domingo, 24 de novembro de 2019

O Príncipe Dragão - 3ª temporada


Saudações do Crítico Nippon!

Agora é oficial: essa divisão de 9 episódios está prejudicando a série. Claramente forçando decisões e movendo personagens de um canto para outro daquele mundo em uma velocidade surreal, a necessidade de criar clímax de 9 em 9 está sabotando a série. Em Avatar, cada temporada contava com 20, então não havia pressa para chegar nos locais e podiam construir arcos dramáticos com calma. Para construir um final de temporada, é necessário por volta de 3 episódios. Em uma temporada com 9, isso é um monte. Porém, em uma temporada com 20, míseros 3 episódios não são nada. E isso faz toda diferença do mundo. Aqui, em um episódio o personagem está feliz, no seguinte ela nunca esteve tão braba, é um salto rápido demais para gerar conflitos falsos no pouco tempo que eles possuem. Enfim, há muito o que se analisar.


(contém SPOILERS)






Com o início acertadamente focando nos problemas que sobrecarregariam um rei tão jovem como Ezran, temos uma brincadeira interessante com “400 e-mails não lidos”, somado com os vilarejos atacados de seu próprio povo e a insistência de entrarem em guerra contra Xadia.


Do outro lado, Callum e Rayla começam com um ótimo episódio enfrentando um dragão para poderem entrar em Xadia, seja utilizando a razão e argumentos, ou com estratégias e perseguições. E o flashback mostrando como o dragão ficou cego auxilia a entendermos sua raiva para com os humanos e justificar seu comportamento.


As paisagens das terras mágicas, como não poderiam deixar de ser, seguem deslumbrantes, como sempre foram nas temporadas anteriores. Desde a gigantesca árvore logo no início, passando pelo Bosque Prateado dos elfos da lua, até Lux Aurea, a fortaleza dos elfos do sol, grandiosa em seus salões e completamente banhada a ouro. A própria montanha onde vive a mãe dragão é de tirar o fôlego e um dos cenários mais icônicos da série até agora.


Contudo, os elogios não irão muito além disso. Viren, por exemplo, não consegue passar sequer metade da temporada (de 9 episódios!!) na prisão que já dão um jeito de soltá-lo. O jeito, infelizmente, não faz o menor sentido. Menos ainda se levarmos em conta a ideia de um regente até Ezran ficar mais velho, e ao invés de escolher isso, o pequeno rei escolhe... um absurdo completo. Aliás, por que colocaram Ezran na prisão? Não bastava apenas abdicar pacificamente de seus poderes como rei? Enviar uma criança (cujo pai foi assassinado pela incompetência da corte inteira, diga-se de passagem) pra prisão não é algo que, bem, um vilão faria? Nem Claudia vê nada de errado com isso, mesmo recebendo a clemência de Ezran nos primeiros episódios. E por que diabos a corte ainda dá algum crédito a Viren, sendo que todos eles concordaram em prendê-lo após sua rebelião demoníaca no final da temporada anterior. Todos sofreram perda de memória?


Outras adições que não funcionam, como por exemplo o príncipe Kasef, da Neolândia, que poderia ganhar traços de nobreza e ambiguidade, como as temporadas anteriores costumavam fazer. Aqui não, ele é apenas um personagem unidimensional e que termina ainda pior. Outra personagem surpreendentemente estúpida é a Nyx. Nem um pouco inteligente ou forte, o seu plano de sequestrar o dragãozinho Zym é surreal de ineficiente. E o deserto o qual oferece passagem não representa maiores perigos além de (pasmem) cobras. Aliás, Rayla e Callum montados em seus lobos/tigres parecem correr pelo deserto sem qualquer dificuldade, de dia ou de noite, o que torna o drama em torno daquele ambiente completamente vazio e desnecessário. Nyx soa esquecível como aquele pirata cego dos dois olhos da temporada passada (que eu aposto que qualquer um lendo isso nem lembrava).


