domingo, 6 de outubro de 2013

Kill la Kill - Alguns Pensamentos

Impressões iniciais e expectativas 



Assim que assisti à estreia de Kill La Kill, após passada a frenesi que o episódio deixou impregnada em mim, fiquei pensando se eu tinha algo a escrever sobre. Mas não há muito o que falar sobre esse episódio além do que todo mundo está falando por ai, não é mesmo? É louco, é nervoso, adoravelmente exagerado (como dizem, “over the top”). E claro, tem a assinatura e pedigree do diretor e animador Hiroyuki Imaishi, creio que um das figurinhas do meio anime mais controversos atualmente (ao lado de  Akiyuki Shinbo, Mari Okada e cia Ltda.) devido a essa sua marca que permanece forte em qualquer coisa que assine como autor principal – motivos não faltam, Gurren Lagann, Dead Leaves, Panty & Stocking são séries de animes que fogem do padrão.

A Origem

E mais: são todos animes com laços muito estreitos com produções da velha escola de animes, e isso é o que levou muitas pessoas que após assistirem o primeiro episódio de Kill La Kill, compararem a série como uma mistura insana entre Go Nagai (mais especificamente sua série “Cutie Honey”, mas Nagai é o tipo que tem uma assinatura que segue uma certa linha sempre, então vale dizer “lembra Nagai”) e o clássico Shoujo Kakumei Utena, do fabuloso Kunihiko Ikuhara, queeeee também é um diretor que tem uma assinatura, uma estilo forte que destoa de qualquer coisa ao seu redor, fazendo com que as reações ao que produz também sejam polarizadas. E o que há de comum entre Ikuhara e Nagai? O primeiro é um dos grandes discípulos da velha escola de animes, o segundo é um dos artistas mais influentes do Japão, ainda que se limite a fazer quadrinhos. E sua assinatura é o no sense na estruturação de seus enredos, a sexualização do corpo feminino e a capacidade de chocar as audiências. Uma das maiores qualidades do Nagai é a cinética de suas histórias, com um ritmo avassalador que impacta logo de cara.












Uniforme da polêmica em uma sequência emblemática; e sim, a cena é construída de modo a passar exatamente o que você pensou, mas essa abordagem de Kill la Kill não é exatamente nova, Shoujo Kakumei Utena tem a mesma abordagem, dentre outras muitas séries. O que choca, é que aqui ganha tons mais depravados. Todas essas sequências postadas de alguma forma se sintonizam com o estilo da velha escolha de animação, inclusive, o uniforme e seu modo de funcionamento, são algo que é a cara do Go Nagai, algo que ele faria. E de fato fez. 

Ou seja, o que não faltaram nos tumblrs da vida foram possíveis referências de várias séries clássicas em Kill La Kill. O que é fácil de entender, afinal, Imaishi e roteirista chefe Kazuki Nakashima buscaram referências em mangás clássicos como Honoo no Tenkousei  e Otoko Gumi, além da própria concepção de Imaishi inicialmente que era a de a série deveria se assemelhar a um mangá de luta, um battle shounen. Também, Kill la Kill é uma ideia original do próprio Imaishi, que trabalhou como animador e diretor na versão animada de Re: Cutie Honey [ao lado de Hideaki Anno] e o próprio estúdio Gainax, vale sempre relembrar, surgiu e se fundamentou como estúdio de obras originais realmente originais porque eles eram nerds tetudos admiradores desses monstros influentes da animação japonesa.

Então podemos dizer que Kill la Kill tem muita tensão sexual, corpos femininos objetificados como ferramenta, ação nervosa, humor tipicamente masculino, ações que torna as ações pulsantes e vivas e um storyboard com enquadramentos que lembram muito páginas de mangás. Aliás, este anime tem o storyboard muito imaginativo e divertido, sem nenhuma das sutilezas visuais encontradas em Little Witch Academia. Eu acredito que este anime irá até muito além do que foi TTGL ou qualquer outra série do Imaishi porque agora ele está muito mais solto e com um orçamento que não representa riscos, podendo ousar.

