quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Rewrite: Terra Route (Romeo Tanaka)

E enfim, o mestre de cerimonias! Spoilers, SPOILERS adoidados! Série de artigos de minhas impressões sobre cada rota de Rewrite. 


 Seiyuu: Masakazu Morita (eu não gostei muito da voz dele, quando se revelou... mas hoje, penso que faz sentido que se crie naturalmente uma antipatia. Faz totalmente parte da natureza de Kotarou e do contexto que ele vive.)

O amor está na gênese de Rewrite e ao ler Terra, se torna mais perceptível o quão vazio e sem sentido Kotarou se sente em relação a sua existência, razão pela qual ele se apega desesperadamente a qualquer sentimento vago de amor por outra garota, vendo através da realização dos sonhos e objetivos desta menina, o seu ideal – é esta garota, que precisa da ajuda dele para superar algum obstáculo, que dá sentido e forma à sua existência vazia. Em todas as rotas, incluindo Moon e Terra, Kotarou não busca por uma realização própria, pois ele mesmo é vazio e, sem ambições, não há algo que almeje que o faça querer quebrar a casca embrionária e encarar o mundo; nas rotas das heroínas, isto só ocorre quando ele tem o sentimento romântico desperto por uma delas e as toma para si, como uma posse, e é ao auxiliá-las a superar seus obstáculos, que ele encontra a recompensa no amor idealizado e incondicional que estas lhe servirão, dando um sentido à sua vida. Ou seja, a “felicidade”; o individualismo, o complemento; a substância; aquilo que dá forma à existência própria é algo que Kotarou só encontra na outra pessoa, não sendo capaz de sentir em si mesmo.

Claro que Kotarou é um protagonista típico moldado de modo que o leitor possa se projetar nele, com o mínimo de uma personalidade e com conflitos comuns ao meio otaku-life – peguemos como exemplo, Shirou de Fate/Stay Night, que também é um protagonista com os conflitos comuns capazes de levar qualquer otaku a se identificar facilmente e, por mais que seja um protagonista com bastante personalidade e ambições próprias, ele ainda tem um vácuo emocional suficiente para que o leitor possa se projetar nele. 

Ainda assim, o que move Kotarou e sua dificuldade de se encontrar por si mesmo, fazendo com que projete em outra pessoa o seu ideal, é algo muito comum em qualquer sociedade, e também fonte de infelicidades e frustrações, pois ao se projetar no outro ou buscar nesta pessoa o sentido de sua existência, você está buscando por um ideal utópico, afinal o ser humano é único em si mesmo e duas mentes por mais parecidas que sejam, têm sua própria forma de pensar. Em outras palavras, casais e pessoas apaixonadas adoram encontrar similaridades e gostos/pensamentos comuns entre si, de modo a reafirmar aquele laço afetivo, como se isto fosse o suficiente para assegurar o futuro desta relação, mas no primeiro conflito, a tendência é que as divergências se tornem mais e mais evidentes. 
Moon é uma rota que expõe este aspecto vazio e solitário de Kotarou, que sente uma necessidade pungente de se preencher e se conectar a alguém, mas não qualquer alguém, esta pessoa também deve estar fora de sintonia com o mundo e a presença de Kotarou em sua vida se faça absolutamente necessária. As primeiras palavras dele em Moon aludem exatamente a este estado de espirito carente e sem proposito. Em contrapartida, em Terra percebemos o quanto Kotarou é desconectado socialmente, exibindo uma quase apatia e desinteresse em relação às outras pessoas – não que ele seja introvertido ou tímido, ele simplesmente não se interessa, ao mesmo tempo em que as pessoas também parecem não compreendê-lo e se mostram incapazes de se conectar a ele, tornando seu sentimento de inadequação ainda mais latente. O que acompanhamos é a sua busca pelo significado de sua existência, a procura de algo que realmente consiga despertar um motivo pelo qual lutar, viver e lhe preencher. Terra é a única rota em que Kotarou busca por uma realização própria do ser. 

Se em Terra, Kotarou se sente isolado e solitário mesmo cercado de pessoas, paradoxalmente em Moon ele sente uma necessidade aguda de conversar com alguém, depois de perceber estar em um mundo devastado e ele, a única pessoa daquele mundo – fato que o faz insistir em se aproximar de Moon Kagari. Eventualmente, ele irá começar a notar seus sentimentos em ebulição pela moça e querer fazer de tudo para ajuda-la a superar seus obstáculos. Essa instantânea paixão que o faz até mesmo querer abrir mão de sua vida em favor de Kagari é uma explosão emocional que soa um tanto artificial e unilateral. O próprio Kotarou, em certo momento, se indaga em relação a isto e lança uma reflexão no que consiste a natureza do que entendemos como amor. Em outras palavras, para o personagem o amor não seria mais do que impulsos neurológicos em busca de recompensa e prazer, e tudo o que fez em prol das heroínas era pela sua autossatisfação. 

