sexta-feira, 8 de março de 2013

Dia Das Mulheres: Top 03 Mulheres Fortes da Ficção



Vamos recordar de algumas das melhores e mais fortes mulheres dos animes e mangás?

A atenção que eu dou para as comemorações em torno do Dia das Mulheres é equivalente ao meu interesse pelo natal. Obviamente, assim como o Dia do Trabalhador, sua importância é incomparável com qualquer data festiva. Datas que importam unicamente pelo seu simbolismo. Sua importância está no seu passado, não no presente (por isso, dispenso felicitações), um passado de lutas que não podem ser esquecidas, muito menos àquelas pessoas que lutaram e morreram por esta causa. Por que no presente, graças a este movimento, seus direitos não se restringe à uma data, e a batalha é cotidiana. Por isso, ao contrário do controverso post anterior, listei 3 personagens com características similares, que fossem fortes e não se limitassem à arquétipos, aludindo à uma ideia de diferentes mulheres através da linha do tempo.

01) Oscar François de Jarjayes  (“A Rosa de Versalhes”, de Riyoko Ikeda – 1972)

Uma mulher à frente do seu tempo, tal como tantas Hilda’s Furacão, Anitas Garibaldi’s, Xica’s da Silva, ou Chiquinha's Gonzaga – Estas mulheres antológicas que por suas lutas e personalidades fortes, que ousaram não abaixar a cabeça numa época dominada pelo patriarcado, ousaram fazer aquilo que ia contra todas as normas de condutas sociais. Filhas bem criadas preferindo a prostituição, a ter de seguir as normas impostas pela família; de se casar com um pretendente predeterminado? Uma mulher que luta por liberdade e justiça? Mulher negra se casando com uma figura importante da corte? Uma mulher com ideais libertários caiu frisson na alta sociedade conservadora carioca? Óscar, assim como todas essas mulheres reais, ficaram intrínsecas no imaginário popular, apesar de ser a única personagem que de fato nunca existiu, se tornou um ícone tão forte, que conseguiu transcender à personagem. Quem assiste “Rosa de Versalhes”, sem dúvidas nunca verá a Revolução Francesa da mesma forma. Eu tenho certeza que você já deve ter ouvido isso muito, sempre que o assunto é “Rosa de Versalhes”. E sem dúvidas, a autora Riyoko Ikeda conseguiu fazer uma das melhores releituras que você verá sobre a Revolução Francesa. Isto é o que torna sua série, tão ovacionada e influente culturalmente em seu país.

E bem, se você não é capaz de olhar a Revolução Francesa da mesma forma depois de ler “Rosa de Versalhes”, também não é capaz de olhar para a história, sem enxergar lá a figura da Lady Óscar. Ela foi uma personagem tão forte, que se cristalizou, ganhou uma forma real no nosso imaginário. Sou incapaz de ler qualquer fragmento histórico francês e não ver o nome da Óscar, como uma das figuras mais importantes da Revolução Francesa, aquela que foi o braço direito da Marie Antoinette.

 Destaque: Óscar desiste de sua posição como braço direito da Rainha Marie Antoinette e de seu posto de comandante da Guarda Real, após ver e lamentar o estado de pobreza que circulava o reino. O reinado de Marie Antoinette estava em crise, manipulada por políticos corruptos. Óscar ao perceber que vivia numa zona de conforto, servindo de acompanhante para senhores da alta sociedade, sem que de fato estivesse fazendo algo de útil para seu país, ela se integra ao exercito, que se recusa a serem comandados por uma mulher. Óscar que já era uma figura respeitada depois de muito lutar para tal, agora tem um novo desafio pela frente.
Ela é sujeitada às maiores humilhações que um ser humano pode receber, e isto tudo sem polarizar branco x preto, bem x mal, sem se colocar numa abordagem maquinista. Após a revolução começa, e ainda insatisfeita com a corrupção da monarquia, ela se recusa a acabar com os tumultos de protestos em Paris, e então entra para a Tomada da Bastilha (você não faltou a nenhuma aula de história, né?). A trajetória de Óscar sempre será vista da forma mais real possível por quem assiste, como aquela que não se preocupou em esconder o seu gênero, mas se empenhou em ser reconhecida por ser mulher e capaz de exercer funções masculinas.