Aliás, “a mãe dragão está morrendo” é a desculpa mais esfarrapada de todos os tempos e não nos diz nada, visto que a informação não tem qualquer detalhe. Uma semana de atraso para contornar o deserto não parece tanto tempo assim em uma jornada dessas. É um intervalo que eles poderiam facilmente atrasar por qualquer contra tempo que não o deserto (uma tempestade, alguma batalha, alguém capturado como prisioneiro... são tantas possibilidades). Martelar uma urgência vaga dessas é um desrespeito com a inteligência do espectador.

E não para por aí. Ao chegarmos nas runas “Dê seu último suspiro”, é impressionante como os autores não fazem nenhum dos protagonistas descobrirem a charada. O ideal seria o jovem Ezran sozinho, mas ele só resolve o enigma com um dragão-ex-machina. Ou seja, o mérito não é dele. Lembram em Senhor dos Anéis, nas Minas de Moria? No livro, Gandalf revela a charada sozinho. No filme, Frodo descobre sozinho, ressaltando sua inteligência. Era isso que deveria ocorrer, não um dragão surgindo e sumindo da forma mais conveniente possível.


Porém, se o dragão-ex-machina não era o suficiente (mais tarde, sendo usado para resgatar Soren também, pelo visto o dragão não faz mais nada da vida, só fica salvando humanos na escadaria) (e mais tarde ainda, na batalha final, já estamos tão saturados de dragões que eles não causam qualquer empolgação), esperem até ver outro dispositivo preguiçoso que a narrativa usa. O teletransporte-ex-machina. Ezran, após fugir da prisão, alcança os heróis em um episódio. E o hipogrifo Fê Fê morre de cansaço! Como isso é aceitável? Como?! Parar meia hora, uma hora pra descansar não dava? Sério? É uma decisão errada atrás da outra. Mais tarde, Soren faz exatamente o mesmo ao se separar de sua família, chegando onde os heróis estão em minutos. Ah sim, e se anteriormente citei a aparição dos dragões na batalha final, quão hilário é Ezran lançando chamas nos seus próprios conterrâneos de Katolis depois de todo aquele drama pra não entrarem em batalha? Foi a coisa mais hilária que eu já vi, inacreditável de inconcebível que ele estivesse encabeçando um ataque daqueles contra seu próprio povo.


Os personagens praticamente não tiveram qualquer desenvolvimento. Saber que Rayla virou um fantasma para o seu povo é interessante, mas não leva quase a lugar nenhum. Ezran e Callum seguem imutáveis (o potencial desperdiçado de Ezran como rei continua me chocando), exceto por um asas-ex-machina totalmente absurdo na reta final. Ainda que a relação de Callum e Rayla seja melhor que nada, mas a história parece não dar muito tempo pro casal. Assim, Soren é o único que passa por algum tipo de arco. Rejeitado pelo pai, desacreditado pela irmã, o rapaz parece completamente diferente daquele da temporada passada. Inclusive há um momento bem-vindo se desculpando pessoalmente com Callum.


Por outro lado, se antes Viren mantinha um equilíbrio delicado em não ser transformado em um vilão da Disney, auxiliado pela sua relação com os filhos, agora ele é o próprio Jafar enlouquecido. A necessidade da história em fazê-lo envolvido nas mortes e nos dramas familiares de absolutamente todo mundo (até Rayla, sério?!) é um exagero tão forçado que me faltam palavras.



Por outro lado, é um dos flashbacks contados por Jafar-Viren que nos traz um dos momentos mais emocionantes da série até hoje, com a morte de Thunder, pai do príncipe dragão. E perceber como o pai do Zym matou a mãe do Ezran e Callum, e o padrasto deles matou o pai do Zym, mostra a complexidade daquela situação toda. É brilhantemente amarrado como os conflitos entre Avatares e Senhores do Fogo.

