O ponto alto do Anime Mirai 2013.
Sinopse: Onde é
este lugar ou o que ele é? Temo não poder responder estas perguntas. Deixarei
que vocês dois comecem o seu jogo, um jogo que coloca suas próprias vidas em
perigo. Até que ele acabe, vocês não podem sair.
Há um tempo atrás o Madhouse era o meu estúdio de animes
preferido. O Maruyama Masao tinha a ideologia de fazer aquilo que todos
poderiam fazer se quisessem, mas ninguém fazia. Com isso, diversas produções
autorais que dificilmente receberiam sinal verde em outros estúdios, se
tornaram realidades – O melhor de Masaaki Yuasa e Satoshi Kon, dois
brilhantes diretores e péssimos vendedores, foi no Madhouse.
Hoje o estúdio não é mais o mesmo (Yuasa agora flerta com o Production I.G. onde já trabalhou, mas nem lá
conseguiu financiamento para seu novo projeto. Outro conhecido no estúdio,
Tetsuro Araki, agora dirige Attack on Titan num dos vários estúdios do
Production I.G.), nem o Maruyama Masao se encontra mais em sua direção, no
entanto deixou um legado impressionante de obras que mexem com o psicológico, te
fazem arrepiar na frente do monitor e ficar pensando naquilo por mais algum
tempo depois que fecha o play.
Madhouse é a casa de alguns dos melhores thrillers
psicológicos de esportes já animados – Akagi, Kaiji e One Outs.
Assistir Death Billiards foi uma boa experiência, um retorno
às produções com alto requinte visual, paletas de cores escuras, roteiros
inventivos onde máquinas de Pachinko se tornam assustadoras e ponto de partida
para uma trama repleta de suspense. Só que dessa vez, esta obra só foi possível
graças ao financiamento do projeto Anime Mirai (já comentado aqui no ELBR, no texto de Little Witch Academia), que
banca com quase 500 mil dólares um episódio por volta de 25 minutos, para que
jovens animadores tenham a chance de mostrar o seu talento como animadores e
diretores de uma série de anime. Também é uma grande vitrine de talentos, para
que o trabalho desses artistas se torne mais conhecido entre produtores.
Death Billiards (‘Bilhar
da Morte’ – Bilhar é o nome genérico que se dá para vários jogos de mesa que
utilizam tacos e bolas. A sinuca é um desses jogos de mesa, e o escolhido para
os personagens jogar) é o segundo projeto mais aguardado do Anima Mirai,
logo atrás de Little Witch, com argumento, roteiro, direção e storyboard de YuzuruTachikawa. Assim como Kaiji, se trata de mais uma variante de jogos de
sobrevivência, tendo o esporte como catalizador da ação e reação.
Dois homens sem memórias de como foram parar num sofisticado
e luxuoso bar chamado Queen Decim, degustam um uísque quando são abordados pelo
polido barman e pela charmosa hostess, que a partir daquele momento eles
teriam de participar de um jogo como se suas vidas dependessem disso. Sem
alternativa, ou seriam transformados em manequins, o jogo escolhido é o
bilhar, e a modalidade a sinuca, onde cada uma das 8 bolas representa um ponto
vital do adversário.
Começa aí uma montanha russa emocional e psicológica em que
nos vemos absorvidos por um roteiro instigante, que em 25 minutos e 15 segundos
desfragmenta sua história apresentando uma cadeia em reação alucinante a partir
do momento em que os dois personagens percebem que este jogo pode significar as
suas vidas, mas nenhuma resposta nos é data além da especulação dos próprios personagens.
Ainda que ninguém tenha dito que o jogo decidiria a vida deles, o simples fato
de as bolas representarem seus órgãos acaba acendendo em um dos personagens uma
espiral de desespero e tormento psicológico ao perceber que não sentia mais o
batimento do seu coração após a bola referente fora encaçapada. Isso
desencadeia a sequência mais fantástica deste OVA em termos de emoção
dramática, tensão psicológica, apreensão, e claro, um momento fantástico com
os dois personagens travando um embate corporal intenso.
É um clímax alucinante, em que podemos nos aproximar um
pouco mais daqueles personagens, entender que tipo de pessoas eles são e o que
os levou àquele lugar através de flashbacks que reconstrói em forma de
fragmentos diversos pontos importantes de suas vidas, até chegarem ao Queen
Decim – vislumbrar tais sequências me trouxe memórias de Satoshi Kon e sua
trilogia espiritual Perfect Blue, Paprika e Millennium Actress, com seus
recortes que embaralham realidade e fantasia. Mais especificamente a sequência
onde o velho se depara com sua infância num Japão da segunda Guerra Mundial com
um caça de guerra se aproximando em sua direção e então o cenário é rasgado revelando
uma dimensão bem maior daquele conflito; foi como ver a atriz de Millennium
Actress saltitando de um cenário a outro em uma bela orquestração de Kon.
Death Billiards não dá respostas claras no desfecho de sua
trama. Com um final tão ambíguo, acaba por polarizar críticas neste aspecto. No
entanto, nada disso é importante, é uma história que é melhor compreensível para
o japonês por lidar com questões culturais – a visão deles dele sobre o tema da
história é geralmente diferente da ocidental – mas só de conseguir fazer o
espectador questionar e pensar sobre o que acabou de ver em uma trama bem
manipulada, já é algo que ganha pontos preciosos comigo.
O character design, assim como a trama, é bem exótica e o
animador Shinichi Kurita que pela primeira vez mostra o seu traçado próprio,
consegue dar complexidade a cada fisionomia, que lembra bastante os de Miwa Shirow.
A cenografia é deslumbrante e elegante, com uma atmosfera casual e acolhedora que
logo é desconstruída assim que o bilhar entra em cena. Yuzuru Tachikawa se
mostrou esteticamente detalhista, aplica em Death Billiards uma estética angular, utilizando fisheye lens para acentuar os conflitos internos dos personagens através de distorção e efeitos de
profundidades, além de outros filtros. Na
enciclopédia do ANN não consta, mas a trilha sonora é do desconhecido Kotaro Tanaka (foi preciso ir na wiki japonesa
– surpresa fiquei ao descobrir que ele é um artista indie com passagens
inclusive por Belo Horizonte- MG); ele compôs uma OST atmosférica até que variante para uma duração de 25 minutos, alternando entre a típica trilha sonora de
cassinos e de tensão com toques melancólicos que contribui na imersão a um ambiente que aprisiona.
Death Billiards é um jogo exemplar, que com certeza te
deixará confuso, mas um entretenimento audiovisual completo.
Nota: 09/10
Direção: Yuzuru Tachikawa
Roteiro: Yuzuru Tachikawa
Estúdio: Madhouse
Tipo: OVA
Episódios: 01
Ano: 2013
Onde baixar: Aenianos
Minha interpretação
sobre a trama
-Contém spoilers! Clique para ler.