Terra complementa esta linha de pensamento, onde Kotarou até busca por uma razão própria capaz de dar um sentido à sua vida, e parte em diversas jornadas empíricas, mas todas as suas buscas resultaram no mesmo diagnostico; ele continuava se sentido vazio, uma existência sem sentido, não importava o quanto ele realizasse ou as pessoas que ajudava pelo caminho, o oco em seu peito não era preenchido. É quando ele se encontra com Earth Kagari e se vê completamente fascinado, em uma nova explosão apaixonada, ainda mais unilateral e artificial que aquela ocorrida em Moon, então novamente ele desperta em si um novo objetivo. As motivações de Kotarou não são estoicas, como ele próprio confirma. O que o move é se realizar através do outro, ou seja, do ser amado – para assim, obter a recompensa. 
Algo curioso que ocorre neste sentido, é que chega um ponto em que Kagari se torna uma espécie de um belo pássaro enjaulado, no qual ele quer manter o absoluto controle sobre suas ações. É, acredito, o momento máximo da objetificação feminina em Rewrite. Naturalmente, como uma flor que é arrancada do seu habitat natural, ela começa a murchar e definhar, perdendo o brilho e a vivacidade (contextualmente há um motivo pelo qual ela vai perdendo sua energia vital). A forma como ele vê e se relaciona com Kagari é complicada, e claramente... unilateral – portanto o teor romântico nas rotas das heroínas é ausente aqui, se tornando mais como uma fantasia masculina de adoração. Kotarou tem essa camada paradoxal e complexa, mas não consigo estabelecer se o autor quis dizer algo neste sentido através de suas ações ou se é apenas um caráter meramente auto insert, ou seja, para o leitor se projetar. O que o autor quis passar ou não normalmente não é tão importante, e sim a vida própria que tal obra ganha e a forma como ela é recebida e percebida culturalmente, mas o clímax; a conclusão no qual Kotarou chega ao fim de sua jornada é algo que não traz qualquer aprendizado ou crescimento ao personagem. Isto é o que me deixa relutante em relação ao desfecho da jornada pessoal de Kotarou, em Terra. Particularmente ele não é um personagem que eu goste, mesmo que eu sinta afinidade em diversos dilemas que permeiam sua vida, e tenha me emocionado com ele em determinado momento, ainda é um personagem que não clica comigo. 

Obviamente isto não diz nada sobre ele ser ou não um bom personagem. A questão é; Terra nos leva em uma jornada para que possamos compreender melhor o personagem, no entanto, ele não evolui e a conclusão que se chega é a mesma que obtivemos nas rotas das heroínas: apenas reafirmação de valor. No fim, é a conclusão que ele mesmo chega e, para ele, está bem assim. A única coisa que ele quer é realizar o desejo de sua heroína e nada mais importa. Narrativamente, é algo meio imposto para se obter o final desejado pelos leitores, não traindo a formula. 

Voltando ao conceito interessante que permeia o caráter de Kotarou, embora não compreendamos completamente a razão do porque ele ser assim [sendo algo bastante subjetivo] há indícios suficientemente fortes que a relação com a sua família tem um grande peso em toda a sua formação em um sujeito emocionalmente deficiente. É quando Kotarou vê ao seu redor todos perseguindo seus objetivos com afinco, que ele se sente ainda mais perdido. Sua amizade com Sougen Esaka é outro ponto importante e bem representado em sua jornada, como sendo o amigo mais próximo afetivamente que ele teve e que, mesmo este também não sendo capaz de compreendê-lo em tudo ou ser aquilo que esperava a amizade entre eles ainda era muito sincera e emocional. 

Ao terminar de ler Rewrite, a vontade é de voltar e reler toda a VN, de tantos detalhes e diálogos que enfim compreendemos e que ganham uma nova dimensão ao serem relidos. Há coisas divertidas como Kotarou ser aquele inspirou Yoshino a se tornar um gangster. E, no geral, o desfecho como uma experiência cíclica foi fabuloso e absolutamente emocionante. A temática central de Rewrite alcança com louvor a sua conclusão, e mesmo com algumas farpas, ainda é um produto final muito atraente. 

Avaliação: ★★★★

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