Um episódio que me deixou de boca aberta.
Tá, não teve o mesmo impacto que Shingeki no Kyojin ressoou
em mim. Mas de alguma forma essa premissa parecia tão vazia e não havia uma
base sólida para se apoiar em qualquer argumento além de “é o novo anime do Urobuchi”, que devo dizer que terminei o
episódio com a sensação de que fui surpreendida. E... Empolgada pelo que pode
vir a seguir.
Sendo este apenas o terceiro projeto (os outros são o esquecido Blassreiter de 2008, o popular Madoka Mágica de 2011, e o polarizado Psycho-Pass de 2012) desenvolvido por
Urobuchi exclusivamente para a Tv, como argumentista ou apenas compositor de
cenário e enredo para estas mídias (a
bem da verdade, todas essas três séries que ele escreveu, o argumento partiu
diretamente de seus diretores, com ele criando todo o cenário e o escrevendo),
parece que ele ainda tem muitas ideias para mostrar. Dessa vez é um anime
mecha, uma temática com o qual ele já trabalhou diversas vezes antes. Demonbane (que, aliás, também teve uma
adaptação para anime, e assim como tudo que fora adaptado de suas visual novels
para tv antes de Madoka, está no puro ostracismo) e Zoku Satsuriku no Django talvez sejam suas séries que mais se aproxima do conceito de Suisei no
Gargantia, por causa dos elementos explícitos dos Mitos de Cthulhu e a ameaça
vindo do espaço.
Os primeiros 11 minutos do anime já são blo cartão de
visitas, com todas aquelas formas abstratas de organismos vivos e caracóis mutantes.
Para o meu pesar, a volta destes elementos só deve acontecer quando o anime
chegar próximo ao seu momento crítico, marcando uma possível ruptura de status quo alcançado por Red. Isso me
lembra o enredo de ‘The Vision of Escaflowne’, um “clássico” do estúdio Sunrise esquecido nas
sombras de Evangelion (alguns dizem que
só se deu mal por ter surgido depois de Eva, sendo eclipsado por ele devido às
comparações, mais no sentido de rivalidade do que de conteúdo. São duas obras
distintas). Na época este conceito de personagem X vai parar em uma
realidade alternativa [ou qualquer
besteira similar] e neste lugar ele irá amadurecer e aprender o valor da
vida, assim como também se tornando uma peça chave para a sobrevivência daquele
mundo frente alguma ameaça, era um clichê constantemente em pauta. Acredito que
Gargantia irá seguir o mesmo modelo de coming of age (quando um personagem cresce dentro do enredo, amadurecendo à medida
que a trama progride) de Escaflowne, sendo algo menos pautado em slice of
life, e se concentrando mais no desbravamento daquele mundo, as dificuldades de
integração com a nova cultura e seu povo, e claro, com pitadas humor, romance,
aventura e perigos.
Tudo isso culminando num desfecho intenso onde o visitante
terá papel fundamental para salvar aquele mundo. Obviamente a Aliança Galáctica
se tornará uma ameaça, letal ou não, àquele modo de vida. O porquê é o grande
segredo. Em Escaflowne, a heroína acaba indo parar em um momento crucial [quando estava prestes a competir em uma
corrida] num mundo que apesar de primitivo, possui tecnologia moderna e
mechas de combate. Só que diferente de Gargantia, não trabalha o aspecto Sci-Fi
e sim a fantasia, mesmo os mechas são ativados com elementos mágicos. E isto é
o mais interessante até então em Gargantia, sua SF (Science Fiction) é muito promissora. A construção de seu universo,
a interação de seus personagens com a tecnologia e até mesmo a barreira linguística,
tornam a narrativa e a mecânica daquele mundo muito mais rica.
