A conflitiva relação de memória e realidade.
Existiu há muito tempo uma adolescente alemã de origem judaica repleta de sonhos, que teve sua vida interrompida precocemente – ela queria viver para sempre, e de certa forma, ao menos este sonho ela conseguiu alcançar através de seus escritos que chegou a varias pessoas de diversos lugares do mundo, se tornando uma das personagens mais emblemáticas dos efeitos nefastos da guerra na vida das pessoas. Com isso, sua memória continua viva na mente das pessoas, despertando uma estranha empatia e intimidade, mesmo sendo alguém que não se conheceu pessoalmente.
Eu tenho uma ligação muito forte com palavras escritas, especialmente oriundas do próprio punho e repletas de particularidades. Ainda hoje mantenho o habito de pegar alguns livros emprestados em bibliotecas, livros usados tem essa coisa de ter passado de mão em mão e trazendo em suas páginas amareladas não apenas a história daquela narrativa, mas também um pouco de cada pessoa. Com cartas, essa ligação emocional se estreita mais. Até um tempo atrás cartas era um meio imprescindível de comunicação entre pessoas que estavam separadas por determinada distância. Caracteristicamente, carregam em si um profundo apelo emocional, exatamente pela exposição da distância em relação ao ser pretendido, em conseqüência, trazem saudades e angustia. Sou feliz por não ter vivido esse tempo. Quer dizer, nasci na metade dos anos 90, então claro que peguei um pouco disto, mas não conscientemente. Claro que elas sempre foram também alvo de declarações amorosas e correspondência afetiva, em tempos que não havia redes sociais, mas hoje sua existência geralmente se restringe ao seu apelo romântico e idealizado. Pessoas que não têm coragem de se declarar face-to-face, sempre podem encontrar nelas uma possibilidade.
Então, o que? O episódio da semana de Vivendo Na Escola é um exemplo de caso. Uma linda e poética passagem que serve, ao mesmo tempo, como um mau presságio do que estar por vir, e de apelo emocional. O que mais tem me fascinado nesta direção de Gakkou Gurashi, é este desprendimento... ou talvez, despretensão, com que trata o conflito vital deste anime de curta duração, que é a relação de Yuki com a realidade a sua volta. Neste episódio praticamente se confirma que ela já não está mais tão inconsciente, diria que ela atingiu um estado de semi-consciência. Como quando despertamos, mas não por completo, e o sonho que estávamos tendo continua, mas a partir de então os eventos são meio que controlados por nossa consciência ativa. Assim, quando você desperta por completo, fica na dúvida se era mesmo sonho ou apenas a sua vontade dando asas à imaginação.
Eu sempre pensei que Yuki se refugiara num simulacro por medo do mundo real, mas pela primeira vez, fico a pensar que talvez isto tenha ocorrido não pelo medo de encarar o que estava a sua volta, mas sim a ausência de uma pessoa tão importante em sua vida, que lhe fora arrancada de um modo tão violento. O pavor e experenciamento da perda provocam distúrbios e negativas da realidade em menor ou maior grau. Por isso, quando a imagem de Megu-nee se torna semitransparente ao passar pela porta, denotando os efeitos do tempo na memória afetiva, e Yuki responde com uma lágrima, entendo como se ela enfim compreendesse a verdade sobre a situação, e além da verdade, no que diz respeito ao fato de mesmo que o corpo físico de Megu não estivesse mais ali ao seu lado, ela carregaria sua memória enquanto vivesse, e sua presença continuaria ali, ainda que cada vez menos nítida. Penso nisto porque, além de tudo, Yuki antes de encarar a sua colega, parece decidir-se por continuar a representar. Fica a questão se ela é completamente consciente ou se ainda lhe restam algumas fissuras psicológicas. Bem, o grande ponto de divergência entre muitos que assistem e conhecem o material original é o anime estar adotando uma direção mais autoral, com rumos que divergem relativamente do mangá. Não faço idéia do quanto há de bom e ruim nisto, mas Masaomi Ando tem sido episódio a episódio uma grande surpresa da temporada, como diretor.
Avaliação: ★★★★★
Staff do episódio:
Roteiro: Ukyou Kodachi
Diretor do episodio: Hitomi Ezoe
Storyboard: Makoto Iino
Direção de Animação: Haruna Goutsu, Yoko Takanori, Takashi Narikawa
Direção: Masaomi Ando
Avaliação: ★★★★★
Staff do episódio:
Roteiro: Ukyou Kodachi
Diretor do episodio: Hitomi Ezoe
Storyboard: Makoto Iino
Direção de Animação: Haruna Goutsu, Yoko Takanori, Takashi Narikawa
Direção: Masaomi Ando
-Detalhe bacana: algo que compreendemos instintivamente por sugestão e conhecimento comum, mas raramente pra ficar refletindo sobre (porque não há nada de grande pra se ficar analisando, e mesmo assim, é um fragmento importante para o restante da estrutura narrativa). Essa cena de abertura, através de perspectiva nublada de Mii-kun dá o tom para o restante do episódio, em relação à memória afetiva, recordações, saudades, e ausência física que contagia os sentidos em paralelos com a presença emocional ainda pulsante, onde enxergamos aquela pessoa em tudo. Como em Em Busca do Tempo Perdido, onde o personagem-narrador ao mergulhar a famosa madeleine numa xícara de chá se deixa transportar pela memória, As coisas que a pessoa gostava, os seus hábitos, a forma de conversar, atividades que desempenhava com frequência, tudo. Também acho essa cena muito fofinha por Yuki começar a preencher o espaço vazio deixado pela outra,
-Aqui é outro exemplo interessante, com Megu e Yuki no centro e estreitamente próximas, iluminadas pela luz, enquanto as outras mantém uma distância substancial, parcialmente imersas nas sombras. Evidência o seu grau de consciência em relação ao que está se passando ao redor, enquanto Yuki é naturalmente mais ingênua e embarca com facilidade na proposta da professora. Elas, Megu-nee e Yuki, estabelecem com esse pacto de fantasia escapista um elo forte e profundo. É o que absorvo desta cena.
-Elas não assistiram A Lagoa Azul? Sair da bolha significa o fim dos sonhos! KBOOM! É bad ending minhas querida!
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