Referências; A história de uma garota buscando por vingança

Enfim, o que há para falar de Kill la Kill se encontra mais na parte visual do que exatamente no texto. A história de Ryuuko Matoi (Ami Koshimizu) que chega na Honnouji Academy com uma arma em forma de metade de uma tesoura e desafia o conselho estudantil  até poder alcançar o boss final – e certamente haverá uma fase episódica de combates individuais que deverá se estender por ao menos metade da série – é a uma formula bem battle, que lembra Shoujo Kakumei Utena, que é justamente uma desconstrução desse enredo típico em que é dado o poder à heroína de revolucionar esse cenário e “libertar” a princesa das mãos do príncipe, mas antes precisando passar por vários duelos com todo o conselho estudantil até se tornar ela mesma seu próprio príncipe. Lembra também Medaka Box, e neste caso, eu nem acho que seja uma referência, mas uma coincidência. É que ambos seguem o mesmo principio: satirizar o padrão school life, o gênero mais popular em termos de conteúdos gerados, no Japão. Mas vai que é uma referência mesmo?

E essa atmosfera satírica foi o que eu mais curti, numa escola onde o conselho estudantil tem mais poder que os próprios professores; eles é quem mandam, que definem as regras a serem seguidas por todos, transformando a escola num concentrado regime militar comandado pela general suprema Satsuki Kiryuuin (Ryoka Yuzuki). O roteiro também sem nenhuma sutileza já nos mostra que de fato a história puxa para esse lado referencial da ditadura militarista em algumas oportunidades, seja nos comentários do professor que explica a matéria ou da própria Ryuuko ao exclamar que escola era mais perigosa que a cidade abaixo. Posso fazer uma aposta? Eu acho que no processo de procurar a sua vingança pessoal, Ryuuko como qualquer herói de battle shounen também irá crescer muito e libertar a todos das mãos pesadas do conselho estudantil. Aliás, o próprio Imaishi chegou a comentar (você pode conferir aqui e aqui ou português com ele e o roteirista, e com o character designer - todas saídas das páginas da NewType) que o enredo cresceu absurdamente do que ele pretendia a principio, com a história ganhando mais foco sobre os personagens e seus conflitos, com todos os principais sendo bem explorados durante a série. Yay, isso motiva, não? 
Voltando à história, gosto também de como a Honnouji Academy se assemelha a um país totalitarista distopico, com largos muros o separando de outras localidades. Interessante também que o cenário se situa num planalto onde a academia fica no mais alto relevo e ao seu redor, é como se fosse uma favela, com casas e moradores humildes numa crescente elevação ambiental. Quando vi a Ryuuko subindo aqueles morros de ruelas estreitas, com uma neblina rala tomando o cenário, garotos numa quadrilha tentando assalta-la por adentrar em seu território e aquelas casas coladas, construídas uma sob as outras sem qualquer planejamento, mais os moradores típicos de locações populares; eu só pensei “o que diabos eles estão tentando fazer aqui?”. O interessante é que é um cenário que não é muito retratado em animes, doras, mangás e afins, mesmo porque, mesmo nas classes baixas e baixíssimas existentes no Japão, não há esse modelo geográfico de casas sobrepostas sobre as outras em morros. De certo anseio muito por ver esse cenário expandido.

Estilo visual

Pra fechar, voltemos a falar do visual. Apesar de Kill la Kill contar com produtoras grandes como Aniplex, Dentsu Inc., e Kadokawa Shoten, dá pra notar claramente que o orçamento destino a dois cours fica bem na média de um anime médio, mas é muito mais bonito e vivo. A série ainda traz muitos acontecimentos ao mesmo tempo com vários quadros pulando freneticamente no vídeo , fazendo com que possa ser difícil para muitos acompanhar sem perder a trajetória da ação.