A construção do
Universo
A primeira parte da série em seus 11 minutos iniciais é o
ponto mais polarizado dessa estreia. Admiradores do gênero mecha certamente saíram
decepcionados, pois eles são feios, seu design não foi projetado para
combates corpo à corpo, embora como simples dispositivos eles pareçam ser bem
dinâmicos, ao contrário das sucatas do Doc (*rindo desgraçadamente aqui*). Abundancia de 3DCG nas formas de
vida no espaço, o terror do fãs do gênero. Há abundância de Pew Pew e muitos
lasers, mas a ação é muito condensada e o embate entre naves espaciais e espécies
alienígenas, denominadas Hideauze, não é particularmente emocionante por a
direção optar mostrar e explorar bem pouco deste conflito, além de o pouco que
foi mostrado ter se tornado poluição
visual.
Quem esperava encontrar em Gargantia uma genuína série de
mecha, ouso a dizer que irá se decepcionar. Está longe disso, o argumento do
diretor Kazuya Murata e a composição de roteiro do Butcher dão dicas de que
irão se distanciar ainda mais deste conceito. Quando o único mecha ofensivo ao
alcance dos olhos é basicamente uma IA (Inteligência
Artificial) ao melhor estilo HAL 9000 e de tamanho compacto, não há o que
esperar em termos de batalha.
Pelo contrário, é a consequência da batalha que mal vemos
que realmente se torna importante aqui, se tornando uma exposição necessária
para ambientar Red ao novo mundo para o qual ele iria parar. É através deste
conflito atmosférico e verbal que manteremos um link com Red e sua essência que
irá chocar com a nova cultura [claro que
a direção da série irá retomar este prologo, a conflito irá se estender e as
coisas ficarão tensas, mas até que isso aconteça muita água deverá rolar por
baixo a ponto nestes 13 episódios que a série terá ao todo], prometendo um
clímax mais intenso.
Ao invés de visualmente uma bela batalha, Butcher oferece a
moda da casa; muitos diálogos, como costumeiro, com a diferença que dessa vez temos
um bom diretor para fazer com que estes diálogos soem naturais em termos de
audiovisual, sem soar estruturalmente texto de visual e light novel. Apesar de
que certamente você não irá lembrar com detalhes de tudo o que foi dito, a estrutura
daquele mundo fica marcada no subconsciente. Você sabe que provavelmente Red
vive numa ambiente utópico, opressor e altamente militarizado e que isso
tornará sua convivência em Gargantia algo complicada.
Que a humanidade precisou ir para as estrelas e que na terra a água tomou
conta. Estamos diante de trabalho de direção extremamente eficaz, que se
mostrará mais evidente na segunda parte do episódio.
Tecnologia
IA, robôs utilizados como dispositivos, sociedade construída
em cima de encouraçados lindamente projetados, e provavelmente a série ainda se
pautará demasiadamente na mecânica tecnológica. Se prepare, porque se em
Pyscho-Pass o Butcher nos mostra sua paixão pela literatura, em Gargantia tem
tudo para ser SF. O choque contrastante de tecnologias implícito na ideia de população
primitiva vivendo em encouraçados marítimos e aqueles que vivem em naves estelares
é algo que se mostra muito promissor. Ambos vivem explorando o que sobrou de
vida no universo e vivem a procura de novas fontes de energia e preciosidades.
É um argumento meio cínico ao emparelhar seres humanos avançados e primitivos,
contrastando-os, e, no entanto, ambos se encontram em situações similares.
Se pessoas vivendo em enormes encouraçados já é algo
fascinante, principalmente se a narrativa decidir explorar isto a fundo, a
visão do espaço é igualmente belo em todos os seus tons abstratos, com
coloração destoante e intensa, além de visualmente alucinógena. Não é um consenso,
mas a escolha deste estilo de arte para representar um universo avançado
tecnologicamente, oprimido pela extinção eminente e pela perda de recursos
naturais, construindo em torno de si uma sociedade utópica, contextualmente é algo
muito bom – no entanto fosse qualquer outro compondo este roteiro,
provavelmente abriria mão dos elementos místicos (e é por isso que eu adoro o tio Butcher). Eu, ledamente me enganei que
Gargantia traria um Urobuchi distante de suas origens, ao me deparar com deuses
Cthulhu psicodélicos azucrinando a humanidade no seu habitat natural.
Visualmente foi uma experiência fantástica, e mesmo o 3DCG odiado e repugnado,
se acentuou perfeitamente nesta atmosfera.
