sábado, 19 de dezembro de 2015

Transit Girls: Uma olhadela no Primeiro dorama Lésbico dos Japas

Ou assim eles dizem. 

Muitos dos que são fãs de animação e mangás ficam surpresos e impressionados que, embora haja um amplo demográfico e gêneros para séries de temáticas homossexuais, e que relações ou insinuações entre seres humanos do mesmo sexo seja algo comum e até mesmo utilizado como isca de fãs em diversas séries de animes e mangás, o Japão seja tão conservador em relação à temática LGBT. 

Acontece que a cultura otaku é um gueto, e há muito mais de vida e coisas acontecendo além da superfície. Japão não faz só animes e, a maioria deles, é exibida durante as madrugadas. Doramas (as novelas/seriados japoneses), por outro lado, é o que há em termos de maistream. Então quando uma Fuji TV (onde é exibido o bloco noitaminA), simplesmente uma das maiores redes de tv japonesa, resolve transmitir um dorama com temática lésbica e ainda faz toda uma promoção em cima, vendendo-a como “a primeira série lésbica” e com o “primeiro beijo entre duas mulheres na tv aberta”, obviamente chama a atenção da geral. 
Apesar de todo o comercial em cima, e talvez por já estar desgastada com o que a Globo e Sbt se promoveram com isso sem oferecer nada a altura em troca, eu fui assistir aos dois primeiros episódios (disponíveis até então) sem nenhuma expectativa. E no entanto, calhou de clicar bastante comigo. As comparações com mangás yuris, em especial o super popular Citrus, são válidas. Tanto em enredo como estrutura/forma. É notável todo aquele característico ar de ingenuidade e contos de fadas, ou seja, de um romance idealizado caracterizado por personagens arquétipos. 

No entanto, são apenas dois episódios de apenas 20 minutos e essa atmosfera é bastante superficial, tendo amplas possibilidades para que seja dissipada. O enredo conta a história de duas garotas, de 18 e 21 anos, que se tornam “meias-irmãs” após os pais irem morar juntos. Em meio à tensão que surge por parte de Sayuri e sua não aceitação em seu pai constituir uma nova família, ela e sua “irmã” mais velha, Yui, serão envolvidas em uma onda de sentimentos conflitantes uma pela outra. 
Sayuri é interpretada como uma garota de temperamento forte e difícil, às vezes áspera demais ao ponto de se tornar rude com seus desafetos, mas doce e simpática na intimidade. Vivida pela bela Sairi Ito, que acentua um pouco de “feiura” à personagem, tornando-a mais próxima a realidade, Sayuri às vezes pode soar antipática, contudo, seu tom é o mais adequado à situação de uma garota aos 18 anos que perdeu sua mãe e se torna única na vida do pai, só que de repente vê duas vaginas ameaçadoras, querendo destrona-la, e por consequência, tomar o lugar que foi de sua mãe. Eu também me sentiria irritadiça e não abriria fácil a guarda. Mas penso que o que há de mais belo nela seja justamente este seu lado selvagem e arisco, que no fundo denota carência. Ela é pintada como uma garota que mantém relacionamentos heterossexuais, mas sem nenhum envolvimento mais profundo. É mais como se fosse por acaso, para passar o tempo ou pelo “por que, não?”. Para tentar ocupar um espaço que, no entanto, continuava vazio. É nesse sentido que seu relacionamento unilateral ao convívio conflituoso com Yui se manisfeta, para que quando seja atraída por ela, seja uma espécie de contraste, um sinal apontando o verdadeiro caminho. Aliás, se permitem uma correção precoce, o contraste já ocorre no momento em que ela resiste a um beijo do namorado, mas se mostra sem reação ao ser beijada por outra garota. 
Yui é interpretada pela cativante Yui Sakuma, que modelo por profissão, tem uma presença muito elegante e agradável em todas as cenas, ainda que componha uma personagem onde a tristeza do olhar é quase pungente, mesmo quando sorri (em contraste à ensolarada e explosiva Sayuri). É uma personagem que atraí simpatia por sua aparente candura e meiguice, mas não muito explorada até o momento. É justamente a partir de uma cena chave, em que ela beija Sayuri sem permissão, que a sua personagem desponta para um possível crescimento. Porém, o beijo acaba soando deslocado pela ausência de uma ponte entre as personagens, ou seja, uma contextualização melhor desenvolvida. Talvez seja melhor assim. Neste aspecto, a reação da Sayuri é primordial para compreendermos que não é uma simples idealização (embora haja sim a estrutura em torno que substancie isto). O beijo que Yui lhe dá é truncado, superficial, e principalmente; não correspondido. Sayuri permanece o tempo todo assustada e com os olhos arregalados, sem reação. Ela que é tão enérgica e reativa, se mostra passiva diante de uma atitude inesperada. Mas, talvez, essa sua passividade seja apenas porque dentro dela esteja havendo um terremoto muito mais relevante que um simples tocar de lábios. 
Sayuri acaba por ser levada por um gesto instintivo e quase desesperado. Um pedido de desculpas teria sido o mais apropriado, mas as palavras que externam o que sente em seu intimo, embora possam parecer desnecessárias, dão força argumentativa ao fato de ela não estar sabendo lidar com um tipo de sentimento que se aflorou em seu peito. Do meu ponto de vista, a caracterização ideal para que fugisse da estrutura arquetipa e estereotipada, seria Yui já ser iniciada, deixando o conflito de identidade somente para Sayuri. As duas lidando com situações tão similares ao mesmo é um prego que mantém o enredo a um nível mais baixo e o distancia de um sentido mais real, pois gera uma complexidade que talvez possa ser complicado de a série conseguir lidar. 

Bem, eu já passei por esse tipo de situação, e vejo na atitude de Sayuri, algo bastante natural e impetuoso em pessoas que se sentem daquela forma. Eu já fiz isso. Simplesmente por não estar suportando mais. A outra garota não reagiu bem, obviamente, mas eu consegui contornar a situação. É algo complicado de discutir genericamente, mas eu nunca me arrependi, pois me trouxe algo bacana no fim das contas. Acho que não quero entrar nesse tipo de discussão agora, mas eu gosto de como a Sayuri coloca Yui contra a parede e lhe questiona sobre o beijo. Não é uma reação negativa, como seria se quem roubasse o beijo fosse um garoto, pois ela está mais curiosa e especulando do que exatamente ofendida. Dizem que quem é gay, já nasceu gay. Não se torna um. Mesmo que só descubra depois de certa idade. Se este é o caso, não é preciso de muito para compreender o abalo sísmico que este beijo representa nas estruturas internas de uma menina que, aparentemente, nunca ficou fascinada sexualmente por um homem e se sentia a esmo em relação a isso. Olhando por este lado, Yui é a caixa de Pandora da Sayuri. 

Em tempo, a série terá 8 episódios e é exibida todos os sábados, às 23:40. A trilha sonora é bacana por si mesma, mas tem entradas e elevações anticlimáticas e fazem estardalhaço desnecessário. As atuações são aceitáveis, nada no nível ruim de Kamen Rider Gaim



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