revolutionary Girl Utena fiz desenhos muito variados, tanto de objetos como de personagens. A partir do ponto de vista da direção, tanto design como o diretor de animação são trabalhos muito parecidos, não há muitas diferenças entre um e outro. Transmitir algo com um desenho é muito semelhante em ambos os casos.

P: Em projetos como The Cockpit você trabalhou como design mecânico. Como é o processo de documentação ao preparar este tipo de produção?

R: O criador da ideia original de The Cockpit foi Leiji Matsumoto. E neste anime o avião principal que aparece é um modelo real, e o que tínhamos era um protótipo com base nele. Pela primeira vez tivemos de nos informar sobre vários aspectos deste avião. Fomos muito detalhistas, por exemplo, com o motor, o tamanho das asas, sua inclinação... Os desenhos mecânicos sempre exigiram os mínimos detalhes, e nós temos que deixar muito claro a sua funcionalidade, por que isto aparece no anime.

P: Algum dia gostaria de criar de novo um design mecânico próprio?

R: Sim, eu gostaria. Tenho em mente um possível design para a franquia Gundam da Sunrise, mas o projeto está parado por enquanto. Eu gostaria de usá-lo no futuro. Quanto ao design dessa ideia, é um pouco grotesco. Como dizer... Mesmo em um contexto de tecnologia futurista é estranho sua maneira de mover-se e funcionar, e seu interior é inquietante. Foi concebido como um corpo humano. Sim, eu gostaria de usá-lo.

P: Você também animou e dirigiu aberturas e encerramentos de diversas séries. O que você leva em conta na hora de abordar estes trabalhos?

R: As aberturas e encerramentos não se assemelham muito. A abertura é um prólogo para o episódio em questão. Então, muitas vezes a intenção é mostrar uma parte da história principal que vai se desenrolar. E como o encerramento é algo a ser mostrado depois da história, dependendo das emoções que foram transmitidas no episódio, a percepção da intensidade vai mudando. Em um episódio o protagonista parece que vai ganhar, mas em outro parece que vai perder, a sensação mudou. Por isso em algumas séries quando morre um personagem importante, nós gostamos de mudar um pouco este encerramento para algo de acordo com o episódio. Por isso é sempre mais complicado animar um encerramento do que uma abertura. De qualquer forma, como a abertura é algo que as pessoas que querem ver o anime a verão, porque sabem que elas vem antes, não é colocada muita ênfase sobre ela.

P: A abertura de Sexy Commando Gaiden: Sugoiyo! Masaru-san, anime que você participou, continua sendo lembrada mesmo depois de 14 anos. Você acredita que as músicas de anime podem se tornar uma marca registrada da série que fazem parte?

R: Sim, quase sempre acontece. Uma música de anime é algo muito importante numa série, para que quando alguém a escute, esta série ressoe em sua mente. Agora não acontece muito, mas antes as aberturas diziam muito o nome do protagonista ou da série: “Gundam, Gundam, Gundam”. Hoje em dia essas músicas não têm nada a ver com a sua série nem sequer foram escritas expressamente para elas, são apenas canções pop ou rock que foram pegas emprestadas. Ainda assim, mesmo que não tenham nada a ver, quando anime e música se juntam uma espécie de simbiose é criada. No caso de Sexy Commando Gaiden: Sugoiyo! Masaru-san, a sua abertura é interpretada por um grupo chamado Penicillin. Eles escolheram a música pensando que seria muito estiloso, mas ao uni-la com as imagens de abertura, foi mais como uma música divertida. E esta é outra expressão do poder do anime.



P: Você trabalhou muito com o diretor veterano Akitaro Daichi. Como você descreveria a sua experiência de trabalhar com ele?

R: Akitaro Daichi é uma pessoa incrível. Antes de conhecê-lo, eu trabalhava em séries como The Cockpit ou Utena, minhas tarefas consistiam principalmente em desenhar o projeto. O fato de hoje em dia trabalhar mais como diretor é graças a ele, porque eu caminhei em direção a ele. Na verdade, era como se tivesse me ordenado “você tem que dirigir”. Foi com ele que planejei meu primeiro storyboard para Sexy Commando Gaiden: Sugoiyo! Masaru-san. No início eu recusei porque eu não me achava capaz, até então eu sempre tinha me dedicado a desenhar. Então eu conheci Hiroaki Sakurai, e nós três fizemos todo o processo deste anime, desde storyboards à animação em si. Depois disso foi quando tudo começou. Às vezes eu só faço os storyboards, como no caso do primeiro episódio. Graças a Daichi muita gente começou como animador e design, mas ao longo do tempo se tornaram diretores e alcançaram postos de mais importância, como é o caso Kyuuta Sakai, que, em seguida, trabalhou nos desenhos de personagens de Higurashi no Naku Koro ni, Ichigo Mashimaro em Sankarea. Tanto para eles quanto para mim foi uma grande oportunidade de trabalhar com ele em Sexy Commando Gaiden: Sugoiyo! Masaru-san, uma vez que Akitaro Daichi nos ajudou e fez muito por nós.

