Dance, dance, baby!
A música é um elemento imprescindível para qualquer obra
audiovisual. Ela é importante até mesmo quando se mostra ausente, pois
intercalando com o silêncio atmosférico, cria-se uma ressonância em que os sons
correspondem ao gradativo retorno de sentidos antes dormentes ou paralisados,
em transe, suspensa. Creio que se pode afirmar que a música estabelece a
atmosfera e o tipo de emoção que a obra quer passar. Não por acaso, no cinema
mudo a trilha sonora desempenha um papel imprescindível em suas películas. É o
cinema, em essência, feito de sons e imagens? O que dizer então das
radionovelas que não podiam contar com o recurso de imagens, utilizando da
música como um recurso a evocar sensações. Kotonoha no Niwa, do Makoto Shinkai,
é criticado por sua aparente ausência de um roteiro mais forte na narrativa,
quando na verdade é justamente isso que ele evoca: uma narrativa em que a
subjetividade emerge através de imagens e sons.
A música não apenas afeta, como faz parte do próprio ser
humano desde tempos imemoriais quando este aprendeu a tirar sons ritmados de
objetos. Repare que o ritmo musical é tão indissociável do nosso ser, que mesmo
quando você não gosta de um estilo de música, se exposto por algum tempo, dificilmente
conseguirá se mostrar indiferente, com seu corpo e mente reagindo ritmicamente
de modo involuntário. Quando fiz aula de música na pré-adolescência, fiquei tão
influenciada pelos compassos usados para atingir o timing perfeito, que acabei
adquirindo um tic curioso: em diversos momentos do meu dia, mesmo distante dos
ensaios, me pegava estalando os dedos e assoviando, e isto acabou me marcando
diante outras pessoas. XD
Estudos dizem que música classe exerce um grande domínio no
humor das pessoas, e posso dizer que experimentei isso pela primeira vez quando
criança e desde então instrumentais viraram sinônimo de equilíbrio para mim. Quando
pequena, meus pais me levaram num psicólogo (acho que era isso ou algo do tipo), onde não sei bem ao certo que técnica
ele usou comigo, mas propôs que eu me deitasse de uma forma que considerasse
confortável , colocou música clássica ao fundo, e me mandou fechar os olhos (hey, parem de pensar maldade!). Então
começou a me dizer suavemente para esvaziar a mente, como se fosse uma lousa
branca sendo apagada até não restar mais nada. Depois de um tempo, realmente
consegui sentir-me plenamente leve e com a mente completamente vazia (!!!). Considerava isto algo impossível,
mas eu experimentei isso. Depois de algumas coisas que ele me mandou imaginar,
eu fui adentrando cada vez mais fundo no inconsciente e então apaguei. Acordei
uma hora depois, me sentindo leve e renovada.
Enfim, a música afeta o ser humano de muitas maneiras, além
de ser utilizada frequentemente para fins terapêuticos, recreativos,
educacionais e etc. É um elemento essencial para qualquer obra audiovisual, e
Evangelion é uma série onde isto se torna ainda mais evidente, em que a música
e imagem formam uma cumplicidade de modo a sobrepor qualquer deficiência em
termos de animação e explorar o mais profundo da subjetividade humana.
No episódio
“Both of You, Dance Like You Want to Win! (Momentarily Unite the Minds)” este aspecto da série é ressaltado quando
devido à falta sincronia de Shinji e Asuka nas operações contra os Anjos, ela
acaba por ser forçada a se mudar para o apartamento de Misato e Shinji. Um novo
Anjo aparece, e ele é bem diferente dos demais. Ao ser alvejado pelas unidades
01 e 02, o Anjo se divide em dois e se
torna aparentemente impossível de ser derrotado pelos Evas. Para complicar, as
diferenças entre eles afetam qualquer tipo de cooperação mutua. Fica evidente o
quão dessincronizados Asuka e Shinji são, algo que fica aparente desde o
episodio em que a ruiva tsundere faz sua primeira aparição no anime. Os dois
são completos opostos, e essa polaridade faz com que tenham dificuldades de
trabalharem em sintonia um com o outro. Acontece que em qualquer emprego, as
diferenças precisam ser postas de lado em prol de um interesse em comum.
Os dois tem apenas 6 dias antes que a ONU soltar uma bomba
sobre o Anjo e exterminar o resto de uma cidade que ainda não se recuperou dos
últimos incidentes.
O Anjo só pode ser derrotado simultaneamente, e a maneira
encontrada por Misato para sincronizar Shinji e Asuka foi através da música e rígidos
treinamentos ritmados: dança! Sim, como treinar jazz (o estilo de dança), em que o corpo e a mente precisam estar
sintonizados, completamente entregues ao parceiro. Quando fiz jazz, o professor
me disse uma vez que não havia segredo em dançar, mas que exigia extrema disciplina
e uma confiança cega no parceiro. Você teria que ser capaz de fechar os olhos e
entregar seu corpo, confiando apenas nos ritmos e na capacidade do parceiro em
seguir este compasso. Não havia tempo hábil para pensar. Era preciso esvaziar a
mente e deixar o corpo se mover.
Se trata de um episódio que consegue evidenciar o aspecto
mais envolvente da série, trabalhando justamente em cima da sua temática mais
primordial à narrativa: música e imagem que evocam a subjetividade latente no
ser humano. A sincronia é tão essencial à Evangelion quanto o ar para o ser
humano. Os pilotos precisam estar sincronizados com a “alma” dos Evas para
conseguirem se mover com eles, precisam somar forças e agir em conjunto à
medida que os Anjos vão ficando cada vez mais resistentes, e a mente do piloto
está diretamente conectada à gênese do Eva, fazendo com que um psicológico desequilibrando
faça a maquina sair de controle. A sincronia também é muito importante para o
ritmo da melodia, que por sua vez busca uma sincronia com o interior humano. Questões
internas estas que são tão caras à Evangelion.
A cena seguir é pós-treinamentos, e uma das cenas mais
famosas do anime, além de ser uma das melhores também em termos de animação
fluida. Episódio 09, exibido originalmente em 29 de Novembro de 1995, com script de Hideaki Anno e Akio Satsukawa; storyboard de Shinji Higuchi; subdireção de Seiji Mizushima e animação de Shinya Hasegawa –
conhecido por seus movimentos suaves e cortes precisos. É um episódio que gosto
bastante e ele é o que melhor expressa essa áurea mais leve e divertida da
primeira parte do anime. Ver Shinji e Asuka se repelindo e sendo obrigados a
trabalhar este lado conflitante é divertido, mas não se compara com essa cena
que começa com os dois Evas fundidos lindamente sincronizados. Criativo e com
timing exemplar, como não poderia deixar de ser.
Imagm retirada do site Sakugabooru. Visitem! É bem legal, lá. |
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