Um texto um tanto redundante, no entanto um capricho que não pude resistir.
Prova Diabólica (Probatio
Diabolica ou Devil’s Proof) é o título do terceiro episódio de Psycho-Pass 2, e como não encontrei espaço no texto para comentar sobre isso sem destoar
do tom que ele tomou por conta própria (além
de ter ficado bem grandinho – ah, às vezes é bom quando vamos escrevendo e
o texto ganha vontade própria), vou fazer isto aqui. Que melhor espaço há
para comentar aleatoriedades do que um post aleatório? Fiquei me pinicando
porque o titulo faz uma excelente relação com a incógnita do episódio e da
própria série.
A segunda temporada surge com a mesma estrutura da anterior,
com vários “vilões do dia”, num estilo procedural/stand alone, mas é estabelecida
de imediato sua conexão com algo muito maior e misterioso, cada caso deste é
uma pista nova que a inspetora Akane soma ao seu tabuleiro, uma indução que a
levará a uma possível dedução – falando em termos detetivescos. Por exemplo, no
primeiro episódio ela descobre a possibilidade de existir alguém “invisível” ao
Sistema Sibila; no segundo, ela tem dúvidas da existência do misterioso
“fantasma” e desconhece o significado da mensagem “W.C.”, mas intui que há uma
conexão entre o desaparecimento da Inspetora Shisui, o “fantasma” e a mensagem,
e ela só consegue deduzir que de fato há uma conexão entre estes 3 elementos
através da indução do “vilão do dia”; e mesmo que ela tenha descoberto que WC
= What Colour [are you]?, Akane não sabe o que isto quer dizer e muito menos é
possível a existência de alguém como Kamui (ao
final do episódio 3 se introduz um novo vilão descartável, que a certamente à
levará a dar um passo seguinte).
Como puderam notar, no episódio 3 ela não avança muito na
investigação, mas determina um importante ponto de partida. E é neste ponto que
reside a desconexão paradoxal. O que há de tão bacana no título deste episódio
é a forma como ele se relaciona tão organicamente em como tudo é conduzido, da
abertura aos eventos que se sucedem. A nova abertura é caótica e
desestabilizada e no episódio Akane se vê num paradoxo; uma cama de gato. Probatio
Diabolica (ou Prova Negativa) é uma
expressão utilizada para designar a exigência de se conseguir uma prova
impossível ou dificílima de ser obtida. Para provar que o diabo existe, o diabo
só precisa ser encontrado e levado perante o público. No entanto, para provar
que o diabo não existe, a pessoa terá de procurar em cada confins da Terra, um
feito inatingível, antes que ele possa concluir e provar que o diabo não
existe. Neste caso, é impossível determinar a ausência de algo sendo que não há
maneira de provar isso dentro das limitações humanas.
Ou seja, nenhum meio de prova possível é capaz de permitir
tal demonstração. É normalmente um termo utilizado no meio jurídico, contudo também
se pode encontrar em narrativas policiais. O melhor momento do episódio que
expõe a vulnerabilidade da dedução de Akane em relação à existência de uma
entidade invisível aos olhos do Sibila – algo que para aquele mundo soa tão estapafúrdio
quanto a possibilidade de existir magia no nosso mundo – é quando os
justiceiros e sua colega Inspetora não conseguem encontrar nenhuma prova de que
seu apartamento fora invadido, levando-os a considerar que ela mesma pudesse
ter escrito o “W.C.” na sua parede por estar fissurada com o caso. Tougane é
quem expõe o principio da Probatio Diabolica; Akane não consegue provar que diz
a verdade, mas eles igualmente não podem provar que ela mente. Nas suas palavras “é
impossível alguém ter invadido, mas também não há motivos para pensar que a Inspetora
enlouqueceu. Então de acordo com todas as evidências, estamos diante de dois
cenários impossíveis”. Ele então conclui de que se ambas as sentenças
são impossíveis de se provar, a obrigação deles é dar o beneficio da duvida à
Akane, acreditando nela. O roteirista Jun Kumagai descreveu de forma simples e acessível
em que se constitui basicamente a Probatio Diabolica. Perante uma situação
impossível de se provar, o beneficio da dúvida fica com a pessoa que afirmou o
fato (afinal, se alguém diz que existem
alienígenas, mas não pode fornecer uma prova irrefutável, você igualmente não
provar para esta pessoa sua não existência).
O conceito de Probatio Diabolica é notavelmente utilizado em
Umineko no Naku Koro ni (não no anime,
porque eles omitem tanto a Hempel Ravens quanto a Probatio Diabolica) pelo
protagonista nos casos de assassinatos e de quartos fechados (um recurso utilizado na ficção policial).
No meio legal, a Probatio Diabolica possui alguns relativismos, obviamente uma
pessoa pode utilizar de má fé para se favorecer. Falando de modo simplificado,
Umineko gira em torno de um duelo entre bruxas e humanos ante a necessidade de
provar a inexistência de magia e de um modo bem amplo esse relativismo é
abordado na série, onde o protagonista tenta tirar vantagem da Prova Diabólica e é retorquido por outro paradoxo [o Hempel Ravens], mas, este não é um post para falar sobre Umineko... então deixemos a coisa assim.
Na série original de Umineko, uma das personagens sentencia; “Se
eu clamar que o diabo existe, apenas preciso trazê-lo aqui e lhe mostrar. Mas
se você clamar que ele não existe, não é possível provar isso pois é impossível
você me mostrar o que não existe”. Bem, o mistério que envolve essa
nova trama de Psycho-Pass não é tão abrangente enquanto mistério detetivesco como Umineko, não obstante, ainda assim te coloca numa situação similar a de
Akane em que você pode criar mil teorias para tentar estabelecer a lógica por
trás da existência de uma pessoa invisível ao sistema, uma vez que a certeza de
sua existência já está estabelecida para a protagonista e para o expectado, cabe
então a necessidade de provar sua existência para os demais. Devemos apreciar o
esforço de um roteiro em nos entregar uma narrativa que coloca sua protagonista
numa situação paradoxal e conflitiva onde precisa provar a existência de algo
que não existe. Não apenas isso, também instiga o expectador a pensar e querer
chegar à dedução antes da própria protagonista à resposta de como é possível a
existência de uma entidade invisível aos olhos de todos [e se divertir no
processo, é claro]. Mágica? De certo Psycho-Pass não é uma série de alta
fantasia, portanto, não é uma solução válida.
“O fato de que algo é falso não nega a sua existência” – Kirito
Kamui
Descobrir o método e as razões do culpado para torna-lo
visível novamente é o passo seguinte, porém seremos capazes de descobrir estas
razões antes da Akane, mesmo que tenhamos acesso a mais informações que ela? Eu
penso que independente disto, uma série original que consegue despertar o
expectador passivo e os por para discutir possibilidades é sempre algo
divertido de se acompanhar.
Curta o Elfen Lied Brasil no Facebook
e nos Siga no Twitter