Um modelo eficaz e econômico

Pra isso, é necessário tempo de produção, um controle maior da direção e uma equipe voltada unicamente praquele projeto (pra se ter uma ideia, quando sondados sobre a possibilidade de aumentar o tempo de duração do próximo OVA de Little Witch Academia para média metragem com pouco mais de 40 minutos, responderam que não havia pessoas disponíveis para animar mais cenas). Um estúdio com estrutura menor (ainda que mais endinheirado que muitos com estruturas maiores), com menos etapas o processo de criação e controle maior do diretor acabando dando uma áurea mais artesanal.

Assim como Shinbo e Ikuhara, Imaishi também é adepto da animação 2D limitada, que é o frame rate com um menor número de quadros de frames por segundos, diminuindo o número de Inbetweening, que podemos dizer se tratar do processo que dá a ilusão de movimentos, que faz com que as sequências nas ações dos personagens sejam suaves e não abruptas e anticlimáticas. A animação limitada diminui esse processo, reutilizando vários quadros e não desenhando personagens inteiramente, mas em parte para dar efeito de continuidade. Isso se deve à economia de tempo, que consequentemente, poupa mais dinheiro (ou você passa oito anos animando um anime com um orçamento modesto). Nas sequências de ações de Kill la Kill é possível notar com Imaishi reproduz o storyboard com animação limitada, mas fazendo a ser explosiva na tela, não dando tanto tempo para reparar em detalhismos sequenciais.

-Mesmo um cena simples assim pode soar bastante viva nos simples detalhes



Isso faz com que os artistas criem uma linguagem visual mais estilizada, com mais simbolismos visuais e abstrações, fazendo com que animação limitada se tornasse um estilo artístico em mãos criativas. Desde o primeiro anime comercial exibido semanalmente nas tvs japonesas, vulgo Astro Boy, que essa alternativa às animações caras e com muitos detalhes por fps (frames por segundo) se faz presente nos animes. Esse estilo como arte é algo que nota mais claramente nos animes oldschool, afinal, mesmo pra uma animação com Animação Limitada, exige-se talento e criatividade, e computação gráfica permitiu que este processo se tornasse menos artesanal e mais industrial. Com isso, os talentos diminuem, mas sempre vai ter um Shinbo, um Ikuhara, um Imaishi que utilizará essa técnica como arte.

Isso pode ser visto em Kill la Kill. Nessa técnica se deixa a animação fluidas nas cenas de maior impacto e importância. Imaishi faz isso e no meio tempo faz um bom uso do CG como parte orgânica do cenário, com muitas estilizações, filtros, sobreposições que dão um efeito mais artístico. E o CG da série é muito bom, produzido pelo mesmo estúdio que produziu ao lado de Imaishi, as belas sequências de ação em CGI de Black Rock Shooter, o SANZIGENAnimation Studio. O destaque fica para as poses dos personagens com muitas gags visuais que são divertidíssimas. As próprias cenas de batalha são bastante carnavalescas. Como disse, pra transformar animação limitada em arte, é preciso talento pra tirar o melhor do storyboard, além de certa liberdade artística e equipe imaginativa. É um trabalho que a produção comercial não comporta tanto, afinal, quanto mais dinâmico o processo, mais economiza no tempo para outras séries. Basicamente, essa é a diferença entre o que se chama de estúdio grande (produção em massa) e estúdio pequeno (poucas produções, equipe menor).

A impressão inicial sobre Kill la Kill é de um anime muito visual. O character designer do novato SushiO, é muito estiloso e original, com projetos distintos de personagens e seguindo duas linhas criativas, de um desenho mais bonito e detalhado para alguns personagens e e mais estilizado e cartunesco para os que fazem parte da massa, com traços bem mais simples.

Ryoka Yuzuki(Satsuki), Kazuki Nakashima (roteirista) e Ami Koshimizu (Ryuuko)

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