Curiosidade: A princípio, a personagem de Óscar era para ter sido coadjuvante, no entanto Marie Antoinette acabou sendo eclipsada pela personagem, que se tornou logo de cara incrivelmente popular. Essa mudança de direção da narrativa é perceptível no começo da história.

2) Tenjou Utena (“Garota Revolucionária Utena” *, de Kunihiko Ikuhara – 1997)

Inicialmente Utena cai muito naquele arquétipo de garota tomboy, mas ela é muito mais do que isso, ela faz parte de uma ideia, uma alegoria feminista. O que Utena faz é bater cabeça contra velhos valores do patriarcado, de que mulheres devem respeitar etiquetas pré-estabelecidas. Utena é a força motriz contra todos esses valores arraigados numa sociedade tradicional ao se chocar contra essas normas. No primeiro dia no colégio, a professora a repreende por estar usando shortinho ao invés de saia, a repreende por seu comportamento não ser feminino. Na história, ela é o seu próprio príncipe. E ao receber posse de uma princesa, a Anthy, ela recusa e continua recusando até o fim da série. Ao mesmo tempo em que se porta como sua salvadora, defendendo a sua honra, Utena também lhe estapeia o rosto ao ver que a própria companheira quer se dar para ela como um material, um objeto feito para servir a quem tivesse a sua posse.

Utena luta contra essa ideia de submissão da Anthy durante toda a história. Anty e Utena fazem um contraponto incrível entre a mulher do século 21; independente, que luta pela classe menos favorecida, por seus ideais, que batalha pelo que acredita e se veste da forma como quer, sem que isso signifique deixar de ser mulher, ou de ser digna de respeito. Durante toda a série, você verá este contraste de perspectivas entre Anthy e Utena, e a luta desta para libertar a amiga destas amarras.

Destaque: Anthy é a esposa da rosa, não importa qual seja o seu detentor, ela deve lhe obedecer e agir de acordo com suas vontades. Muitas vezes ela é espancada pelo "príncipe" que a tem como posse, usada meramente como objeto sexual e símbolo de poder. Quando Utena vence o desafio imposto por seu atual "dono", ela passa a ser o príncipe de Anthy, que tenta ser servil para com seu novo detentor. Na primeira noite, Anthy vai morar com Utena e se insinua, tentando lhe arrancar um beijo e fazer amor com ela, já que "essas são as regras". Utena recusa e diz que lhe vê como igual, como uma amiga. Apesar da natureza homoerótica dessa história, ao menos na série de tv, Utena se posta inteiramente como heterossexual. Apesar da imagem de tomboy que passa, ela se mostra como uma mulher que foge de qualquer arquétipo, uma mulher que é forte, mas que nem por isso é impassível de se machucar, de se mostrar frágil, de se apaixonar e cometer diversos deslizes, de ficar com um homem comprometido, de se apaixonar pela imagem de um príncipe encantado e no final levar um chute, ser enganada, traída e alvejada por trás por quem mais confiava. Todos estes fragmentos é que fazem de Utena, mais do um arquétipo, mas uma personagem incrivelmente humana. Ela é a representação da mulher do século 21, aquela que pode se ser melosa, nutrir paixões platônicas por príncipes encantados, ficar com homens comprometidos, e nem por isso deixar de ser uma mulher incrível, um modelo exemplar de feminilidade.

Curiosidade: Utena é o ícone das Garotas Príncipes, inspirado principalmente no mangá “A Princesa e o Cavaleiro” de Osamu Tezuka. Apesar do estilo mahou shoujo*, Utena é uma grande alegoria social sobre ser capaz de construir o seu próprio futuro; esta que é a especialidade de seu criador, Kunihiko Ikuhara*, que mais de dez anos depois, faria outra alegoria social, igualmente incompreensível se visto com um olhar superficial; Mawaru Penguindrum.

