terça-feira, 16 de dezembro de 2014

[+18] Yuretsuzukeru (2005): Keep on Vibrating

Um mundo em colapso observado pelas mesmas lentes. Texto escrito originalmente em 27/02/2014

Veja também outras obras do autor aqui no blog:


Yuretsuzukeru (Keep on Vibrating) termina com um posfácio do seu autor, Jiro Matsumoto, onde ele comenta algumas peculiaridades de cada conto contido nesta coletânea, mas o que eu achei mais curioso foi ele dizendo que esta seria a primeira vez que faria um trabalho de cunho erótico. Quem conhece outras obras do autor sabe que o erotismo, assim como a miséria e violência, são elementos presentes em todos eles. Eu não sei o que exatamente ele quis dizer com isto, mas é verdade que embora em todos os seus trabalhos a nudez e o sexo e a violência sexual sejam elementos constantes, há sempre um contexto palpável por trás. Talvez, ele se referia não em relação a questão da nudez per si, mas do quão sensual ela poderia soar. Mesmo assim, ainda é uma questão sensível que é muito fácil de não ser percebido por outros olhos, embora neste trabalho, de fato haja uma grande ênfase no sexo.

Geralmente os cenários de Matsumoto é de extrema pobreza, em meio a uma guerra que remete à Segunda Guerra Mundial em que o Japão, entre outros países; foram palco, retratado em algum momento de um futuro não tão distante, com personagens masculinos deslocados socialmente (frequentemente são retratados nus, ingênuos, e com algum distúrbio psicológico), mulheres insatisfeitas com o marido que buscam na relação extraconjugal uma forma de se vingarem e sentirem prazer (a tendência é que essa aventura termine de forma trágica), mulheres com passados traumáticos e repletas de sonhos e ideais que são desfiguradas pelas circunstancias da vida; se tornando aquilo que sempre lutou contra, mulheres cínicas e manipuladoras que aprenderam que para sobreviver naquele cenário era necessário seguirem a onda, vendendo e usando seus corpos para atingirem um objetivo.

Há algo de sujo, melancólico e desesperançoso no sexo retratado por Matsumoto em sua característica arte. Talvez ele não tenha se dado conta ainda, mas as relações sexuais de seus personagens carregam consigo a sordidez; uma fuga desesperada por prazer; a necessidade da superação através da dor – características estas que moldam os mundos criados por ele, mundos pós-apocalípticos inundados no caos e pobreza, um lugar onde não é permitido que ninguém se mantenha puro ou casto. Homens, mulheres, crianças, todos acabam se corrompendo de alguma forma. E essa visão é capturada com excelência por seu estilo de arte de aspecto não finalizado e suja, em que seus personagens vão alternando entre traços rascunhados e adornadamente esculturais. Claro, é o padrão do seu traçado visual, mas que casa em absoluto com o teor das histórias que conta.

E bom, a linha entre o erotismo e a aversão às vezes se tornam ininteligíveis, então mesmo que o autor tenha certa intenção ao desenhar certa cena, ele perde completamente o controle disso quando sua obra passa a ser absorvida por outros olhos e perspectivas. É uma conclusão individual, embora a leitura que se faz nunca deva entrar em choque com o contexto.
Com isso, eu acabo de dar minhas impressões acerca de Yuretsuzukeru, que numa tradução livre, entende-se como “Mantenha-se Vibrando”, o que de certa forma é quase uma ironia, mas também um grito desesperado de esperança, a fim de manter-se vivo em um mundo sujo. Uma engenhosidade fantástica aqui, é que todas as histórias terminam de um modo completamente inesperado. Por exemplo, algumas histórias possuem reviravoltas com alguns elementos sarcásticos e irônicos, que ilustram como um simples ato seu pode mudar drasticamente o seu futuro e como isto pode representar uma coisa boa ou ruim para um outro alguém. Ou seja, a vida é uma questão de perspectivas. Sempre terá alguém se dando bem em cima da tragédia do outro ou acontecimentos que fogem completamente da compreensão humana. Aliás, esse é outro aspecto que eu achei sensacional em algumas histórias dessa coletânea, em que a moral/resolução se torna muito dúbia.

Matsumoto também utiliza de forma recorrente dois personagens, uma menina e um menino, que usam máscaras em um cenário diatópico, que ora alude para o onírico, ora para o mundano. O fato é que essas duas crianças vive em um lar desestruturado, são obrigadas a trabalhar desde pequeninas para trazer de comer para casa, com uma mãe abusiva. Para todas essas moléstias, eles encontram na fantasia escapista uma forma de fugir dessa realidade, e este é o momento em que o contexto no qual eles se encontram inseridos se torna lacrimosamente lisérgico. Em uma das histórias, eles chegam na sacada do prédio ondem moram e dizem como os fogos de artificio estão bonitos naquela noite, mas no quadro seguinte, você percebe ao fundo uma cidade sendo bombardeada por aviões inimigos. É de uma beleza trágica fascinante e somente lendo para entender. Matsumoto também se permite trair um pouco suas convecções, dando uma tonalidade mais doce que o de costume para determinada história, ao qual ele viria a dizer que, não exatamente nessas palavras: “não faz meu estilo, mas de vez em quando não tem problema”. Yuretsuzukeru é uma obra divertida, repleto de altos e baixos narrativos, dramaticamente falando, mas uma obra bem completa com inicios, meios e fins bem definidos, além de um tema global amarrando todas as histórias com sutileza. Para uma coletânea de histórias curtas, o resultado final me foi mais do que satisfatório. 

Nota: 07/10
Ano: 2005
Autor: Jiro Matsumoto
Volumes: 1 (encerrado)
Demografia: Seinen
Revista: Kawade Shobo Shinsha/Ohta Books

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