Quando as engrenagens da vida se movimentam e te fazem retornar à uma situação desconfortável.
Acho que não está tão em alta mais, mas rodas-gigantes ainda
mantêm a imagem de um local romântico entre casais, não é? Não sei dizer até
onde isso é um capricho sarcástico da Five, mas ainda vejo o afeto de Twelve
como algo muito fraternal.
E de fato, este episódio conseguiu ir mais além ao brincar
com nossas expectativas. Construído basicamente de silêncios, sons diegéticos (sons e ruídos oriundos do próprio mundo da
série, como buzinas de carro), enquadramentos subjetivos e a trilha
sonora/BGM entrando apenas em momentos pontuais. Deram uma aula de como
construir uma atmosfera de suspense e tensão climática sem a necessidade de
recorrer ao elemento mais usual nesta formula; os efeitos sonoros. Ah, e os
olhos, os olhos continuam desempenhando um papel fundamental na narrativa de
Zankyou no Terror – o de expressar as emoções mais internas dos personagens,
dessa forma não é necessário que Twelve complete a frase, porque a resposta já
estava estampada em seus olhos e suas ações. Ele sempre soube do quão problemático
seria criar um vinculo afetivo com Lisa, no entanto, não foi capaz de
ignorá-la. A frase cortada pela metade e o seu olhar diz que ele vê nela a mesma
solidão e desamparo que sempre o acompanhou. Twelve não foi capaz de fechar os
olhos e ignorar Lisa, mesmo com todos os avisos de Nine.
Suas hesitações, sua traição a seu melhor amigo em prol de
suas próprias convicções pessoais, seu comportamento reflete suas emoções. E
não é que não tenha doído nele, podemos perceber sua desolação quando se posta
de joelhos, cabeça baixa, a câmera então se distancia e flagra a cena da
perspectiva exterior em um plano que nos permite ver melhor todas as suas
emoções fluindo. Resta apenas o silencio e uma gota de chuva que rola pelo
vidro, como que representando o interior de Twelve.
A construção de toda essa sequência da roda gigante que
levou a este momento é fantástica, um momento que se pode dizer emblemático e
que deveria ser relembrado futuramente como uma das melhores construções de
sequencias de animes. A roda-gigante girando, Lisa novamente se desculpando por
uma burrada, Twelve lhe dizendo que não precisava mais se desculpar por nada,
que não era sua culpa, o alivio de Lisa que parece satisfeita e o peso dramático
que fica faz parecer que irá culminar num desfecho trágico, enquanto a câmera
flagra diversas perspectivas diferentes da cena; o olhar significativo de Lisa
para lua, o plano aberto trazendo à tona a belíssima noite, as estruturas da
roda-gigante em zoom in e out- eu realmente achei que ele fosse saltar e Lisa
morrer. Poderia ter sido incrível e apesar de que seria um fim melancólico para
Lisa, também seria bonito, já que no derradeiro momento, ela teria encontrado
um pouco de amor, alguém que a compreendesse.
De modo que surpreendente para mim foi Twelve trair Nine. E
isso é fantástico, o personagem está crescendo e ganhando vida própria, traindo
as expectativas que poderíamos ter sobre ele. É parecido com o que Gen Urobuchi comentou a respeito de sua personagem Homura [de Madoka Magica] em relação ao
ultimo filme da trilogia. Ele se preocupava com a reação das pessoas ao verem
Homura com uma postura como àquela do
filme, mas que isto significava que a personagem estava evoluindo
narrativamente, ao invés de se manter em status quo. Tais desdobramentos tornam
os dois últimos episódios de Zankyou no Terror imprevisíveis e excitantes,
jogando a trama numa direção irreversível.
***
Aliás, todas as pontas do mistério finalmente se veem
unidas, não é algo surpreendente de fato [com exceção da revelação sobre a
bomba atômica], todas as pistas soltas esboçavam para este fim. O laboratório realmente
fazia testes em crianças, tornando-as superdotadas em intelecto e realmente era
algo envolvendo os altos escalões japoneses e americanos, mas a forma como isto
é contado dá uma visão pavorosa e asquerosa em relação ao projeto. A
intercalação narrativa entre planos gerais do ambiente obscuro [com a chuva
caindo] da casa de Shingeru Yamamoto, os flashbacks monocromáticos que indicam
um fato ocorrido no passado e enquadramentos fechados nas feições de Shibazaki
e Hamura são fundamentais na dualidade do aspecto frio e melancólico desta
revelação na primeira parte. Inclusive, diz-se que Five foi a única sobrevivente
dos testes [já que os outros experimentos não viveram muito tempo], ao lado de
Nine e Twelve; Five desmaia ao final do episódio, logo; poderia ser que o tal
tempo que Nine vive dizendo para Twelve que está se acabando, é em relação à
vida deles? A ver.