03) Kiyoha  (Sakuran “Flores Selvagens”, de Moyoco Anno – 2001)

Ainda criança, Kiyoha foi vendida como ‘kamuro’ (ajudantes de cortesãs de alto nível) para Yoshiwara, o famoso distrito do prazer de Edo, conhecido por suas artistas, cortesãs e prostitutas. Esperava-se que essas garotas, ainda crianças, fossem subindo de nível com o passar da idade e se transformassem em mulheres que trouxessem lucro para a casa. As que falhavam se tornavam serviçais.

Há muitas formas de ser forte. Acima, eu retratei dois exemplos de mulheres; a de séculos passados, à frente do seu tempo que acreditavam poder exercer os mesmos papéis que os homens na sociedade e se envolverem na política, relegando o aprendizado de esposa do lar. E a moderna, que tem seus direitos garantidos, mas ainda precisam lutar para reafirmar seu lugar na sociedade e seu estado independente.

 Mas ainda hoje há mulheres que não conseguem se desvencilhar de padrões sociais pré-estabelecidos. Não conseguem, não querem, não podem.  As mulheres do distrito do prazer se encaixam bem nesta descrição. Kiyoha, apesar de ser mantida acorrentada, sempre manteve seu espirito livre; arredia, questionadora, boca suja e se recusava a se manter delicada e feminina, brigona, tentou várias vezes fugir – Essa sua postura lhe rendeu diversos castigos físicos e danos morais. Teve seu cabelo raspado, foi amarrada, chicoteada, lhe fora negada a possibilidade de viver um grande amor. No entanto, Kiyoha sempre foi muito astuta, sempre encontrava um jeito de contornar as situações (em certo capítulo, ainda que não pudesse entregar sua virgindade – que estava sendo leiloada – ao seu grande amor, encontrou uma forma de que ele fosse o seu primeiro), não permitindo que sua boca seja amordaçada e sua voz silenciada, ainda que isto muitas vezes lhe custasse caro.

A grande característica da personagem é o seu orgulho e espírito forte. Mesmo quando toma a decisão de não ser uma serviçal, e para tanto, resolve se tornar a melhor cortesã de Yoshiwara, ela mantém a cabeça erguida. Ainda que presa, Kiyoha foi capaz de guiar a direção de sua própria vida. Ela representa bem o espírito da mulher que não é completamente livre dos padrões já estabelecidos e enraizados na sociedade, seja por depender financeiramente do marido ou precisar recorrer à prostituição para garantir um futuro melhor, ou mesmo uma condição de vida mais estável.

Destaque: Quando sua única e melhor amiga não consegue suportar a pressão de ter que entregar seu corpo para um homem desconhecido, e se mata. Alguns dias antes, as duas haviam ido a um local afastado da cidade, onde havia um rio. Lá elas choram como bebês, com todo o pulmão. A partir deste ritual, as duas prometem nunca mais chorar, mas aguentar tudo com o nariz erguido e um sorriso na face. Ao se recordar disso, Kiyoha não consegue conter suas lágrimas, então um dos guardiões do Yoshiwara lhe diz: “Se quer chorar, chore agora. Só não chore na frente dos clientes”.

Curiosidade: A ideia de fazer uma história sobre as mulheres de Yoshiwara, surgiu quando o marido da Moyoco, o Hideaki Anno, lhe trouxe um livro histórico retratando o lado cultural da era Edo. Ela ficou fascinada que, Anno lhe instigou a fazer uma história retratado este período. 

Extra:


Inicialmente a minha escolha para o terceiro lugar, era a Yurika, de Sakamichi no Apollon (de Yuki Kodama), que representa bem o padrão de uma mulher moderna, responsável pela casa, mas também independente. Yurika rompe com sua família e com a sociedade ao cortar o cabelo e ir morar sozinha com um sujeito pobre e protestante político, troca os vestidos rodados por uma calça jeans, os chapéus elegantes por laços, os clubes e a vida na alta sociedade, além do seu status social, para batalhar por um futuro melhor para o país, ao lado do homem que escolheu. O seu desfecho no mangá é mais simbólico, ao ser retratada comuma calça jeans e cabelos curtinhos, ali ela representa um novo padrão comportamental feminino que naquela década  começa a se expandir no Japão. No anime, ela é vista de vestido, o que lhe tira muito do contexto.



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