domingo, 15 de dezembro de 2019

Psycho Pass - 3ª temporada


Saudações do Crítico Nippon!

É com grande prazer que posso constatar como fizeram bem as críticas àquela abominável segunda temporada. Os realizadores claramente nos ouviram. Aliás, me arrisco dizer que esta 3ª temporada é ainda mais madura que a 1ª. Em termos de temas abordados, ritmo disciplinado, animação em si e confiança incondicional no espectador. Não que seja necessariamente melhor (não é), mas qualquer coisa que chegue próximo daquela obra-prima já é um feito admirável.





Em meu texto da 2ª e desnecessaura temporada questionei “Onde estão as novidades desse universo? O que ampliou na nossa percepção daquele mundo? O que não teríamos conhecimento sem a existência dessa temporada? A resposta é um solene... Nada”. Radicalmente diferente, agora o universo de Psycho Pass é fartamente ampliado. Com um Departamento de Segurança Pública parcialmente novo, os personagens antigos que se mantiveram não soam mais insuportáveis ou unidimensionais. Pelo contrário, todos parecem agir com uma seriedade incrivelmente adulta.

E não é pra menos, visto que a trama irá abordar temas incrivelmente atuais e preocupantes. Em primeiro lugar, problemas com imigrantes. “Imigrantes vão nublar nossas matizes”, grita alguém em um discurso que só não posso dizer que é com todas as letras o que ouvimos por aí, pois ainda não temos matizes de psycho pass reais. O anime lida com este tópico de maneira delicada e consciente de sua complexidade, tanto em termos políticos quanto de segurança pública.


Como se não bastasse, este é só o primeiro dos inúmeros temas maduros trazidos à mesa. Em seguida vemos uma cópia do colapso financeiro de 2008, com a ganância dos bancos em créditos subprimes agindo como “vilões”. Contudo, não de maneira ‘preto e branco’ como nas temporadas anteriores, com assassinos e vândalos. Dessa vez a maldade é em tons de cinza, disfarçada de “negócios” e “empréstimos”. Inclusive, safando os responsáveis de ter seu coeficiente alterado. Isso é brilhante.



Como se não bastasse alfinetar assuntos tão complexos, Psycho Pass 3 vai além e coloca na receita um assunto incrivelmente assustador de se lidar hoje em dia: a religião institucionalizada. Com um conceito absolutamente formidável de que a fé purifica a matriz (uhum), os ‘pastores’ buscam criar uma Zona Religiosa Especial. Isso garante a eles uma autonomia política até sobre o Departamento de Segurança Pública (!!!). E há um momento em que durante uma investigação, descobrimos que alguns políticos ligados aos religiosos estão vazando informações para a igreja, prejudicando nossos heróis. Que mesmo com provas suficientes para uma busca e apreensão, ainda enfrentam dificuldades em adentrar o local. Não poderia ser mais real essa trama.

Deste modo, o anime é criativo ao colocar serviços que soam incrivelmente reais como o “Branco Eterno”, que oferece manter o coeficiente do fiel sempre limpo. Na prática, porém, descobrimos que se trata de mantê-los em um estado vegetativo. Mas o que importa é coletar o dinheiro, não é mesmo? Amém.


Além disso, também é explorado o implacável e cruel mundo das Idols, na figura de Komiya Karina. E com um pouco menos de tempo, o dos esportes através de Yakushiji Kosuke.


O anime ainda faz questão de nos lembrar a lógica interna e doentia do Sistema Sibyl, através de inúmeras frases inteligentes. Como por exemplo: “O seu trabalho é proteger pessoas com psycho pass saudável. Pode até ter pena dos fracos [coeficiente sujo], mas não esqueça a missão do Departamento de Segurança Pública”. Uma política elitista e segregadora de proteger a parcela menos necessitada da população, e não o contrário. 

Há um momento em que um Inspetor grita para o protagonista Arata Shindo “É pra isso que os Executores estão aqui!”, se referindo de que a segurança deles é irrelevante, e eles morrerem em serviço é simplesmente o esperado em prol dos seus superiores Inspetores. E o herói responde “Executores são humanos, não escudos”, enriquecendo os dilemas interessantes de uma sociedade adoecida, algo que não era abordado nas temporadas passadas com tanta força.

A animação desta temporada é a melhor de todas, tão ambiciosa quanto os filmes que a antecederam. Acertadamente fazendo muito mais lutas corporais antes de usarem as dominators para imobilizarem os inimigos, são momentos de respiros em tramas tão densas que lidam com mercado imobiliário, políticas e derivados. Aliás, em termos de coreografia, qualquer luta aqui supera aquelas entre Kougami e Makishima (claro que havia um peso emocional enorme naquelas, e inexistente nas de agora).


Os cenários são ricos em detalhes, sempre amplos, como o QG de alguns mafiosos, o salão do aeroporto, arranha-céus, ou mesmo a arena do Hércules e os cenários de ouro da Igreja coberta por uma redoma negra e sombria. A própria composição dos ambientes é inteligente, como o porão dos Executores que segue parecendo um bar improvisado, com mesa de sinuca, camas, caixas empilhadas, como se aqueles moradores fossem temporários. E três temporadas depois sabemos que realmente são. Além disso, a fotografia é inteligente ao enfocar um plano da idol Karina sorrindo, enquanto atrás dela vemos amplas fotografias dela séria e ameaçadora. Também mantém o uso correto das cores, como um bairro em tons de vermelho (perigo) e uma sala roxa (morte).


Finalmente também vemos mafiosos com armas antigas, algo que parecia absurdamente difícil nas temporadas anteriores. E sinceramente faz mais sentido não ser tão difícil assim, a gente sabe o quanto as pessoas amam armas. E há um momento revelador em que a dominator está “sem sinal” em uma zona distante, como se fosse um celular, o que é um acréscimo curioso nas regras deste universo.

A estrutura de 40 minutos por episódio é benéfica, por evitar que sejam obrigados a forçar clímax onde não precisaria. A trama tem tempo para crescer com calma. Contudo, os episódios tem seus momentos irregulares, e o 4º é especialmente embaraçoso a quantidade de lutas e a escala delas (cujos movimentos ágeis dos heróis estão quase no nível Naruto). E o final de Torri, o padre vilão, é resolvido da forma mais anticlimática possível, com a personagem feita de refém simplesmente tirando a arma da mão de Torri e pronto. Como se não bastasse, se inicialmente Kougami e Ginoza despertavam uma expectativa curiosa, aos poucos percebemos que suas participações são completamente aleatórias e ninguém sabe o que fazer com eles. É fanservice puro.


A temporada infelizmente encerra de maneira abrupta, com a promessa de um filme em 2020 para encerrá-la. Infelizmente isso tira muito de sua força, soando quase como uma série cancelada. De qualquer modo, ela se mostrou suficientemente ambiciosa para que eu continue à bordo deste universo maravilhoso e cada vez mais rico e inteligente em sua abordagem. E é sintomático que se tem um universo perfeito para fazer paralelos com o nosso, é este governado pelo Sistema Sibyl. 


(Ano que vem comemoramos os 10 anos do ELBR! E vamos preparar mais surpresas bacanas para os nossos Padrims. Saiba como colaborar aqui: AQUI)

(Para mais dos meus textos, só ir no menu "Crítico Nippon" lá em cima)

Twitter: @PedroSEkman
 


Nenhum comentário :

Postar um comentário

Os comentários deste blog são moderados, então pode demorar alguns minutos até serem aprovados. Deixe seu comentário, ele é um importante feedback.