Enfim, me faltam palavras para expressar o quão incrível foi
este episódio em termos de direção e roteiro, em especial a segunda parte, onde
o reencontro de Twelve e Lisa diz tantas coisas sobre os dois personagens com tantas
sutilidades ao lado de planos fechados e abertos, enquadramentos e angulações. Mesmo
o maior blefe do episódio se dá numa fração de segundos: a atitude de Five ao
ir em direção ao botão do controle nos últimos segundos quando Twelve parece
que não abrirá a boca, insinua que em nenhum momento ela iria explodir os dois
e já estava pronta para interromper a contagem, quando Twelve entrega a
localização da bomba. Five se mostrou mais calculista e fria do que aparentava.
Desfruta do jogo, mas sabe que a simples captura de Twelve não resolveria o
problema da localização da bomba, seria preciso capturar os dois ou jogar com
um deles para que entregasse o esconderijo daquilo do qual estava atrás. Touché.
Trivia
O plano Atena me soa similar ao Lebensborn (significa “Fonte da Vida”), uma
fabrica de crianças arianas introduzido na Alemanha nazista de 1935. Fazia parte da crença nazista de “Raça
Superior” que dominaria parte da Europa. Com o sucesso dos experimentos no
começo da Segunda Guerra Mundial, o plano se estendeu por toda a Europa. As mulheres
que se submetiam ao projeto tinham que ser de origem ariana, muitas eram
forçadas a manterem relações sexuais com soldados nazistas, e as crianças
nascidas do projeto eram criadas por pais nazistas, adotivos ou não. O objetivo
era criar uma raça racialmente pura que dominasse o mundo. LOL. Essa é
basicamente o mote de Elfen Lied, um laboratório de testes para criar crianças evoluídas.
Este que também é o tema de The Hour Of The Mice.
Avaliação: ★ ★ ★ ★ ★
Roteiro: Hiroshi Seko
Storyboard: Tachikawa Yuzuru, Akitsugu Hisagi, Shinji Satoh
Aux. de Direção: Akitsugu Hisagi, Kenji Mutou
Direção: Shinichiro Watanabe
______________________
-Me deixou curiosa o contraste de uma roda gigante em tons de cinza, indicando ser uma memória do passado, em contraste com a do momento presente. Por causa disto, até cheguei a pensar no episódio que este seria um retorno ao passado... de certa forma o é, mas não como imaginei: a roda-gigante sendo uma especie de simbolo da infância entre Five e Sphinx. A roda-gigante é provavelmente uma alusão à Roda da Fortuna, que é uma metáfora para o eterno movimento, ora de ascensão ora de declínio (o título do episódio é justamente "Altos & Baixos"). Fala-se sobre uma volta de uma roda cobrir um ciclo completo e de constante movimento, que nada se mantém inalterado, como a relação de Twelve e Nine. Sendo Zankyou no Terror uma história que aborda a questão do destino e ciclos, é natural que a função subjetiva desta cena seja justamente ressaltar a natureza cíclica da vida, que mais uma vez retorna a um ponto que já passou, do passado. Os corvos expressam morte e solidão, como se nota no flashback onde eles voam ao lado da roda-gigante em um ponto que parece próximo ao laboratório que ilustra a realidade das crianças naquele lugar como também um dos temas da série, e novamente o mal presságio da morte volta a assolar, mas dessa vez a roda-gigante surge com as cores verdes, que expressam esperança, e azul, de equilíbrio. Twelve diz para Lisa que ela não tinha culpa, e de alguma forma eu senti que este "a culpa não é sua" era muito mais significativo do que parecia; como se ele estivesse a isentando da culpa de inadequação, de se sentir sem um lugar, de ser invisível.
-Este plano é magnifico. Ele expressa o vácuo que se abateu sobre Shibazaki quado ele descobre a verdadeira natureza do plano de Atena. A câmera vai se afastando lentamente, revelando todo o espaço semi-obscurecido ao redor.
-Tá, última imagem. Essa cena mostra o quanto a lua desempenha um papel tão marcante em animes [e mangás], diferente de qualquer outra mídia, sua presença é difícil de não se fazer notar, especialmente em momentos mais emblemáticos. Já comentei sobre isso aqui, em A Lua e os Animes.
Curta o Elfen Lied Brasil no Facebook
e nos Siga no Twitter