terça-feira, 23 de dezembro de 2014

12 Dias de Anime – #03: Um Encontro Com o Mestre dos Mushis

12 dias de animes é uma iniciativa do The Cart Driver, até onde eu sei, embora vários modelos desta postagem povoando o blogging americano neste período do ano. Consiste-se em listar 12 momentos marcantes OU NÃO que representam cada mês do ano relacionado a anime, que acabou se tornando algo que vale a pena ser relembrado, seja por qualquer motivo, no ano em questão. Sim, é basicamente uma retrospectiva pessoal. O legal deste padrão de postagem é que se trata de um modelo bem aberto e adaptável à necessidade de cada um. Portanto, meus 12 dias de animes começa agora e termina dia 1º. Não sei se vai sair algo de interessante daqui, porque até o presente momento que estou escrevendo esta introdução, nem sequer fiz uma lista prévia e tenho a ligeira impressão que 2014 foi meu pior ano relacionado a anime; não li muitos mangás, muito menos light novels ou visual novels ou doramas, nem muitos filmes japoneses e tampouco consegui maratonar animes antigos (e ainda por cima atrasei nos atuais). Bora lá então ver o que sai disto, buscarei ser o mais sincera possível, ilustrando 12 acontecimentos que dão forma ao meu 2014.

Desbravar os mares de Mushishi em 2014 se equivale à minha excursão por Natsume Yuujinchou no agora distante 2012. Foi uma experiência extremamente gratificante e distinta. Eram animes elogiadíssimos, e sempre me pareceu que ambos possuíam uma idílica natureza folclórica que sempre me atraiu em séries sobrenaturais japonesas, tais como Vampire Princess Miyu, xXxHOLiC e Jigoku Shoujo – o Japão tem essa facilidade em transformar o seu folclore em histórias místicas metafóricas que envolvem e seduzem a mente; não que o nosso folclore não seja rico (não é por acaso que O Sitio do Pica Pau Amarelo é tanto um marco na nossa literatura como também em termos de produção televisiva), no entanto geralmente não é explorado com a pericia necessária ou encarado com a mesma seriedade, e talvez esta seja a diferença fundamenta, já que uma das características da cultura japonesa é o respeito aos seus mitos e tradições.

Eu provavelmente ainda não teria assistido Natsume Yuujinchou ou Mushishi se não estivessem anunciadas temporadas novas. Sim, eu sei, mas é tanta coisa que parece bom para assistir e a mania cancerígena de querer acompanhar muitos animes semanais, que você está sempre adiando com a barriga. Isso não é bom, é um péssimo planejamento que não usufrui com propriedade do tempo livre que temos disponível. De qualquer forma, eu pude vir a conhecer Mushishi e me encantar e me apaixonar pela maioria de suas histórias. Dizem que Mushishi não é uma série que foi feita para maratonar... Bem, de fato não é uma narrativa com estrutura que privilegia maratonas intensas, de 5 a 10 episódios seguidos por dia. Como a estrutura e narrativa são sempre similares em todos os episódios, pode se tornar enfadonho. Como se trata de uma série de atmosfera que envolve sensibilidade emocional, pode se tornar desgastante. Teve episódios de Mushishi, que ao chegar ao final, eu simplesmente não conseguia assistir mais nada, pois era tomada por onda atmosférica que não me permitia seguir adiante enquanto não degustasse e absorvesse devidamente o que acabara de assistir. Não digo que isto tenha acontecido comigo apenas com Mushishi, na verdade é algo que me toma de assalta em tudo que me envolve emocionalmente e psicologicamente. É como um fragmento de depressão pós-termino, no qual eu preciso continuar respirando, pensando e me deliciando mentalmente com o que acabara de me apetecer por um longo tempo, para enfim, superar e seguir adiante.

Para mim, este é o orgasmo supremo que uma obra de entretenimento pode me oferecer. Deixar-me tão aficionada e queimando por dentro ao ponto de me ver incapaz de deixar aquilo de lado para experimentar outra coisa, enquanto não o absorver por completo. Quando eu li o O Diário de Anne Frank, vivenciei esta experiência, mas de uma forma diferente: explosiva! Sentia como se uma chama intensa me devorasse por dentro, eu queria gritar e gritar e chorar, explodir e me misturar ao cosmos. Um sentimento de revolta e tristeza, mas também de deslumbrante fascínio por uma habilidade de escrita que era tão hábil em refletir emoções internas muito abstratas Naquele noite em que eu terminei o livre, foi difícil deixar meu corpo elétrico relaxar até conseguir dormir. Já em Mushishi, o que me ocorre é contemplação, mesmo que uma chama voraz que queime por dentro, o que eu sinto é uma vontade de fechar os olhos e olhar para dentro de mim, me misturar à escuridão. As vezes fui dormir depois de ter visto um dos seus episódios e fiquei refletindo no que acabara de ver até o sono naturalmente me tomar de assalto. Essa sensação letárgica sempre me toma depois de ver Mushishi. É como apreciar o pedaço de pudim mais delicioso da face da terra, é algo que exige um ritual para que você consiga extrair todas as suas peculiaridades, e depois de se extasiar de tato comer, o que resta é... a imensidão do universo enquanto o nosso corpo pende preguiçoso.  

Acho que a abertura da segunda temporada de Mushishi resume este sentimento tão particular e interno.


Mas, no meu caso, nunca foi um problema maratonar vários episódios seguidos, pelo contrário, quando terminava um, sentia uma angustiante necessidade de ver mais um. Geralmente eu fechava minha maratona em 4 episódios diários, 2 logo na parte da manhã e 2 à noite/madrugada. Isso me dava tempo de refletir melhor acerca de cada episódio e fazer uma melhor digestão. Foi realmente uma boa experiência, que me levou de volta aos tempos em que eu peguei para assistir xXxHOLiC a conta gotas, com um episódio por dia, sempre antes de ir dormir. Melhor ainda não foi ter que esperar um longo tempo para revisitar a história, pois a segunda temporada estava logo ali. Foi um dos meus melhores investimentos em 2014 em relação a anime, que mesmo com sua simplicidade, soube conquistar seu espaço e se destacar entre tantos por uma produção esmerada (e se para manter o bom nível de sempre é preciso atrasar os episódios, que se atrase todos).