Saudações
do Crítico Nippon!
É
com grande prazer que posso constatar como fizeram bem as críticas àquela
abominável segunda temporada. Os realizadores claramente nos ouviram. Aliás, me
arrisco dizer que esta 3ª temporada é ainda mais madura que a 1ª. Em termos de
temas abordados, ritmo disciplinado, animação em si e confiança incondicional
no espectador. Não que seja necessariamente melhor (não é), mas qualquer coisa
que chegue próximo daquela obra-prima já é um feito admirável.
Em
meu texto da 2ª e desnecessaura temporada questionei “Onde estão as novidades desse universo? O que ampliou na nossa
percepção daquele mundo? O que não teríamos conhecimento sem a existência dessa
temporada? A resposta é um solene... Nada”. Radicalmente diferente, agora o
universo de Psycho Pass é fartamente ampliado. Com um Departamento de Segurança
Pública parcialmente novo, os personagens antigos que se mantiveram não soam
mais insuportáveis ou unidimensionais. Pelo contrário, todos parecem agir com
uma seriedade incrivelmente adulta.
E
não é pra menos, visto que a trama irá abordar temas incrivelmente atuais e
preocupantes. Em primeiro lugar, problemas com imigrantes. “Imigrantes vão nublar nossas matizes”, grita alguém em um discurso
que só não posso dizer que é com todas as letras o que ouvimos por aí, pois
ainda não temos matizes de psycho pass reais. O anime lida com este tópico de
maneira delicada e consciente de sua complexidade, tanto em termos políticos
quanto de segurança pública.
Como
se não bastasse, este é só o primeiro dos inúmeros temas maduros trazidos à
mesa. Em seguida vemos uma cópia do colapso financeiro de 2008, com a ganância
dos bancos em créditos subprimes agindo como “vilões”. Contudo, não de maneira
‘preto e branco’ como nas temporadas anteriores, com assassinos e vândalos.
Dessa vez a maldade é em tons de cinza, disfarçada de “negócios” e “empréstimos”.
Inclusive, safando os responsáveis de ter seu coeficiente alterado. Isso é
brilhante.
Como
se não bastasse alfinetar assuntos tão complexos, Psycho Pass 3 vai além e
coloca na receita um assunto incrivelmente assustador de se lidar hoje em dia:
a religião institucionalizada. Com um conceito absolutamente formidável de que
a fé purifica a matriz (uhum), os ‘pastores’ buscam criar uma Zona Religiosa
Especial. Isso garante a eles uma autonomia política até sobre o Departamento
de Segurança Pública (!!!). E há um momento em que durante uma investigação,
descobrimos que alguns políticos ligados aos religiosos estão vazando
informações para a igreja, prejudicando nossos heróis. Que mesmo com provas
suficientes para uma busca e apreensão, ainda enfrentam dificuldades em
adentrar o local. Não poderia ser mais real essa trama.
Deste
modo, o anime é criativo ao colocar serviços que soam incrivelmente reais como
o “Branco Eterno”, que oferece manter o coeficiente do fiel sempre limpo. Na
prática, porém, descobrimos que se trata de mantê-los em um estado vegetativo. Mas
o que importa é coletar o dinheiro, não é mesmo? Amém.
Além
disso, também é explorado o implacável e cruel mundo das Idols, na figura de
Komiya Karina. E com um pouco menos de tempo, o dos esportes através de
Yakushiji Kosuke.
O
anime ainda faz questão de nos lembrar a lógica interna e doentia do Sistema
Sibyl, através de inúmeras frases inteligentes. Como por exemplo: “O seu trabalho é proteger pessoas com
psycho pass saudável. Pode até ter pena dos fracos [coeficiente sujo], mas não
esqueça a missão do Departamento de Segurança Pública”. Uma política
elitista e segregadora de proteger a parcela menos necessitada da população, e
não o contrário.
Há
um momento em que um Inspetor grita para o protagonista Arata Shindo “É pra isso que os Executores estão aqui!”,
se referindo de que a segurança deles é irrelevante, e eles morrerem em serviço
é simplesmente o esperado em prol dos seus superiores Inspetores. E o herói
responde “Executores são humanos, não
escudos”, enriquecendo os dilemas
interessantes de uma sociedade adoecida, algo que não era abordado nas
temporadas passadas com tanta força.
A
animação desta temporada é a melhor de todas, tão ambiciosa quanto os filmes que a antecederam. Acertadamente fazendo muito mais lutas corporais antes de
usarem as dominators para imobilizarem os inimigos, são momentos de respiros em
tramas tão densas que lidam com mercado imobiliário, políticas e derivados.
Aliás, em termos de coreografia, qualquer luta aqui supera aquelas entre
Kougami e Makishima (claro que havia um peso emocional enorme naquelas, e
inexistente nas de agora).
Os
cenários são ricos em detalhes, sempre amplos, como o QG de alguns mafiosos, o
salão do aeroporto, arranha-céus, ou mesmo a arena do Hércules e os cenários de
ouro da Igreja coberta por uma redoma negra e sombria. A própria composição dos
ambientes é inteligente, como o porão dos Executores que segue parecendo um bar
improvisado, com mesa de sinuca, camas, caixas empilhadas, como se aqueles
moradores fossem temporários. E três temporadas depois sabemos que realmente
são. Além disso, a fotografia é inteligente ao enfocar um plano da idol Karina
sorrindo, enquanto atrás dela vemos amplas fotografias dela séria e ameaçadora.
Também mantém o uso correto das cores, como um bairro em tons de vermelho
(perigo) e uma sala roxa (morte).
Finalmente
também vemos mafiosos com armas antigas, algo que parecia absurdamente difícil
nas temporadas anteriores. E sinceramente faz mais sentido não ser tão difícil
assim, a gente sabe o quanto as pessoas amam armas. E há um momento revelador
em que a dominator está “sem sinal” em uma zona distante, como se fosse um
celular, o que é um acréscimo curioso nas regras deste universo.
A
estrutura de 40 minutos por episódio é benéfica, por evitar que sejam obrigados
a forçar clímax onde não precisaria. A trama tem tempo para crescer com calma.
Contudo, os episódios tem seus momentos irregulares, e o 4º é especialmente
embaraçoso a quantidade de lutas e a escala delas (cujos movimentos ágeis dos
heróis estão quase no nível Naruto). E o final de Torri, o padre vilão, é
resolvido da forma mais anticlimática possível, com a personagem feita de refém
simplesmente tirando a arma da mão de Torri e pronto. Como se não bastasse, se
inicialmente Kougami e Ginoza despertavam uma expectativa curiosa, aos poucos
percebemos que suas participações são completamente aleatórias e ninguém sabe o
que fazer com eles. É fanservice puro.
A
temporada infelizmente encerra de maneira abrupta, com a promessa de um filme
em 2020 para encerrá-la. Infelizmente isso tira muito de sua força, soando
quase como uma série cancelada. De qualquer modo, ela se mostrou
suficientemente ambiciosa para que eu continue à bordo deste universo
maravilhoso e cada vez mais rico e inteligente em sua abordagem. E é
sintomático que se tem um universo perfeito para fazer paralelos com o nosso, é
este governado pelo Sistema Sibyl.
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