quinta-feira, 9 de junho de 2016

Zansho: Fim de Verão (2004) – Um Mohiro Kitoh Diferente

Em “Fim de Verão” (Zansho), título homônomo do primeiro conto da coletânea que também dá nome ao mangá, permeia o feeling de melancolia, embora haja histórias bastante ensolaradas – exemplos de “A canção do Papai” e “A&R”, mas a atmosfera mesmo nestas histórias é de doce e amargo ao mesmo tempo; agridoce.
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Existe toda uma metáfora em torno da expressão “Fim de Verão”, dado o fato de que, assim como ocorre com todas as demais estações, o verão simboliza energia; o estupor, a positividade e a própria vida em seu clímax – e o fim do verão marca o inicio progressivo do inverno e todo o significado que carrega em si. Portanto, mesmo que se trate de histórias publicadas aleatoriamente em diversas revistas e editoras, é perceptível que elas dialogam entre si e despontam para um tema em comum. 

Na sinopse do mangá, a editora L&PM classifica as histórias de Fim de Verão como “arrebatadoramente intimistas”, e é verdade. Elas têm um apelo bastante introspectivo, o que se nota pela caracterização dos personagens que estão sempre envoltos em questões internas, que invariavelmente tem ligação com o passado ou erros cometidos em dados momentos do presente que irão perseguir esses personagens por toda a sua vida. 
São 7 histórias, e 2 delas (Fim de Verão, A Garota do Cruzamento) trazem questões de vida após a morte, enquanto outras duas (Um Buquê para a Mansão das Flores, O Lugar do Totó) trazem reflexões sobre a natureza da morte e vida. Há mais 2 (Pureza Manchada, A&R) que proporcionam um certo sentimento de nostalgia e que, acredito eu, estejam inconscientemente conectadas; é como se a segunda fosse uma hipotética continuação temática da primeira, só que com personagens diferentes. 

Se fosse para eu destacar duas histórias, certamente seriam A Canção do Papai – que nos brinda com uma progressão despreocupada sobre dado recorte familiar em que os diálogos são absolutamente banais e com um charme especial daqueles momentos que não tem nada de especial; mas que de alguma forma o tempo os fazem parecer melhores do que realmente foram e bate aquela enorme nostalgia – e O Lugar do Totó, que conta uma história previsível, mas com uma reflexão sábia e terna que faz rima com aquele questionamento do que é feito a vida; você está vivendo realmente ou apenas sobrevivendo? Se fosse pra destacar duas histórias desinteressantes, seriam as 2 primeiras; Fim de Verão e A Garota do Cruzamento – inclusive nesta última, há um subtexto flagrante de incesto, que para quem conhece bem os signos de representação visual e comportamental de personagens em histórias japonesas, não deverá passar batido. É até curioso que não haja nada mais descarado nesse sentido aqui, pois incesto [e até mesmo pedofilia e estupro] são questões bastante recorrentes nas obras do autor Mohiro Kitoh.
Estas são histórias de diferentes momentos da vida artista do autor, pegando desde sua primeira publicação profissional em 1987 com o conto de estreia Fim de Verão, até o último trabalho curto antes da compilação com O Lugar do Totó, em 2004. A L&PM acerta novamente quando diz que é uma espécie de retrospectiva artista do autor, onde podemos notar seu desenvolvimento tanto quanto desenhista como contador de histórias. O resultado disso é que as primeiras não são tão impressionantes, e as ultimas já apresentam uma maior substância.

No entanto, Fim de Verão como um todo está bem distante do melhor do autor. São histórias esquecíveis e como entretenimento sua única motivação de leitura completa é o fato de se ter gastado com o mangá. Não me atreveria a dizer que é um trabalho ruim, mas virtuoso não é. Situa-se naquela margem que gostamos chamar “mediocridade”, mas que também atende por “tanto fez, tanto faz”. É bonitinho, mas não empolga, não satisfaz plenamente. Aliás, a L&PM já teve tato melhor na escolha de seus títulos de mangá, com o encantador e envolvente Solanin e o atmosférico Aventuras de Menino, podendo vir a se tornar sinônimo de qualidade em publicações, se excluirmos a sua série “clássicos adaptados em mangá”. Então, é sim decepcionante, principalmente por um nome como o de Mohito Kitoh.

Em última reflexão, foi tão comum para eu ler histórias do autor sempre com algum subtexto de ficção cientifica e fantasia, que no inicio estranhei histórias completamente diferentes daquelas ele se tornou conhecido. E posso dizer seguramente que não gostei tanto da experiência, de um modo geral. 

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A edição conta com boa tradução da ótima Drik Sada e fisicamente segue o mesmo padrão de Solanin e Aventuras de Menino, ou seja, é formatinho (10,7 x 17,8), brochura e papel offset. Vem com notas de tradução nos rodapés, referentes há alguns termos, mas não há honoríficos japoneses. 

Avaliação:★★★★★
Editora brasileira: L&PM
Editora original: Shogakukan
Demografia: Shounen
Páginas: 208
Preço de capa: R$ 19,90

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