Contudo, Xadia parece absolutamente alheia a qualquer guerra, inclusive não vemos qualquer exército. Com exceção dos elfos do sol que não parecem páreo pros 4 reinos humanos juntos. E a urgência dos humanos em invadir suas terras não parece ter qualquer fundamento, exceto Jafar-Viren querendo o príncipe dragão. E os demais líderes, qual a justificativa? Por que estão seguindo Jafar-Viren? O que Xadia fez contra eles? A Nação do Fogo costumava claramente atacar a todos e se vangloriar disso. Xadia (ou mesmo os humanos) não chega nem perto. Exceto aquela meia dúzia de demônios que Jafar-Viren espalhou para forjar um conflito, mas que ninguém jamais menciona aqui.

E se o mago das trevas parece completamente descontrolado, Aaravos é peça fundamental disso. Ele era ameaçador sem dizer uma palavra no espelho, e agora parece amar ouvir o som da própria voz. E sua versão fantasma para não ficar a temporada inteira desaparecido é uma convenção pro espectador, não para Jafar-Viren, que poderia se virar muito bem só com a voz em sua orelha. Dito isso, é um absurdo completo ele dominar a fortaleza inteira dos elfos do sol com uma facilidade imensa e, principalmente, sem seu corpo físico. Isso só torna a derrota de Aaravos para Thunder algo inconcebível tamanho seu poder, e sua permanência na prisão não faz o menor sentido. Aliás, com um único movimento, Aaravos e Jafar destruíram todo potencial de desenvolvimento dos elfos do sol. 



Eu tenho a impressão de que nunca fizeram uma piada que funcionou em O Príncipe Dragão, e eles continuam insistentemente tentando. São constrangedoras em vários momentos, como aquela sobre pintar um cocô (juro). Por outro lado, as sutilezas em referenciar Avatar ainda me cativam. E o dublador de Sokka encontrando um bumerangue é o auge até hoje. Além de outras, sempre muito sutis, como “Sinto muito que tenha que terminar assim” e “Não sente, não” (Zuko e Azula disseram isso). Além de, claro, a voz de Isca que é idêntica ao Appa.


Porém, guardei o maior absurdo e covardia para o final, seguindo a ordem cronológica da temporada, que é o seu clímax. Transformar os soldados de Katolis em zumbis só vai servir para um tentativa patética de eximi-los da culpa. Afinal, estavam possuídos, coitadinhos, não sabiam o que estavam fazendo. Isso é uma covardia imensa. Fazê-los “infectados” tira toda complexidade e responsabilidade das mãos deles. Até porque, dar contornos sombrios e cinzas para personagens “bons” era um dos maiores elogios desta série. E agora todos parecem ter sido imunizados. Como se não bastasse, Claudia enfim cruzou a linha do aceitável nos últimos momentos da temporada, abraçando a vilania completa. E Viren sobreviver pela bilionésima vez mostra uma falta de ideias gritante. Se ele levou míseros 3 episódios pra sair da prisão, imagino que vá levar só mais 3 pra ficar super poderoso novamente.


Assim, é com pesar que encerro este texto sobre o Livro 3 – Sol. E ainda que olhando a temporada de longe, não sinto qualquer tipo de raiva, apenas decepção, pois tenho carinho pelos personagens e aquele universo. Mas foi um tropeço feio, bem feio. Irregular e apostando na ação desenfreada ao invés de apostar no nosso coração e na emoção de reunir o príncipe dragão com sua mãe. Transformaram o momento em um show de horrores e com vínculo emocional que durou míseros segundos. Quando deveria ter sido justamente o contrário, lutas rápidas e grande investimento emocional.

(Agora você pode votar no que quer que a gente escreva; receber fotos dos bastidores; e ainda incentivar o nosso trabalho! Saiba como ser um padrinho ou madrinha: AQUI)

(Para mais dos meus textos, só ir no menu "Crítico Nippon" lá em cima)

Twitter: @PedroSEkman
 


Nenhum comentário :

Postar um comentário

Os comentários deste blog são moderados, então pode demorar alguns minutos até serem aprovados. Deixe seu comentário, ele é um importante feedback.