Buracos de minhoca, manipulação de tempo e espaço,
sociedades utópicas vivendo em situações limites, humor lateral, espécies
superiores, mechas, linha narrativa focada em SF; mais Butcher que isso,
impossível. Em tempos de muito technobabble (basicamente conceitos Sci-Fi jogados na tela sem argumentos solidificados
pela narrativa, algo como a estrutura de Psycho-Pass), Suisei no gargantilha
consegue se estruturar concisamente sem grandes dificuldades.
Personagens
O tom dessa vez é menos crítico, menos obscuro, e mais
aventureiro e coloridamente divertido, mas não é tão diferente do que se vê em
Zoku Satsuriku no Django, inclusive o tom fetichista com relação às mulheres e
o roteiro meio testosteronico, meio
pulsante de energia, uma possível tensão sexual e meio atrapalhado ao mesmo
tempo, com uma linha de cinismo ao fundo, deverá se destacar aqui.
Sem em Psycho-Pass a escolha do character designer a partir
do conceito estabelecido pela Akira Amano já denunciava em como a narrativa
seria generosa com as fujoshis, dessa vez ser o autor Hanaharu Naruko, conhecido por suas contribuições fetichistas para o comiket, dá o tom
pelo qual a narrativa irá seguir. E então teremos...
Isso...
Isso...
Isso...
E muito mais, claro. É um character designer que é simples,
ressaltando o apelo sexual e delicadamente meigo nas garotas com traços
redondos e filtros que a deixam com um brilho de bebê e um blush apimentado.
Nos homens o traço é mais virial e menos polido, com a exceção de Red, seu
bishounen em bodyhugging spacesuit coladinho. Red conseguiu deixar uma boa
impressão em mim.
Amy, apesar de bem típica, demonstrou ser uma personagem
vibrante e simpática, esperemos que nasça entre os dois uma boa química. Os de
fundo também me pareçam interessantes. Algo muito interessante é a forma como
foi tratada a barreira linguística entre os personagens. Ao que tudo indica,
será logo resolvido, mas é um detalhe nem sempre abordado que torna a escrita
com essa temática mais rica.
Em suma
Suisei no Gargantia impressiona pelo visual fantástico,
animação fluída e envolvente, cortesia da penca de produtoras com verba pra
injetar, encabeçado principalmente pela gigante Bandai. Com isso, bons e
variados desenhos de personagens, e mais sequência fluidas de ação, compõe este
visual, que só deve ficar atrás da produção mecha do Sunrise, Kakumeiki
Valvrave. Há as decisões tomadas que dividiram e ainda vão dividir parte da
audiência da série, mas temos um primeiro episódio bem executado no que se
propôs.
Enfim, terminei o episódio com o coração palpitando de
ansiedade, por, principalmente o cenário que veremos daqui pra frente (a segunda parte do anime), ter se
desenvolvido tão bem. Kazuya Murata executou muito bem essa premissa e ao
permitir que a trama da primeira parte girasse estritamente em torno de Red,
sua percepção e conflitos, tornou-o um elemento interessante com promessa de
bons frutos. Espero não ter minhas expectativas traídas.
Avaliação: ★ ★ ★ ★ ★
Avaliação: ★ ★ ★ ★ ★
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Curiosidade: Me passaram o link de um tweet do Butcher, e neste tweet ele comenta o quão contente está por ter sua série estreando no mesmo dia (domingo) em que ia ao ar a estreia de Yamato 2199, ao qual ele considerava o primeiro anime SF. Curiosa que sou, fiquei como a Chitanda, pensando nisso porque Yamato não é o primeiro anime de ficção cientifica do Japão. Pesquisando, entendi que muitos críticos e nerds (os verdadeiros), costumam fazer uma diferenciação para Sci-Fi (SF) e Science Fiction. Este termo especifico já se encontra bem démodé, mas basicamente o primeiro seria Beam Spam e Pew Pew (batalha com lasers/tiros pra todo lado), e o segundo um vasto universo cientifico imaginado e explorado pelo autor, tipo Shinsekai Yori.
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