Coloquei Futaba de Ao Haru Ride no divã cor de sangue do ELBR.
Houve um tempo que se dizia "tribos urbanas", não
é mesmo? Agora são círculos sociais. Tribos urbanas pode ser uma terminologia
desatualizada, mas seu significado continua o mesmo, assim como a necessidade
das pessoas de pertencerem a um grupo, ter uma identidade, se sentir
identificado, estar cercado por pessoas, ainda que internamente estejam
sozinhos. Quem nunca se sentiu desoladamente triste e solitário, embora cercado
de pessoas, embora num ambiente agitado? Já senti isso algumas vezes (fato ampliado por ter morado em vários
lugares diferentes), de estar ao lado de bons e agradáveis amigos, mas
sentir que nenhum deles realmente me conhecia, compreendia ou faziam parte do
meu universo particular. É como se sentir um peixinho fora d’água num grupo em
que você não fala a mesma língua dos demais, mas se esforça para se misturar.
Então você sorri, mas no fundo está chorando ou entediado, morrendo de vontade
de voltar para casa.
Os dois primeiros episódios de Ao Haru Ride abordam
basicamente isto, ilustrando essa ideia de um modo mais desconcertante. Futaba era
uma garota muito bonita e fofa, que chamava a atenção dos garotos de sua
escola, despertando o desprezo das outras garotas. Ao passar de ano, ela
resolve mudar completamente. Visual e postura. Corta as longas madeixas e se
torna uma glutona, que numa sociedade tão normativa, acaba por provocar o
desinteresse dos rapazes e então passar despercebida, se dando bem com as
garotas. No fundo, o que Futaba quer é não se sentir solitária, como revelado
no episódio 2. Nem que para isto precisasse forjar a si mesma. Compreensível. Soa
inusitado e talvez surreal que garotas bonitas e meigas despertem antipatia
porque é difícil para a mente aceitar que uma pessoa que se veste bem e é
visualmente atraente, possa ser renegada pela sociedade. Mas não é que acontece
mesmo? Inclusive, pessoas com um grau de beleza muito alto tendem a não ser
consideradas inteligentes ou aptas a exercer atividades que demandam destreza
intelectual.
Não vou negar. Meu sangue ficou pipocando quando li a
sinopse e ferveu completamente no primeiro episódio. Como uma pessoa pode ser
tão estupida ao ponto de se anular para ser aceita? É. Eu sei que acontece
muito, a todo o momento, e que é natural. Mesmo assim, é algo difícil para eu
aceitar, não vejo razão para viver negando o que sou. Pode acontecer e acontece
de eu não me identificar totalmente com o meu grupo, mas eu continuo sendo o
que sou e francamente pouco disposta a mudar isso seja por quem for, e me
aceitam assim. Ou não. Demorei pra aprender isto, amadurecer. Durante uma parte
da adolescência não gostava de mim mesma, tentava me enquadrar no consenso
comum para permanecer conectada aos demais, porque sentia que era o certo. Mas
depois você aprende que o mundo é feito por diversas perspectivas, não havendo
uma verdade absoluta para nada e que fantasias só se sustentam por uma fração
de segundos, pois a fachada não se sustenta internamente.
Embora não seja um desenvolvimento muito profundo, é bem trabalhado [principalmente no fato das amigas não serem pintadas como vilãs maquiavélicas, mas ambíguas] e bom de ver Futaba aprendendo no episódio 2 que castelos construídos sobre a
areia não resistem nem à primeira e simples maré que surgir. Amizade é aceitar
e gostar do outro, mesmo que ele tenha um gosto diferente do seu, se vista e
pense diferente de você. Eu por exemplo, tenho o dom de atrair pessoas
completamente diferentes de mim. Um olhar pela janela e podemos ver diversos círculos de diferentes camadas de relacionamento; os amigos de balada, os que compartilham algumas horas do dia com você no trabalho, na escola ou algo assim, enfim, é a necessidade do ser humano de se relacionar mesmo que numa esfera superficial.
Claro que não é fácil se reafirmar perante os demais. Cada
um sabe o peso da cruz que carrega. Há quem não suporte se ver fisicamente só. Roupas,
estilos musicais, grupinho de amigos com interesses em comum, e etc., são todas
formas de se conectar a outras pessoas e formarem um vinculo. Uma história
fundamental para quem curte a temática é The Invisibles (os Invisíveis, de Grant Morrison), que fala sobre personagens desajustados
socialmente com sua narrativa lisérgica. É sobre identidade e como ela pode
influenciar opiniões. No fim é algo que não dá para se fugir, mas desde que se
sinta bem consigo mesmo, parece que tudo segue bem.
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