Saudações
do Crítico Nippon!
Responsável
por algumas das obras mais ambiciosas do Japão contemporâneo, Sion Sono é
responsável pelo formidável Why Don’t You Play in Hell (2013) que contava com
um design de produção surpreendente e uma trama exponencialmente imprevisível.
Bem como o extraordinário Antiporno (2017), cuja direção de arte e fotografia
criavam planos belíssimos e coloridos, usando sua narrativa repleta de metalinguagem
para criticar a própria indústria dos “roman porn” japoneses. Porém, o que lhe
trouxe mesmo a fama e o fez decolar na indústria foi este Love Exposure (2008).
Com 4 horas de duração absolutamente impecáveis, não é exagero considerar este
o melhor filme japonês que eu já assisti.
Tentar
descrever a trama de Love Exposure é um exercício fútil, pois sempre cambiante
e dividido em capítulos, o roteiro flerta com vários estilos e muda de direção
quando menos percebemos. Começamos com Yu (Takahiro Nishijima), um cristão em
conflito cujo pai (Watsuro Watabe) – que é padre – praticamente o força a
cometer pecados. E conforme Yu vai aprimorando seus pecados propositais, de
repente se vê parte de um grupo que utiliza técnicas de artes marciais para
tirar fotos de calcinhas por baixo das saias das garotas (sim, você leu direito
essa frase). Este cristão pervertido se interessa romanticamente por Yoko
(Hikari Mitsushima), uma garota que odeia os homens mais que tudo ao ponto de
simplesmente espanca-los na rua. Para fechar o triângulo amoroso, conhecemos
Koike (Sakura Ando), interessada em Yu, que consegue a proeza de ser ainda mais
violenta que Yoko, ao ponto de ter castrado o próprio pai (com direito a
chuveirinhos de sangue saindo do falo e tudo).
O
filme investe um tempo precioso em cada um de seus personagens, tratando-os com
seriedade absoluta (algo fundamental para o sucesso do projeto), caso contrário
jamais levaríamos a sério as lutas internas (e externas, muitas lutas externas)
de cada um. Afinal, há tantos momentos simplesmente hilários, incluindo o maior
número de ereções da História do Cinema. Até os cantos sacros que insistem em
acompanhar a narrativa, mesmo após momentos completamente obscenos e/ou
sanguinolentos.
Em
suma, Love Exposure flerta o tempo todo entre o sagrado e o profano, utilizando
seus absurdos para fazer comentários sérios sobre diversos tópicos. A castração
simbólica (e aqui, literal) que a religião exerce sobre seus seguidores e
pastores (que muitas vezes tem o efeito contrário, onde a pessoa busca
compensar tanta repressão e insegurança); o fanatismo de cultos que aprisionam
pessoas profundamente perturbadas que precisariam de ajuda profissional; a
desastrada maneira de lidar com a sexualidade entre os jovens (o Japão é
extremamente doentio em alguns âmbitos).
Sion
Sono cria uma obra que flui com maestria sem jamais soar episódica ou causar
sono, intercalando entre o tocante e o dramático de maneira a nos importarmos
com o destino de todos os personagens. Aliás, os figurinos acertam a
gradualmente vestir Yu com roupas mais extravagantes e escuras, que se afastam
da pureza do branco da igreja. Assim como é bacana notar a personagem de Makiko
Watanabe vestindo vermelho em praticamente todas as suas cenas, até mesmo o seu
carro, salientando sua paixão avassaladora e destrutiva.
Já
Koike, que aparece segurando um periquito várias vezes até literalmente sua
última cena, também é única que de fato segurou inúmeras vezes o periquito
ereto (ou não) do protagonista (essa é frase mais 5ª ano da História do Elfen
Lied Brasil, desculpa). Isso obviamente não pode ter sido coincidência, e é uma
piada do filme por si só. Porém, é mesmo Hikari Mitsushima, como Yoko, quem
rouba o filme sempre que aparece. E seu longo monólogo sem cortes na praia, com
os olhos cheios de lágrimas, deveria ter lhe rendido todos os prêmios do mundo
pela atuação.
Love
Exposure é uma montanha russa de acontecimentos, todos coerentes em sua lógica
interna, com temas fortes e atuações primorosas. Reunindo chuveirinhos de
sangue, colegiais lutando, gangues, perversão, religiosidade, é um prato cheio
para todo tipo de análise. O longa impressiona pela energia inesgotável com
incríveis 4 horas de duração. Sion Sono claramente criou sua obra-prima
transbordando paixão e tesão no processo, assim como os personagens que nela habitam.
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