segunda-feira, 31 de outubro de 2016

All You Need is Kill (2014)

Saudações do Crítico Nippon!

Já assisti diversos filmes com loop temporal, desde Feitiço do Tempo, Source Code, ARQ, ou mesmo os ótimos terror Triângulo do Medo e Crimes Temporais, inclusive a adaptação desta obra, No Limite do Amanhã. E vi todos eles antes deste mangá (que também é uma adaptação do original de Hiroshi Sakurazaka), e assim mesmo, a força desta obra é inegável. Combinando a escrita minuciosa de Ryuosuke Takeuchi e o mestre dos magos do desenho, Takeshi Obata (Death Note, Bakuman), a história ainda se mostra extremamente envolvente e frenética, com um desenvolvimento sempre interessante e um final muito mais coerente que sua covarde adaptação.
(sem spoilers)

A obra conta a história de Keiji Kiriya, um soldado que, após morrer em sua primeira batalha contra uma raça alienígena chamada Mimetizadores, acorda um dia antes do ocorrido. Assim, se vê preso em um loop temporal que o fará viver o mesmo dia inúmeras vezes, permitindo que aprimore suas habilidades com o passar dos confrontos.

Com uma estrutura interessante por natureza, Takeuchi conduz a história com uma fluidez impressionante, aproveitando para desenvolver o protagonista com eficiência ao obrigá-lo a encarar as mesmas situações. E o desespero inicial crescente com a situação torna Keiji muito mais humano. Aliás, o seu desgaste físico e mental é ilustrado em ondas, mesclando entre o empolgante e o puramente exaustivo. A própria contagem que ele faz na mão, a dor de cabeça com o passar dos loops, o enjoo de comer sempre a mesma comida, são detalhes que vão ajudando no incômodo do leitor. 











Um dos prazeres de acompanhar essa história, reside na habilidade de seu autor de explorar aquele “poder” com cuidado, apresentando situações novas para o leitor, mas que o protagonista já tinha vivido. Por exemplo: os momentos no refeitório; a maneira com que invade o prédio da mecânica, sabendo todos os passos dos seguranças; etc. E apesar do roteiro, às vezes, ser didático demais em suas explicações (como uma página para colocar a programação completa do dia), são rápidas suficientes para não incomodar. Inclusive, os esperados fan service, como a já citada clichê da jovem  mecânica bonita (obviamente sempre agarrada a uma chave inglesa), e a peituda cozinheira, soam camufladas e breves suficientes no contexto.



Com uma arte absolutamente espetacular de Takeshi Obata (um dos meus desenhistas favoritos em atividade), como ele mesmo já disse em entrevistas, busca fazer quadros ricos e críveis, porém sem soarem pesados e poluídos. Percebam a complexidade e leveza de seus cenários, bem como os quadros largos que dão respiro e uma dimensão espacial mais clara. Exemplos como aquele do treinador caído com uma polaroid presa em seu capacete; ou aquele em que a página é dividida entre duas viseiras contrastantes, a de Keiji e de Rita. E se geralmente tentam fazer esses protagonistas sempre com olhares forçadamente vazios, de baixo pra cima, envolto em sombras, aqui ao menos o artista encontra a justificativa perfeita nos loops. A repetição que deixa Keiji cada vez mais fatigado e acostumado com sangue e sentimento de superioridade por prever os movimentos alheios. Combine essas características com o que já vimos das expressões de puro deleite de Light Yagami, e teremos um personagem fascinante diante de nossos olhos. 
















Assim, chegamos a personagem de Rita Vrataski, que ciente do que está ocorrendo com o protagonista, ganha um desenvolvimento surpreendentemente nada misógino em comparação com o que estamos acostumados do Japão. Conseguindo o milagre de não torná-la um estereótipo de durona nem de kawaii, ela encontra o equilíbrio perfeito transitando entre essas duas. E seu desgaste pessoal é explorado de uma forma diferenciada de Keiji, indo para o lado mais melancólico e contemplativo, um acerto cuidadoso para não vermos repetidamente a mesma coisa. E, claro, demonstrando a diferença entre homens e mulheres. Assim, os melhores momentos do mangá são quando Rita e Keiji estão juntos em quadro. É tocante perceber como, apesar de psicologicamente corrompidos por aqueles loops, ainda lhes restam humanidade, buscando naquele fiapo de relação algo que há muito perderam com o resto do mundo. Tornando, assim, a necessidade de não reiniciar o dia muito mais que uma questão de sobrevivência, mas de preservar aquelas lindas memórias que estão construindo juntos.











O mangá culmina em um clímax corajoso, empolgante e triste, que nos leva à mesma confusão interna de seu protagonista. E histórias envolventes como essa nos fazem desejar que tivesse continuado por mais alguns volumes. O que, obviamente, tiraria parte da urgência e colocaria ainda mais fan service. All You Need is Kill se mostra especial justamente pela finitude rápida, compensando em uma história cativante, personagens complexos e um desenho absolutamente deslumbrante. 











(Para mais dos meus textos, é só ir no menu "Crítico Nippon")
Twitter: @PedroSEkman

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