P: Além de Akitaro Daichi, também participou em projetos de Kunihiko Ikuhara e Katsuhiro Otomo, diretores que já são lendários na indústria de anime. Como é trabalhar com profissionais que criaram obras tão pessoais?

R: Depende em que posição você está trabalhando. Com Kastuhiro Otomo trabalhei como key animation para Memories, então eu tive que fazer exatamente o que ele me pedia, enquanto que com Kunihiko Ikuhara trabalhei projetando designs para Utena, então eu tive que colocar no papel o que ele tinha em mente e eu tinha mais margem. Quando ele me dizia “é exatamente o que eu queria” me enchia de satisfação. Por outro lado, com Akitaro Daichi tive que dirigir episódios e tive bastante liberdade. Em Fruits Basket me dizia diretamente para fazer o que eu quisesse e o que eu considerasse mais adequado. Como disse anteriormente, depende da tarefa que você está desenvolvendo.

P: Como diretor de animes que adaptam mangás originais, você acha que é essencial representar fielmente a história, ou também é importante que essas produções tenham a sua própria personalidade com o selo de seu diretor e equipe de produção?

R: Do meu ponto de vista, se você se adaptar a obra original você tem que respeitar a sua história, evitando capturar nelas suas próprias ideias. No entanto, por vezes, é o próprio criador da obra original que nos pede para adicionar algum detalhe novo, e neste caso eu mesmo ao lado do estúdio de animação quem pensa numa forma de adicioná-lo. Por exemplo, no caso de Mushishi, um mangá que sempre me encantou, me preocupava muito em como seria adaptado, se algo estava fora do lugar, por isso insisti em dirigir pessoalmente este anime. Eu fiz todo possível para que tudo saísse bem, embora eu admita que o anime não é 100% fiel ao mangá. No entanto, sempre se pedia a opinião do autor original e se tentava respeitar certas nuances, como algo que o autor fez assim e não de outra forma, e você não pode ir mudando assim. Ainda que acrescentar algo próprio seja inevitável, porque se no formato mangá falamos de, por exemplo, uma luta, desta só aparece vinhetas que representam partes do mesmo. Por exemplo, se um personagem dá um soco (fingindo dar um soco no redator para reproduzir o exemplo) aparece apenas o impacto final, assim em sua etapa para anime tem que se imaginar o resto dos golpes, o processo que levou a essa imagem final. Esse é o trabalho do diretor e criador do storyboard. Para capturar uma única imagem do mangá temos que trabalhar muito.

P: Há um grande número de animes adaptados, e nos últimos anos tem havido um grande crescimento de séries baseadas em mangás e, sobretudo, light novels. Você acha que essa tendência corresponde a uma crise criativa na indústria?

R: De fato, é o que eu penso. Cada vez se vende menos DVDs de anime, de modo que para ter sucesso é preciso apostar em algo que podemos ter a certeza que irá vender bem. Se um mangá tem tido muito êxito, seu anime também terá. Creio que todos na indústria de animes sentem o mesmo sobre a situação, desde os diretores aos próprios criadores das obras originais. No entanto, eu acho que a tendência agora é que a situação irá melhorar para a indústria de animes. 
P: Você tem trabalhado em muitos projetos, mas as suas duas grandes series, Mushishi e Detroit Metal City, são praticamente opostas. Além disso, também já participou da serie de humor absurdo Gag Manga Biyori. Prefere trabalhar em projetos sérios ou nos centrados na comédia?

R: Prefiro trabalhar em series divertidas, mas o projeto que eu tenho em mãos agora não é (mostra um volume de Aku no Hana). Trata-se de una historia um tanto obscura. São obras muito distintas entre si. Mas como curiosidade, digo que em todas essas obras possuem bichos: Mushishi, DMC, e o impropério nesta capa de Aku no Hana (risos). A verdade é que eu não tinha me dado conta até que um animador comentou comigo. Parece que atraio bichos (risos).

Nota: em japonês, “mushi” significa bicho. Em Mushishi a referência é clara, mas em DMC é um pouco mais elaborada, pois em japonês estas siglas são lidas como “de emu shi”: “dee-mushi”. Enquanto o insulto que aparece na capa de Aku no Hana é “kusomushi”, que significa “besouro” ou “verme”.

P: Tanto o final de Mushishi como o de Detroit Metal City nos deixaram a esperança de voltarmos a ver Ginko e Krauser-sama novamente. São projetos completamente encerrados ou podem retornar algum dia?

R: Um deles será continuado no próximo ano (risos). É uma promessa.

Q: Um de nossos leitores pediu-nos para que façamos a seguinte pergunta: Qual foi a sua motivação para se tornar diretor de Aku no Hana, sendo que se trata de um mangá pouco tradicional com uma trama algo transgressora para ser transmitida na televisão?

P: É algo que eu não decidi por mim mesmo, foi um produtor que me pediu. Eu disse a ele isto mesmo. Ele disse que não tinha necessidade de criar algo para vender agora, mas sim por durante 10 anos. Eu acredito que uma obra baseada neste mangá pode durar muito tempo. Quando eu fiz Mushishi me disseram algo muito semelhante, mas logo surgiram críticas muito positivas.


Fonte: Koi-Nya

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