Por Carlos Dalla Corte
Kuzu é um anime curioso. Por muitos citado apenas como um NTR de ode ao ódio, de natureza doentia e perversa, a obra tem, nesta pequena amostra revelada até aqui, sido muito mais complexa e reflexiva sobre diversas temáticas adolescentes e até universais do que parecem julgar velhos familiarizados com a obra.
A relação de Mugi e Hanabi, de primeira visão disposta como algo robótico e vazio, um a usar o outro como afago de carência, substituto sugestivamente físico para um parceiro (a) inalcançável – e é só ver como chamam um ao outro por nomes diferentes para deixar bem claro como queriam outra figura a dividir a cama consigo para chegar nesta interpretação –, parece tornar-se mais complicada a cada encontro.
Conforme o roteiro dispõe de tempo para desenvolver os habitantes do universo do anime, as relações e minúcias da psique revelam camadas que carregam a trama de substância e assuntos de debate. Será que Mugi e o rapaz se veem apenas como cascas que podem recorrer em momentos fortuitos? Ao menos no que tange à garota, parece que não – em contrapartida, o menino, devido ao que fora mostrado no flashback, parece estar mais calejado com a situação.
É conhecida uma velha história, remetida usualmente ao filósofo francês Jean Buridan, sobre um asno que, equidistante a um fardo de palha e uma vasilha com água, encontra seu fim na incapacidade de decidir qual opção tomar. Alegoria com fins óbvios, ainda assim serve perfeitamente para encaixarmos aqui, no paradoxo – verdadeiro dilema – que nossa protagonista parece seguir. Suas frequentes introspecções sugerem, se não afirmam, se não um crescente desejo por Mugi, um desejo por gostar do rapaz e deixar as coisas mais simples para si.
Não há resposta ideal para a profusão de questões que ela levanta sobre si mesma, até porque isso reflete bem a intempestiva e atordoante mente adolescente que floreia em seu âmago. Como vemos quase tudo por si, estamos tão perdidos quanto ela. Muito além de uma jovem suja e interesseira, ela está devidamente extraviada na torrente de anseios e receios que lhe tomam conta. E isso não é exclusivo de si, é claro. Pode parecer conveniente – na verdade o é –, mas como o anime aborda sua temática centrada em uma miríade limitada de personagens, é compreensível que, basicamente todos mostrados até aqui, em suas indecisões mentais, afetem as ações justamente da garota. De sua ruiva amiga à professora, a relação entre amor e sexo ainda é um enigma indecifrável e distante, e este enigma tende a ganhar ainda mais ramificações pela frente.
Carlos escreve sobre idols em seu blog Delirios da Madrugada. Acesse suas críticas dos episódios 01 e 02 no IntoXi.